No Twitter, Elon Musk reclamou que a Apple, que era o maior anunciante de sua empresa, havia “quase parado de anunciar no Twitter”. E perguntou: "Eles odeiam a liberdade de expressão nos EUA?" (Bloomberg Businessweek/BLOOMBERG BUSINESSWEEK)
Leo Branco
Publicado em 18 de dezembro de 2022 às 08h04.
Quando se dirige uma grande empresa de mídia e se essa empresa de mídia obtém 90% de sua receita com publicidade, um bom objetivo básico é não afastar as empresas que mais compram anúncios.
Elon Musk, por outro lado, usou seus primeiros dias no cargo de diretor executivo do Twitter para postar teorias da conspiração, brincar com um rapper antissemita e geralmente fazer tudo ao seu alcance para tornar o aplicativo pouco atraente para os profissionais de marketing.
Os anunciantes previsivelmente, responderam interrompendo suas campanhas. Musk então ameaçou lançar seus admiradores fanáticos contra eles, via “campanha difamatória termonuclear”.
Ele sugeriu que os anunciantes que pararam de investir dinheiro no Twitter estavam se curvando a “ativistas” que estão “tentando destruir a liberdade de expressão na América”. O grupo inclui:
Como relatou o Financial Times, ele ligou pessoalmente para os CEOs de grandes anunciantes “para repreendê-los”, o que fez com que alguns cortassem ainda mais seus gastos.
Isso foi coercitivo e grosseiro, como também um fracasso retumbante. Surpreendentemente, Musk descobriu onde estavam seus limites quando declarou "guerra" à Apple.
Sua campanha começou em 28 de novembro, quando ele reclamou que a Apple, que era o maior anunciante de sua empresa, havia “quase parado de anunciar no Twitter”. E perguntou: "Eles odeiam a liberdade de expressão nos EUA?"
A alegação de que a Apple havia cortado o Twitter não era verdadeira, pelo menos de acordo com dados da Pathmatics, empresa de pesquisa que acompanha os gastos com marketing digital.
Os dados da Pathmatics mostram que, embora a Apple tenha cortado seus gastos com anúncios no Twitter desde o verão — a Apple não explicou por quê, mas uma boa pista para se entender são manchetes como "Elon traz um dos nazistas mais proeminentes dos EUA de volta ao Twitter" — e ainda estava pagando à empresa cerca de US$ 1 milhão por mês.
Nem Musk nem a Apple responderam aos pedidos de comentários.
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Advertindo que o “futuro da civilização” estava em jogo, Musk atacou o CEO da Apple, Tim Cook, insinuando o que ele parecia perceber como a maior vulnerabilidade da Apple: o escrutínio regulatório da sua App Store.
Musk afirmou, sem oferecer provas, que a Apple ameaçou arrancar o Twitter da plataforma. Ele também acusou a empresa de colocar “um imposto secreto de 30% sobre tudo o que se compra”. (A sugestão de sigilo foi cômica; as taxas da App Store têm sido um dos assuntos mais comentados no setor de tecnologia por mais de um ano.)
Para corroborar sua posição, Musk postou um vídeo de paródia criado pela Epic Games, criadora do Fortnite, que processou a Apple em 2020 por causa do esquema de compras no aplicativo, e twittou um meme sugerindo que ele sabia que entrar em guerra com a Apple seria imprudente – mas estava disposto a fazê-lo de qualquer maneira.
Por mais ou menos um dia, parecia que a Apple havia tropeçado em algo sério. Os membros do fã clube de Musk fantasiaram sobre a ridícula possibilidade de seu lorde alfa criar seu próprio concorrente do iPhone, políticos de direita divulgaram declarações preocupadas e Tucker Carlson reagiu como Tucker Carlson.
Havia trechos de pensamento escritos: “Sr. Musk preparou o terreno para uma luta pelo poder”, declarou o New York Times, alertando que a crescente influência de Musk entre os republicanos poderia significar problemas para a Apple.
No DealBook Summit, Mark Zuckerberg, que passou a culpar Cook pelos infortúnios da Meta, em vez de sua própria decisão de desperdiçar dinheiro no metaverso, atacou a Apple como monopolista e “problemática”.
