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A nova Qualicorp: É preciso amar como se não houvesse amanhã, diz CEO

Em entrevista, Bruno Blatt fala sobre o que mudou na administradora, que volta a chamar a atenção do mercado

O presidente da Qualicorp, Bruno Blatt (Qualicorp/Divulgação)

O presidente da Qualicorp, Bruno Blatt (Qualicorp/Divulgação)

Mariana Desidério

Mariana Desidério

Publicado em 16 de outubro de 2020 às 09h00.

Última atualização em 16 de outubro de 2020 às 11h30.

O executivo Bruno Blatt assumiu o comando da administradora de planos de saúde Qualicorp em novembro do ano passado. Teve pouco tempo de gestão antes que a pandemia do novo coronavírus chegasse e impusesse um modelo de trabalho diferente de tudo o que se conhecia até aqui.

A chegada de Blatt trouxe frescor a uma companhia acostumada com um estilo de gestão mais engessado e agressivo. Blatt já tinha passado antes pela administradora, em 2009, quando a Qualicorp comprou uma corretora de planos de saúde fundada por ele. Agora, chegou com poder de “mexer em tudo”. Após quase um ano no comando, o executivo destaca os pilares de sua atuação até aqui, em entrevista exclusiva a EXAME.

“Gosto de fazer coisas que tenham valor para as pessoas. Como dizia Renato Russo, a gente tem que amar as pessoas como se não houvesse amanhã. Se fizermos uma gestão só olhando a margem, é algo fake, daqui um tempo o resultado se perde. E a pauta de desenvolvimento das pessoas vai trazer crescimento para a empresa, não tem como não trazer”, afirma o executivo.

Planos mais acessíveis

Nos últimos doze meses, os principais focos da gestão de Blatt foram revisão da estratégia da empresa, cultura e governança.  Na ponta da estratégia de negócios, o mantra do executivo é ampliar o acesso. Em um setor de preços crescentes em um cenário de crise econômica, o desafio da administradora (e de todas as empresas que trabalham com planos de saúde) é oferecer produtos que caibam no bolso do cliente.

Para isso, lançou nos últimos meses mais de 20 novos produtos, com destaque especial para as parcerias com operadoras regionais e produtos voltados para famílias. A Qualicorp fechou parceria com a Assim Saúde, operadora verticalizada do Rio de Janeiro, com a Paraná Clínicas, e o Grupo Notredame Intermédica, uma das maiores operadoras de saúde do país que trabalha com produtos de ticket médio mais baixo.

“É uma ampliação de portfólio para encontrar clientes que não se encaixavam nos nossos produtos antes, pessoas que não têm como pagar planos de operadoras mais caras como Amil, Sulamérica ou Bradesco”, diz.

Também criou com a Sulamérica um plano familiar, com descontos para inclusão de dependentes. “Esse é um produto inédito, há um ano nenhuma seguradora falava em plano familiar, é algo que vem da nossa estratégia de inovação”, afirma Blatt.

Em outra frente, está olhando para o mercado de pequenas e médias empresas e de quem trabalha como pessoa jurídica, os PJs, um público que nunca esteve muito no foco da Qualicorp. Também trabalha em canais alternativos para os clientes possam acessar os planos de saúde, modelos ainda em gestação.

 

 

Diversidade e nova cultura

Já na frente das mudanças na cultura da empresa, Blatt trouxe para a Qualicorp discussões já conhecidas de companhias mais modernas, com foco em garantir mais diversidade e bem-estar aos funcionários. “Eu não teria vindo se não tivesse um propósito. E meu legado é poder fazer diferença na vida das pessoas, sejam clientes, funcionários ou parceiros”, afirma.

A Qualicorp chegou a 68% de mulheres no quadro de funcionários, sendo 59% delas em cargos de liderança; 29% de negros e pardos no total, sendo 30% em cargos de liderança, e 5% de pessoas com deficiência física. Também ampliou a licença maternidade e a licença paternidade, criou a licença para casais homoafetivos e contratou grávidas, um tabu no mundo corporativo. Liberou ainda o dress code dos funcionários e implementou a short Friday, com possibilidade de encerrar o expediente mais cedo na sexta-feira.

