Quem foi Eunice Paiva, protagonista do filme ‘Ainda Estou Aqui’?
Interpretada por Fernanda Torres, indicada ao Oscar de Melhor Atriz, Eunice foi uma das maiores ativistas contra a Ditadura no Brasil
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Repórter de POP
Publicado em 23 de janeiro de 2025 às 16h36.
Última atualização em 23 de fevereiro de 2025 às 16h10.
“ Ainda Estou Aqui ”, filme de Walter Salles, acaba de fazer história: tornou-se o primeiro longa brasileiro a ser indicado na categoria de Melhor Filme do Oscar . Ao que tudo indica, o mundo se simpatizou com a protagonista da trama, Eunice Paiva.
Interpretada por Fernanda Torres, indicada ao Oscar de Melhor Atriz e vencedora do Globo de Ouro na mesma categoria em 2025 , a figura de Eunice é um tanto quanto representativa para a história do Brasil. Pela busca incessante pela Justiça, ela se tornou símbolo da luta contra a ditadura militar brasileira, que durou 21 anos.
O marido de Eunice, Rubens Paiva (interpretado no filme por Selton Mello), foi assassinado por militares do regime entre os dias 20 e 21 de janeiro de 1971, após ser espancado no DOI-CODI — reconhecido hoje como um dos maiores centros de tortura do Rio de Janeiro durante a ditadura. Rubens estava envolvido com o envio de cartas de expatriados e exilados no Chile e em outros países da América Latina para seus entes no Brasil.
Eunice chegou a ser presa no mesmo local que o marido, mas não conseguiu vê-lo. Ficou em cárcere por 12 dias em uma sala escura, sem acesso à luz. Cobravam dela o reconhecimento de nomes e pessoas perseguidas pelo regime, mas não revelou nenhum. Foi levada para lá pelos militares ao lado da filha, Eliana, que na época tinha 15 anos e foi liberada no dia seguinte ao interrogatório.
A reinvenção no Direito
Antes do assassinato de Rubens Paiva, Eunice se dedicava as tarefas de casa e ao cuidado dos filhos. Era formada em Letras pela Universidade Mackenzie, falava francês e inglês com fluência e adorava ler, conforme contou o filho, Marcelo Rubens Paiva, em inúmeras entrevistas. Vinda de família italiana, tinha todas as tradições que os imigrantes trouxeram ao Brasil: a macarronada no almoço de domingo com a família, o jeito de falar alto, as exigências e o afeto com amigos e os filhos.
Mas quando perdeu o marido e reconheceu tantas outras vítimas da ditadura, viu-se num beco sem-saída. Sem dinheiro e em busca por Justiça, passou a se dedicar aos estudos de Direito e voltou a Universidade Mackenzie aos 42 anos. Formou-se aos 47.
Uma vez advogada, teve uma luta ativa pelos Direitos Humanos e defendeu inúmeros casos de “desaparecimento” relacionados à ditadura brasileira. Responsável pela condenação e investigação do caso do marido, foi uma das principais autoras da Lei 9.140/95, que reconhece como mortas as pessoas desaparecidas durante ao regime militar, assinada pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso.
No dia em que a lei foi promulgada, Eunice era a única parente de uma vítima presente na sala.
Em busca da reconstrução da democracia brasileira, ela também atuou como consultora, em 1988, da Assembleia Nacional Constituinte, que promulgou a Constituição Federal Brasileira. Só em 1996, depois de muita luta na Justiça, recebeu do Estado brasileiro oficialmente o atestado de óbito de Rubens Paiva.
Para além da defesa das vítimas da Ditadura, Eunice também é reconhecida até hoje pela luta dos povos indígenas. Advogou para expropriação indevida de terras e foi responsável pela mudança de algumas das leis para proteção dos povos originários.
Em outubro de 1983, chegou a assinar com Manuela Carneiro da Cunha um artigo na Folha de São Paulo, com o título "Defendam os pataxós". O texto foi um marco na luta indígena brasileira e serviu de modelo para outros povos indígenas, inclusive africanos, americanos e esquimós.
Memória e esquecimento
Após anos de ativismo e com cinco filhos já adultos constituindo suas próprias famílias, ao final da vida, Eunice foi acometida pelo Mal de Alzheimer. Ficou anos com a memória comprometida e morreu, em decorrência da doença, em 13 de dezembro de 2018, aos 89 anos.
