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Venezuela: entenda por que a comunidade internacional desconfia de vitória de Maduro

Regime chavista recorreu a inabilitação seguidas de candidatos da oposição e dificultou o registro de eleitores no exterior, insatisfeitos com a situação política no país

Vista aérea de uma bandeira venezuelana carregada por venezuelanos que vivem no México do lado de fora da embaixada da Venezuela na Cidade do México em 28 de julho de 2024, durante o dia da eleição em seu país. Os venezuelanos votam no domingo entre a continuidade do presidente Nicolás Maduro ou a mudança no rival Edmundo Gonzalez Urrutia em meio à alta tensão após a ameaça do titular de um "banho de sangue" se ele perder (ALFREDO ESTRELLA/AFP)

Vista aérea de uma bandeira venezuelana carregada por venezuelanos que vivem no México do lado de fora da embaixada da Venezuela na Cidade do México em 28 de julho de 2024, durante o dia da eleição em seu país. Os venezuelanos votam no domingo entre a continuidade do presidente Nicolás Maduro ou a mudança no rival Edmundo Gonzalez Urrutia em meio à alta tensão após a ameaça do titular de um "banho de sangue" se ele perder (ALFREDO ESTRELLA/AFP)

Agência o Globo
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Publicado em 29 de julho de 2024 às 08h48.

Última atualização em 29 de julho de 2024 às 08h48.

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O resultado divulgado pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela, que apontou a reeleição do presidente Nicolás Maduro com 51% dos votos, tornou-se rapidamente alvo de contestação pela comunidade internacional, em meio a acusações da eleição sobre não ter tido acesso às atas de urna em todas as seções eleitorais. As incertezas sobre a confiabilidade do resultado marcam um processo repleto de interferências do regime chavista sobre todas as fases da disputa.

A lista de interferências no processo prévio ao dia da votação é longo, com impactos em diferentes etapas. Desde a inabilitação de candidatos oposicionistas, que quase ficaram sem representação e tiveram pouco tempo para fazer campanha, até estratégias de intimidação contra apoiadores, simpatizantes e até mesmo contra prestadores de serviço, o regime chavista dificultou o caminho para que outras opções se apresentassem ao público. Também dificultou o acesso de auditores internacionais e de registro de eleitores, sobretudo em públicos considerados hostis ao governo.

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Inabilitação de políticos

A primeira dificuldade para a oposição foi conseguir definir o nome que concorreria contra Maduro. Ao contrário do presidente, herdeiro político de Chávez e à frente do governo desde 2013, a oposição partiu de um cenário escasso de postulantes, com alguns de seus nomes mais conhecidos, como Henrique Caprilles, Leopoldo López e Juan Guaidó inabilitados para concorrer.

Na tentativa de aumentar a mobilização popular e encontrar um nome forte para concorrer, criou-se uma frente oposicionista unificada, realizando-se um processo de prévias eleitorais que resultou na
vitória acachapante de María Corina Machado, ex-deputada e representante da ala mais radical antichavista. Em meio à sua ascensão política, contudo, María Corina foi inabilitada por 15 anos por uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça, controlado pelo regime.

A oposição ficou dividida entre apostar tudo na "Dama de Ferro" ou procurar uma opção viável, até que
a própria María Corina decidiu retirar sua candidatura, após o Ministério Público — outra instituição aparelhada pelo chavismo — emitirnove mandatos de prisão contra dirigentes de seu partido às vésperas do prazo final para registro de candidatura, pelo suposto planejamento de "ações desestabilizadoras".

A escolhida para substituir María Corina foi a professora universitária Corina Yoris, doutora em História e mestre em Filosofia, que havia sido integrante da comissão organizadora das primárias da oposição. Apesar de o partido de Yoris, o Plataforma Unitária Democrática, não ser alvo de condenações ou sanções judiciais, como oficialmente era o partido Vem Venezuela, de María Corina, a professora foi impedida de se registrar como candidata à Presidência, gerando uma reação do Itamaraty à época.

Em uma terceira tentativa, a oposição encontrou consenso para indicar um terceiro nome, o do diplomata Edmundo González Urrutia, de 74 anos. Com pouco mais de três meses para fazer campanha, as pesquisas apontavam González com vantagem sobre Maduro, em um aparente sucesso para captar a migração de votos de María Corina.

As inabilitações na disputa presidencial são apenas uma fração das ações do governo e de suas instituições em barrar a oposição. Ao longo de todo o processo eleitoral, a coligação de oposição denunciou que aliados políticos foram inabilitados no âmbito de disputas municipais após respaldarem politicamente o grupo de González e María Corina.

Prisão de opositores

Se os candidatos ou pré-candidatos sofreram repressão no campo político, aliados e apoiadores das campanhas de María Corina e González tiveram de lidar com consequências judiciais, alguns deles de natureza penal.