No escritório, acabou com a sala da presidência e tornou a relação entre funcionários mais horizontal. Com o avanço da pandemia, a mudança no escritório ficou mais radical. A companhia já devolveu doze dos quinze andares de sua sede. Os funcionários continuam em trabalho remoto – as atividades presenciais só devem voltar em janeiro, mas já em formato diferente.

“O home office pelo menos três vezes por semana veio para ficar. O modelo de escritório antigo não faz mais sentido. Não será um lugar para ir todo dia trabalhar, mas sim para as pessoas se reunirem e criarem vínculos”, diz.

Enquanto reduz o espaço fixo para funcionários, a Qualicorp criou espaços para os corretores, que antes não existiam. São dois espaços, um em São Paulo e outro no Rio de Janeiro, para atividades de capacitação.

 

Governança e interesse do mercado

No lado da governança, a Qualicorp tem reforçado sua equipe de compliance e está preocupada em melhor sua comunicação com o mercado. A atenção a isso vem em momento crucial: no dia 21 de julho, a sede da empresa em São Paulo foi alvo de uma ação de busca e apreensão da Polícia Federal, no âmbito de uma operação que investiga a participação do fundador da empresa, José Seripieri Junior, em um esquema de pagamento de caixa dois para a campanha de José Serra (PSDB), em 2014.  A empresa ressalta que não é alvo das investigações, apenas ex-executivos, e que está colaborando com as autoridades. Dentre as mudanças implementadas nesse período, está também a mudança de algumas pessoas em cargos executivos.

O olhar mais atento ao tema já gera frutos. O Bank of America soltou relatório recente recomendando compra das ações da empresa. O documento começa com a seguinte frase: “bem-vindos à nova Qualicorp”.  Os analistas do banco ressaltam as mudanças na empresa desde que a Rede D’Or entrou como acionista da administradora.

“Com isso vem uma mudança de cultura, um redesenho de estratégia e uma reavaliação de prioridades. Uma estrutura de governança corporativa mais sólida e transparente. Uma estratégia orientada ao crescimento e à inovação. E, não menos importante, uma nova forma de comunicação com todas as partes interessadas. Acreditamos que essas mudanças habilitam a nova Qualicorp para um caminho mais brilhante pela frente”, diz o relatório.

Dentre os pontos destacados na estratégia da Qualicorp pelos analistas do banco estão a diversificação de produtos a serem oferecidos a seus atuais clientes , a internalização de algumas atividades de call-centers e as mudanças em processos para melhorar o atendimento e a retenção dos clientes. Destaca também os investimentos em tecnologia e análise de dados.

Apesar de ser a maior administradora de benefícios do país, com 1,2 milhão de vidas, a companhia ainda vê muito espaço para crescer. “Os planos coletivos hoje têm cerca de 6 milhões de vidas. As administradoras cobrem 3 milhões desses clientes. E nós temos só 1,2 milhão”, diz Blatt. Uma das frentes de crescimento é a de fusões e aquisições. A companhia está em busca de oportunidades tanto para adquirir carteiras de clientes, quanto em outras frentes estratégicas, e deve anunciar aquisições em breve. Em junho, adquiriu a carteira da administradora Clube Care, com 14 mil clientes, por 20 milhões de reais.

Tantas mudanças em um ano começam a atrair o interesse dos investidores, em um momento nebuloso para o mercado de saúde. Ainda que algumas companhias tenham ganhado mercado na pandemia, o efeito do aumento do desemprego na carteira de clientes das operadoras ainda é incerto. Ainda assim, nos últimos doze meses, a Qualicorp acumula alta de 12% na bolsa de valores brasileira B3, ante queda de 5% do Ibovespa (isso entre as altas e baixas causadas pela pandemia).

Nos números, a Qualicorp vem andando de lado (o que em um período de pandemia não é necessariamente uma má notícia). No segundo trimestre de 2020, teve receita de 483,7 milhões de reais, queda de 2,8% em relação ao mesmo período do ano anterior. O lucro no trimestre foi de 126,7 milhões de reais, devido a ganhos não recorrentes, o que representou alta de 21,5% em relação ao mesmo período do ano anterior. A receita de 2019 foi de 2 bilhões de reais, alta de 3,7% em relação a 2018. O lucro foi de 392,8 milhões, queda de 0,6%.

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