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Talita Assis, da EXAME: COP26 é oportunidade para desenvolver a Amazônia

Cientista à frente do projeto A Amazônia em EXAME afirma que o aumento no desmatamento é assustador, e que é preciso um olhar holístico sobre a questão econômica

A pesquisadora Talita Assis: "A COP26 trará oportunidades para encontrar um caminho de desenvolvimento sustentável da Amazônia" (Exame/Divulgação)

A pesquisadora Talita Assis: "A COP26 trará oportunidades para encontrar um caminho de desenvolvimento sustentável da Amazônia" (Exame/Divulgação)

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Rodrigo Caetano

Publicado em 8 de outubro de 2021 às 06h00.

Última atualização em 5 de novembro de 2021 às 13h13.

A pesquisadora Talita Assis chegou na Amazônia quase por acaso. Formada em ciência da computação pela Universidade Federal de Itajubá, ela acabou fazendo mestrado no Instituto Nacional de Ciências Espaciais (INPE) e teve a oportunidade de trabalhar com o cientista Carlos Nobre, um dos maiores especialistas do mundo em mudanças climáticas. No INPE, também se tornou doutora em Ciência do Sistema Terrestre.

Seu talento para a lógica da computação se tornou um diferencial no estudo da ação humana sobre a floresta. “Não sei se você já teve a oportunidade de ficar olhando para um mapa de desmatamento”, pergunta a cientista à reportagem da EXAME. A imagem que vem à cabeça é a da enxadrista Elizabeth “Beth” Harmon, personagem da série O Gambito da Rainha, do Netflix, que enxergava as jogadas ao encarar um tabuleiro imaginário no teto de seu orfanato.

Ao sistematizar o caos que se tornou a ocupação da maior floresta tropical do mundo, Assis percebe a complexidade de se resolver os problemas da região. “Não acredito em soluções simplistas”, afirma. “A Amazônia abriga realidades muito distintas”.

O aumento recente no desmatamento assusta. Ao mesmo tempo, a pesquisadora enxerga uma oportunidade no momento em que o mundo se prepara para discutir a regulação do mercado de carbono na COP26, Conferência do Clima da ONU, a ser realizada na Escócia, em novembro. A regulação do Artigo 6 do Acordo de Paris, principal tema do encontro, irá permitir a colaboração entre países e com a iniciativa privada nos esforços de reduzir as emissões globais. É a chance de se pensar em novos modelos de desenvolvimento. Confira a entrevista:

Qual é a sua expectativa para a COP26?

No Acordo de Paris, ficou acertado que haveria uma revisão das NDCs (metas de redução de carbono estabelecidas por cada país) em cinco anos. A pandemia adiou por um ano e, agora, a expectativa é de concluir o que ficou faltando no acordo, em especial o Artigo 6. Ele estabelece que os países podem colaborar entre si e com a iniciativa privada para atingir suas metas. Isso abre a possibilidade de criar um mercado de carbono. O que o acordo não estabelece é como fazer, e é o que será debatido na COP26.

Para o Brasil, o que está em jogo?  

O Brasil foi ousado em sua NDC, e é preciso entender o contexto. Em 2015, o desmatamento estava, de alguma forma, controlado. Apostava-se muito na regeneração. Tecnicamente, poderíamos vender o carbono que não emitimos ao manter a floresta em pé. Mas, vamos supor que o Brasil venda certa quantidade de carbono para a China, por exemplo. O que acontece com a nossa NDC? O correto seria que esse carbono comercializado não contasse para o cumprimento da própria meta. A forma de fazer essa contabilidade é um dos pontos que serão debatidos, assim como a precificação. Agora, é ruim que o país tenha estabelecido uma meta ambiciosa e não conseguiu controlar o desmatamento. De qualquer maneira, a COP26 trará oportunidades para encontrar um caminho de desenvolvimento sustentável da Amazônia.

Nesse debate sobre o valor da floresta em pé, muito se fala sobre a injustiça de impedir que países em desenvolvimento desmatem, sendo que os países desenvolvidos já desmataram. Por isso, há a demanda, inclusive do Brasil, de cobrar por esses serviços ambientais. É uma demanda legítima?

É preciso entender que o objetivo do Acordo de Paris é evitar o aquecimento global. As consequências de não atingir a meta de 2oC estabelecida no documento serão péssimas para o Brasil, especialmente para o agronegócio. Não importa de onde vem o carbono, se não reduzir, o planeta inteiro pagará o preço. É justo que os países que já desmataram paguem para quem não desmatou, porém, precisamos manter o foco na meta de conter as mudanças climáticas. Essa história do "já exploraram as matas nativas deles agora podemos fazer o que quisermos com a nossa" tem de necessariamente passar pela conscientização. Ainda que possamos fazer o que quisermos com a Amazônia, por que destruir seria a melhor opção? Somente o desconhecimento pode levar a essa conclusão.

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Como solucionar a questão do desenvolvimento socioambiental da Amazônia?

Eu não acredito em soluções simplistas. A Amazônia é uma região enorme, onde existem diversas realidades muito distintas. Nesta semana, estava analisando a situação do Acre. Há uma série de problemas fronteiriços, relacionados ao crime organizado, por exemplo. Uma economia baseada no extrativismo funciona em muitos lugares, porém, está longe de ser um padrão. A minha conclusão é que qualquer projeto de desenvolvimento precisa, necessariamente, estar baseado em dois pilares: na diversidade e na escuta ativa das 20 milhões de pessoas que habitam a Amazônia. É justamente por isso que construímos o Amazônia em Exame, para mostrar toda a diversidade e a importância da Amazônia, sob os mais diferentes aspectos e com base na ciência e no respeito pela região.

Qual é a real situação do desmatamento na Amazônia?

Há seis ou sete anos, comemorávamos que o desmatamento havia caído para menos de 5 mil km², o menor patamar histórico. Ainda assim, nos questionávamos se isso era o melhor que podia ser feito. Pensar que voltamos a um patamar acima de 10 mil km² é assustador. As bordas (o entorno de áreas desmatadas) são um problema. Elas facilitam a entrada de grileiros e o alastramento do fogo. Não sabemos o quanto a floresta aguenta de destruição. Sabemos que a Amazônia está mais seca. Quando se troca árvores por grama, perde-se a capacidade de evaporação da água no subsolo, pois as raízes são curtas. Isso afeta nosso regime hídrico, inclusive no Sudeste. Definitivamente, desmatar não é uma opção.

 

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