Mas em 30 de novembro, Musk emitiu uma rendição unilateral. Ele apagou o meme e passou a fazer algo que se aproximava da bajulação, postando um vídeo sereno do “belo QG” da Apple e agradecendo a Cook por um tour e uma “boa conversa”. Musk atribuiu tudo a um “mal-entendido”. Não houve menção à taxa da Apple e nada sobre o suposto recuo da publicidade.
Mais tarde, Musk afirmou que a Apple havia “retomado totalmente a publicidade”. A Pathmatics relata que a Apple gastou cerca de US$ 235.000 nos sete dias a partir de 28 de novembro — em outras palavras, a mesma quantia que estava gastando no momento em que Musk declarou guerra.
Fazia sentindo que Musk, que tem comprovada relutância em desistir de uma briga, invertesse o curso de maneira incomum. A Apple não apenas detém o poder sobre os negócios atuais do Twitter, como também controla o que Musk disse ser o futuro da empresa — um esquema concebido às pressas para cobrar dos usuários US$ 8 por mês por um crachá azul de “verificação”, como os das contas de celebridades, jornalistas e políticos.
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Qualquer receita que Musk coletar por meio da App Store estará sujeita a essa taxa, e qualquer esforço de Musk para contornar o sistema da Apple — digamos com um link que envie os usuários do aplicativo do Twitter para a web — provavelmente levaria a empresa a ser banida.
Isso significa que Musk enfrenta a mesma escolha abaixo do ideal de sempre: aceitar cerca de US$ 5,60 por assinante todo mês ou aumentar os preços dentro do aplicativo para iPhone, de modo que sobrarão US$ 8 para ele após os impostos.
Musk tem outras opções. Como apontou meu colega, Mark Gurman, ele poderia abrir uma Netflix e tentar cadastrar assinantes pelo site do Twitter, o que provavelmente resultaria em menos assinaturas. Ele poderia optar por desafiar a Apple, como a Epic tentou fazer, embora o processo da Epic tenha terminado a favor da Apple e o Fortnite ainda continue excluído de sua App Store.
Outra fonte de influência para Musk — sua capacidade de conseguir que os políticos de direita sigam seu exemplo — é menos robusta do que pode parecer. Sim, ele conseguiu direcionar a cobertura da Fox News, mas seus aliados no Partido Republicano se posicionaram, em sua maioria, como amigos das maiores empresas do mundo.
O representante de Ohio, Jim Jordan, provavelmente o próximo presidente do Comitê Judiciário da Câmara, se opôs aos projetos de lei antitruste destinados a controlar as grandes empresas de tecnologia que foram aprovados na Câmara dos Deputados no início deste ano. (Os projetos de lei ainda não foram levados para votação no Senado e não está claro se os democratas terão atraído apoio suficiente.) Olhando-se para a futuro, Jordan parece mais focado em controlar a presidente da Comissão Federal de Comércio, Lina Khan.
Após uma recente reunião com Cook, Jordan declarou que a disputa sobre a App Store havia sido “resolvida”. Ele então reclamou das operações da Apple na China, prometendo “chegar ao âmago” da potencial influência que Pequim exerce sobre as grandes empresas americanas. A linha de investigação também pode ser uma ameaça para Musk, que se expandiu agressivamente na China.
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Claro, a capacidade da Apple de manipular um bilionário vituperativo é um indicativo do poder mais amplo da empresa em tecnologia. Enquanto Musk fazia suas vazias ameaças, a bolsa de criptomoedas Coinbase Global disse que a Apple bloqueou seu último lançamento de aplicativo por causa de um recurso que a empresa alegou violar a política de taxa de 30%. Como Musk, a Coinbase não tinha boas opções, exceto retirar o recurso e reclamar no Twitter.
A Apple tinha todas as cartas: seu sistema operacional iPhone funciona na maioria dos smartphones dos EUA, a empresa é responsável pela grande maioria dos lucros globais de smartphones e parece haver pouco eleitorado organizado para minar esse poder por meio de regulamentação.
Se alguém deseja ter acesso aos usuários do iPhone que lucram, precisa seguir as regras de Cook. Mas todos têm permissão para tuitarem o quanto quiserem.
Tradução de Anna Maria Dalle Luche.