Em um dos casos mais recentes, María Corina — que segue participando de atos políticos da oposição a favor de González pelo país — denunciou a prisão do chefe de sua equipe de segurança a duas semanas da eleição. Quando se pronunciou sobre a prisão do segurança, a opositora disse que outros integrantes de sua equipe teriam sido "sequestrados" pelo regime, um termo que remete a um modus operandi em que as pessoas seriam levadas pelas autoridades, sem que seu destino fosse informado.

O coração da campanha opositora também foi vítima de perseguição do governo. Seis integrantes da cúpula da campanha estão asilados na Embaixada da Argentina em Caracas após se tornarem alvos de mandados de prisão emitidos sob o argumento de que estariam tentando "desestabilizar" o país. O grupo em asilo inclui Magalli Meda, chefe do bloco de oposição, Claudia Macero, jornalista responsável pela comunicação nacional, Pedro Urruchurtu, coordenador de relações internacionais e Humberto Villalobos, responsável pela logística eleitoral.

Em uma nota conjunta na semana passada, Argentina, Costa Rica, Guatemala, Paraguai e Uruguai exigiram o "fim do assédio e da perseguição e repressão" contra opositores, além da
emissão de salvos-condutos para os seis.

Controle da autoridade eleitoral

O controle do regime chavista sobre o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) — órgão em que o governo tem três de cinco cadeiras — também teve impacto na campanha eleitoral, como na falha no registro da candidatura da primeira substituta de María Corina, Corina Yoris, e, assim, motiva preocupações posteriores ao pleito.

O órgão eleitoral é presidido por um chavista de alta patente, Elvis Amoroso, um aliado próximo de Maduro. Recentemente, um dos cinco reitores, Juan Carlos Delpino, acusou Amoroso de tomar decisões unilaterais, em uma denúncia de que conselho estaria sendo esvaziado. De acordo com Delpino, os reitores não vêm se reunindo "desde março", declaração que não foi oficialmente rebatida.

Em entrevista ao portal venezuelano Efecto Cocuyo, Delpino afirmou que foi de Amoroso a decisão de retirar o convite a uma delegação da União Europeia para acompanhar o pleito no país e acusou o órgão de ter censores internos.

Embora o sistema de votação em si seja de difícil manipulação, especialistas alertam que um risco diante do nível de controle que o governo exerce sobre o órgão é que o CNE divulgue um resultado fraudulento, em caso de derrota de Maduro, e dificulte o acesso às formas de auditar às urnas, como ocorreu durante as eleições da Assembleia Nacional Constituinte, em 2017, e no referendo de anexação da Guiana Essequibo, que apresentaram números de participação amplamente contestados.

Limitação do cadastro de eleitores

Com as pesquisas de intenção de voto apontando vantagem para o candidato de oposição, analistas sugeriram que o governo Maduro estaria tentando reduzir a participação no pleito a fim de reverter o cenário eleitoral, sem ter de tirar toda a vantagem de votos.

Dados coletados pela agência de notícias EFE apontam que o governo conseguiu limitar a participação da diáspora venezuelana a partir do exterior: apenas 69 mil pessoas foram autorizadas a votar no estrangeiro, de um número estimado de sete milhões e meio de pessoas — cinco milhões de adultos — que vivem fora do país.

De acordo com a oposição, fatores como um período curto para o registro das candidaturas, a pouca divulgação e a imposição de barreiras legais para que as pessoas se registrassem dificultaram os procedimentos.

Manuel Camilo González, especialista em sistemas eleitorais e professor de Relações Internacionais da Universidade Javeriana de Bogotá, explicou ao El País que a baixa participação nas urnas costuma beneficiar os regimes no poder.

"Com baixa participação, as pessoas que vão votar [na eleição] são o núcleo duro deles [regimes no poder], que mobilizam com coerção e clientelismo", afirmou o especialista.

Intimidação direta

Um aspecto relevante no período de pré-campanha, que também preocupa a oposição para o dia da votação, é a intimidação direta a eleitores, apoiadores ou mesmo populares com os vínculos mais improváveis com qualquer setor da oposição.

Um caso que ganhou repercussão internacional na reta final da campanha foi o das irmãs Corina e Elys Hernández, que tiveram seu negócio fechado
após venderem 14 quentinhas e um punhado de empanadas
a María Corina Machado. Após o caso repercutir na internet, os quitutes foram rebatizados pelos internautas de "empanadas da liberdade".

Em uma escalada de repressão entre os meses de maio e junho, uma série de trabalhadores contratados para prestar serviço em comícios e atos da oposição foram intimidados e levados à interrogatório. Seis operadores de equipamento de som, um caminhoneiro que recolhia material para um evento de campanha e quatro homens com canoas que asseguravam o transporte em um posto avançado venezuelano empobrecido foram detidos, segundo um levantamento realizado pelo New York Times em meados de março. (Com El País e NYT)

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