O filme "Ainda Estou Aqui" é baseado na obra de mesmo nome de Marcelo Rubens Paiva, filho de Eunice. No livro, o autor permeia as memórias da mãe e do pai em meio ao crime que assolou a própria família e descreve a luta e o sofrimento dela, mãe de cinco filhos, que se viu de repente sem o marido, mas nunca se deixou abalar.
O livro foi lançado em agosto de 2015, enquanto Eunice ainda estava viva. A adaptação de Walter Salles para o cinema já ultrapassou os R$$ 100 milhões de bilheterias e foi vista por mais de 5 milhões de pessoas.
Onde assistir ‘Ainda Estou Aqui’?
O filme está em cartaz nos cinemas desde 7 de novembro. Será disponibilizado em breve na Globoplay.
EXAME no Oscar
O Oscar de 2025 acontece no dia 2 de março. A EXAME acompanha a cerimônia ao vivo, com a presença de convidados, em transmissão no YouTube.
Quem são os indicados ao Oscar 2025
Veja a lista completa de indicados à maior premiação do cinema aqui .
Fernanda Torres tem chances no Oscar?
Fernanda Torres, intérprete de Eunice Paiva em "Ainda Estou Aqui", de Walter Salles, foi a primeira brasileira a vencer o Globo de Ouro na categoria de Melhor Atriz e tem boas chances de fazer história, mais uma vez, na premiação do Oscar. Ela compete com Demi Moore ("A Substância"), Mikey Madison ("Anora"), Karla Sofía Gascón ("Emilia Perez") e Cynthia Erivo ("Wicked").
A atriz também é a primeira brasileira nos últimos 26 anos a concorrer por um papel de drama no Oscar. A última (e até então, única) foi a própria mãe, Fernanda Montenegro — nomeada em 1999 pelo papel em "Central do Brasil", também indicado a Melhor Filme Internacional.
O Brasil nunca ganhou um Oscar em nenhuma das categorias, vale dizer.
'Ainda Estou Aqui' tem chances no Oscar?
Desde “ Central do Brasil ”, também de Walter Salles, o Brasil não era indicado ao Oscar de Melhor Filme Internacional. Naquele ano (1999), Fernanda Montenegro também estava na disputa na categoria de Melhor Atriz. A estatueta mesmo, nem Walter, nem Fernanda levaram para casa.
26 anos depois, "Ainda Estou Aqui" não só quebrou o jejum de "Central do Brasil", como marcou o começo de uma lista de ineditismos: foi indicado a Melhor Atriz, Melhor Filme Internacional e Melhor Filme, a maior categoria da premiação, em que a indústria cinematográfica brasileira nunca havia conquistado uma nomeação.
O novo filme de Walter Salles já ultrapassou a marca de 5 milhões de espectadores e R$ 100 milhões em bilheterias. Abriu em primeiro lugar na semana de estreia no Brasil e em Portugal, e em segundo lugar nos Estados Unidos, país no qual ficou em cartaz em 700 salas de cinema. Tem sido listado por críticos de todo o mundo como a principal aposta do ano para Melhor Filme Internacional, e Fernanda Torres é considerada favorita ao prêmio de Melhor Atriz, ao lado de Demi Moore.
O longa é uma coprodução entre Brasil e França, o primeiro original da Globoplay, com produção da VideoFilmes, RTFeatures e MactProdutions em parceria com a ARTE France e Conspiração. A distribuição será feita também pela Sony Pictures.
Além de 'Ainda Estou Aqui': os 10 filmes brasileiros indicados ao Oscar e onde assisti-losQuando será o Oscar de 2025?
A 97ª edição do Oscar será no dia 2 de março em Los Angeles (Califórnia, EUA), no Teatro Dolby.
Onde assistir ao Oscar de 2025?
A premiação completa será exibida na TV Globo, TNT e no streaming, pela Max. A EXAME acompanha a cerimônia ao vivo, com a presença de convidados, em transmissão no YouTube a partir das 19h30.
Que horas começa a cerimônia do Oscar de 2025?
O início da cerimônia está previsto para as 21h (horário de Brasília).