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O que dizem Ambev e Heineken sobre uma denúncia de trabalho escravo

Fiscalização federal encontrou 23 pessoas em condições análogas à escravidão na transportadora terceirizada Sider. Ambev e Heineken falaram sobre o caso e como pretendem agir para garantir processos em toda a cadeia

Ambev e Heineken são autuadas pela Superintendência Regional do Trabalho no Estado de São Paulo (CRMacedonio/Getty Images)

Ambev e Heineken são autuadas pela Superintendência Regional do Trabalho no Estado de São Paulo (CRMacedonio/Getty Images)

Marina Filippe

Marina Filippe

Publicado em 18 de maio de 2021 às 14h00.

Última atualização em 18 de maio de 2021 às 15h46.

Ambev e Heineken, as duas maiores cervejarias do país, foram autuadas pela Inspeção do Trabalho do Ministério da Economia, por meio de Auditores-Fiscais do Trabalho do Programa de Combate ao Trabalho Escravo da Superintendência Regional do Trabalho em São Paulo, numa operação que encontrou 22 venezuelanos e um haitiano em condições análogas à escravidão na transportadora terceirizada Sider, que prestou serviço para os dois gigantes do setor. A fiscalização foi divulgada hoje pelo jornal El País

Os imigrantes estavam morando há meses em boleias de caminhões estacionados nas unidades da Saider em Limeira e Jacareí, cidades do interior de São Paulo. Diferentemente do previsto no contrato e na lei, eles não tinham alojamentos e acesso a água potável. Procurada pela EXAME, a Ambev se prontificou em colocar executivos para uma entrevista. "Assim que tomamos conhecimento da denúncia envolvendo a Sider, uma transportadora que presta serviços para a Ambev e outras empresas, imediatamente garantimos que os motoristas contratados pela fornecedora fossem levados para um hotel, onde foram acolhidos e receberam todo o suporte necessário. Nosso compromisso com os direitos humanos e fundamentais dos trabalhadores é inegociável e qualquer prática contrária a isso é inaceitável", diz Carla Crippa, vice-presidente de relações com a sociedade.

Ainda segundo a companhia, ao investigar o caso, foi verificado que os motoristas chegaram ao Brasil de forma legal, com o apoio do governo, tinham carteira assinada e recebiam o salário da categoria. No entanto, as autoridades afirmaram que tinham jornada de trabalho excessiva e alguns não possuíam residência fixa. "Seguindo as orientações e com a concordância dos auditores fiscais do trabalho, garantimos que a fornecedora contratante fizesse o pagamento de todas as verbas e indenizações trabalhistas e que a transportadora providenciasse o retorno dos motoristas ao local de origem ou a vinda de seus familiares, conforme escolha de cada um. Isto foi feito inclusive antes da data marca pela Superintendência Regional do Trabalho para a audiência", completou Crippa.

O desafio da Ambev e das empresas que se propõem a ter e comunicar práticas adequadas de ESG é monitorar os fornecedores da mesma forma que fazem dentro de casa. Segundo eles, a Sider opera no modelo de fretes spots, nome dado ao esporádicos, representando 0,6% das contratações. Contudo, a ocasião acendeu um alerta e fez com que a companhia revisasse dos processos de fiscalização e apoio.

Na prática, a companhia passa a incluir a execução de pesquisa autodeclaratória para mapeamento de itens como cumprimentos de jornada, mapeamento de irregularidades trabalhistas e condições de trabalho. Deste modo, os fornecedores logísticos devem implementar treinamentos e boas práticas de gestão de pessoas, em linha com as regras da CLT e normas sindicais; processos de auditorias de acordo com matriz de risco de cada fornecedor, podendo ser documental ou in loco; KPIs ativos para sinalização de eventuais irregularidades na gestão de pessoas; e métricas socioambientais no processo de decisão de contratação de fornecedores.

"Estamos nos associando a especialistas para irmos além do que fazíamos. Já neste mês o programa deve estar pronto e ao longo do ano implementado também nas fornecedoras esporádicas. A tecnologia vai nos ajudar a apoiá-los nos pilares de sustentabilidade e pessoas, bem como no monitoramento e auditoria", afirma Rodrigo Figueiredo, vice-presidente de sustentabilidade e suprimentos.

O executivo lembra ainda que em 2016 a Ambev fez uma pesquisa para entender as principais lacunas dos fornecedores logísticos, criou um portal de comunicação e disponibilizou seus treinamentos para eles. Há também programas que visam incluir diversidade racial na cadeia. "Evoluímos, mas devemos evoluir mais. Nos últimos dois anos incluímos 2.000 novos fornecedores menores, regionais, e acompanhá-los é nosso dever. Compartilhar as boas práticas ajuda toda a cadeia e ajuda a mitigar situações terríveis como a ocorrida".

O desafio, porém, é grande e contínuo. "Por mais estruturadas que estejam as ações, não é possível eliminar um risco em 100%, mas o objetivo é que jamais aconteca de novo", diz Crippa.

Já a fabricante de bebidas Heineken informa que "desde que tomou conhecimento do caso, por meio da Superintendência Regional do Trabalho, colaborou ativamente para garantir que todos os direitos fundamentais dos trabalhadores envolvidos fossem reestabelecidos conforme a orientação dos auditores fiscais do trabalho". Sendo a companhia, em respeito a esses trabalhadores, foram bloqueados os créditos que o fornecedor possuía em decorrência dos serviços prestados, até que as indenizações acordadas entre a transportadora e o Ministério Público do Trabalho sejam pagas integralmente.

"Vale ressaltar que todos os fornecedores da companhia passam por um rigoroso processo de seleção e assinam um Código de Conduta onde se comprometem a cumprir integralmente as legislações trabalhistas e de direitos humanos. Qualquer violação desse Código pode acarretar a adoção de medidas disciplinares, inclusive a rescisão de contrato pelo Grupo Heineken. Para garantir o cumprimento de seu Código de Conduta especificamente por suas transportadoras, o Grupo Heineken possui desde 2015 o Programa de Excelência de Transportadoras, por meio do qual realiza auditorias periódicas, avaliando as empresas contratadas nos âmbitos de segurança, conservação de veículos, sustentabilidade e gestão de riscos", afirma a nota.

A partir desse caso, a companhia diz reforçar todas as ações de validação dos fornecedores durante o processo de contratação, assim como construir novos critérios de acompanhamento ainda mais rígidos sobre o cumprimento das obrigações previstas na legislação vigente. "O Grupo Heineken reafirma seu respeito à legislação e aos direitos dos trabalhadores e segue à disposição para continuar contribuindo com os órgãos fiscalizadores no combate a qualquer desrespeito e descumprimento desses direitos".

Procurada pela EXAME, a Sider enviou uma nota de posicionamento na qual declara que é contra qualquer forma de trabalho análoga à escravidão e que uma defesa será apresentada. "Por respeito a nossos clientes e à sociedade em geral, a Sider informa que todos os seus funcionários têm carteira assinada, salário da categoria e pagamento de todas os benefícios da categoria bem como de horas extras, reafirmando seu compromisso empresarial. Tanto assim, que deixa claro a toda a comunidade, em especial com a defesa a ser apresentada e demonstrando documentalmente que nunca houve trabalho em suas instalações compatíveis com condições análogas à escravidão, posto que as verbas trabalhistas foram sempre quitadas a tempo, para tanto a Sider tomará as medidas judiciais cabíveis visando salvaguardar seus direitos".

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