Por que Banco Central e Cade estão de olho no Whatsapp
Pouco mais de uma semana depois que o Whatsapp lançou seu meio de pagamento voltado para o mercado brasileiro, a novidade foi suspensa
Karin Salomão
Publicado em 24 de junho de 2020 às 12h20.
Última atualização em 24 de junho de 2020 às 16h42.
Pouco mais de uma semana depois que o Whatsapp lançou seu meio de pagamento voltado para o mercado brasileiro, a novidade foi suspensa. A Cielo comunicou nesta quarta-feira que suspendeu os serviços relacionados a transações de pagamento por meio do aplicativo WhatsApp, do Facebook, após determinações do Banco Central e do Conselho Administrativos de Defesa Econômica (Cade) na véspera.
A Cielo é a empresa que mais sente o impacto dessa decisão. Logo no início do pregão, as ações da empresa de meios de pagamento caíam 9%, a maior baixa do dia. Ao meio dia, a queda era de 8,7%.
A base de usuários no Whatsapp que poderiam usar esse modelo é muito maior do que a de instituições financeiras tradicionais. Ao contrário de outros meios de pagamento, como o pagamento por código QR, usado pelo iFood em restaurantes e pelo PicPay, o Whatsapp já é um aplicativo amplamente difundido no Brasil. Isso seria uma vantagem do modelo, principalmente para a Cielo. Agora, se torna seu maior risco.
A decisão dos órgãos reguladores foi surpreendente, ainda que clara. “Ainda que a decisão do BC tenha sido surpreendente, o regulador está claro em sua posição de que será vigilante ao desenvolvimento de qualquer sistema fechado”, diz o banco BTG em relatório.
O tamanho do Whatsapp, por si só, já pode representar uma grande mudança no sistema financeiro. O aplicativo de mensagens do Facebook tem 120 milhões de usuários ativos mensais por mês no Brasil, segundo a própria empresa. O Brasil é o segundo maior mercado do aplicativo no mundo, atrás da Índia, com 400 milhões de usuários. No mundo, são mais de 1 bilhão de pessoas. A Cielo, embora tenha perdido muita participação de mercado nos últimos anos para fintechs, ainda é a maior adquirente brasileira.
“A motivação do BC para a decisão é preservar um adequado ambiente competitivo, que assegure o funcionamento de um sistema de pagamentos interoperável, rápido, seguro, transparente, aberto e barato”, diz o banco em nota.“O eventual início ou continuidade das operações sem a prévia análise do Regulador poderia gerar danos irreparáveis ao SPB notadamente no que se refere à competição, eficiência e privacidade de dados.”
A maior preocupação é que o novo sistema impedisse a entrada de novos players - embora o Whatsapp tenha afirmado que outras adquirentes, bancos e bandeiras poderiam entrar na parceria. “Construímos um modelo aberto para dar as boas-vindas a mais parceiros no futuro”, diz o WhatsApp em comunicado na semana passada.
“Como a Cielo possui alta participação de mercado em pagamentos e o WhatsApp possui uma vasta base de usuários, o acordo pode dificultar a replicação de um serviço e outros concorrentes semelhantes e tem alto potencial de prejudicar a concorrência no mercado”, afirma o BTG.
Luis Sales, analista de mercado da Guide Investimentos, acredita que a decisão dos órgãos foi mais um balde de água fria do que uma mudança total de cenário. Para ele, é provável que o BC e o Cade liberem a ferramenta após uma análise mais minuciosa, já que a parceria não foi submetida ao Cade para aprovação e o BC ainda precisava avaliar os eventuais riscos da iniciativa.
“Esse meio de pagamento por Whatsapp é uma questão bem nova, e acredito que a decisão do BC e Cade seja pontual, para avaliar melhor”, diz Sales.
Guilherme Horn, conselheiro da AB Fintechs, também vê o movimento do BC como normal e esperado."A grande preocupação é que esse serviço seja fechado e exclusivo para poucos participantes", diz ele. Com esses esclarecimentos, é provável serviço volte ao ar em breve.