Mundo

Venezuela: 27% da população quer sair do país e 68% tem dificuldade em comprar comida

Governo e oposição alegam ter vencido as eleições; está em jogo a vida de 28 milhões de venezuelanos

Apoiadores do presidente da Venezuela e candidato à reeleição, Nicolás Maduro, seguram cartazes em evento de campanha em Caracas (Venezuela) (Miguel Gutiérrez/EFE)

Apoiadores do presidente da Venezuela e candidato à reeleição, Nicolás Maduro, seguram cartazes em evento de campanha em Caracas (Venezuela) (Miguel Gutiérrez/EFE)

Luciano Pádua
Luciano Pádua

Editor de Macroeconomia

Publicado em 29 de julho de 2024 às 14h07.

Última atualização em 29 de julho de 2024 às 14h34.

A população da Venezuela foi às urnas neste domingo, 28, para decidir se o atual presidente Nicolás Maduro seguiria no cargo de presidente, o qual ocupa desde 2014. O resultado, como esperado, está sendo contestado: Maduro foi declarado vitorioso pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), com 51,2% dos votos ante 44,2% de Edmundo González Urrutia, candidato da oposição — que por sua vez diz ter vencido com 70% dos votos.

Entre as discordâncias sobre o resultado está em jogo a vida de 28 milhões de venezuelanos, cuja situação piorou substancialmente nos últimos 25 anos desde que Hugo Chávez — pai do movimento chavista, do qual Maduro é herdeiro — assumiu o país.

São anos de políticas econômicas fracassadas, erosão das instituições democráticas e repressão à dissidência política afetaram profundamente os venezuelanos, deixando-os frustrados enquanto enfrentam uma complexa crise humanitária. O instituto de pesquisa americano Gallup trabalha em pesquisas sobre o país há décadas e acompanha profundamente os sentimentos dos cidadãos.

"A maioria dos venezuelanos luta para comprar comida, não se sente segura onde vive e questiona a honestidade das eleições. E, embora o desejo dos venezuelanos de deixar o país tenha diminuído em relação aos recordes anteriores, mais de um quarto ainda deseja sair", diz o instituto em relatório.

Abaixo, veja quatro gráficos que ilustram as perspectivas de vida dos venezuelanos, que terão nos próximos dias mais turbulência política.

A maioria dos venezuelanos tem dificuldade para comprar comida e se sente insegura

Anos de escassez de alimentos e hiperinflação, após a queda dos preços do petróleo há quase uma década, continuam tornando até as necessidades mais básicas inacessíveis para a maioria dos venezuelanos.

A proporção de cidadãos que relatam ter enfrentado dificuldades para comprar comida caiu na comparação com 2016, ano em que os venezuelanos estavam entre os mais propensos no mundo a relatar isso, segundo o Gallup.

Mas, diz o instituto, os 68% que "lutam hoje ainda representam a maior porcentagem na América Latina". "Essas dificuldades afetam venezuelanos de todos os níveis de renda; mesmo 59% dos 20% mais ricos disseram que não conseguiram comprar comida em algum momento", diz o Gallup.

"Além da escassez de alimentos e medicamentos e dos custos elevados, os venezuelanos também enfrentam o aumento da insegurança e violência. Embora a Venezuela não seja mais classificada como o país menos seguro do mundo em 2023, mais da metade dos venezuelanos (54%) hoje dizem que não se sentem seguros andando sozinhos à noite onde vivem", diz o relatório.

Venezuelanos perdem a confiança nas eleições durante o governo Maduro

Outro ponto que chama a atenção é a falta de confiança no sistema eleitoral do país. No momento, o governo e a oposição alegam, com números diametralmente opostos, terem vencido as eleições.

De 2006 a 2023, os cidadãos que dizem confiar no sistema de votação venezuelano caiu de 44% para 26%. 

"As pesquisas da Gallup ao longo dos anos refletem consistentemente a falta de confiança dos venezuelanos na honestidade das eleições desde que Maduro assumiu o poder após a morte de Hugo Chávez em 2013", diz o instituto.

"O desafio da oposição não é apenas derrotar as manobras de Maduro para manipular a eleição, mas também superar a desconfiança dos eleitores no sistema eleitoral."

Desejo dos venezuelanos de emigrar ainda é o dobro do que era há uma década

Um dos efeitos imediatos do resultado na eleição da Venezuela é um maior ou menor desejo de imigração por parte das pessoas. Estima-se que mais de 7 milhões de venezuelanos vivam fora do país.

"Embora o desejo de migração tenha esfriado na Venezuela antes da eleição, caindo para 27% em 2023 em comparação com 41% em 2021, observadores acreditam que ele pode atingir níveis recordes novamente caso Maduro consiga permanecer no poder. Apesar do recente declínio, o desejo dos venezuelanos de deixar o país para sempre permanece duas vezes mais alto do que era antes de Maduro assumir o poder em 2013", diz o Gallup.

Segundo o instituto, o desejo de migrar dos venezuelanos se alinha com as taxas de migração nas últimas décadas. "Durante a maior parte da era democrática pré-Chávez (1958-1998), a migração líquida na Venezuela foi positiva (média de +0,16). A média durante o governo de Chávez foi negativa (-0,98), e as portas se abriram sob Maduro (-15,89)", afirmam.

Avaliação dos venezuelanos sobre sua vida melhora, mas ainda não se recuperou

O instituto de pesquisa destaca que nenhum país no mundo viu a avaliação de seus habitantes sobre sua vida cair tanto e tão rápido quanto a Venezuela entre 2012 e 2016. "Em 2012, o ano antes de Maduro assumir o cargo, 57% dos venezuelanos avaliavam sua vida positivamente o suficiente para serem considerados “prósperos”. Em 2016, essa cifra era de apenas 13%", diz o instituto de pesquisa.

A sensação sobre sua vida melhorou nos últimos anos, com 34% avaliando-as positivamente o suficiente para serem considerados prósperos.

"No entanto, esse nível está longe dos de uma década atrás, e a Venezuela empata com a Bolívia pelos menores números de prosperidade na América Latina", diz o Gallup.

"Por quase duas décadas, a Gallup pediu aos residentes de países latino-americanos e do resto do mundo que avaliassem sua vida na Escala de Auto-Ancoragem de Cantril, onde zero representa a pior vida possível e 10 representa a melhor vida possível. A Gallup classifica as pessoas como "prósperas" se avaliarem sua vida atual com 7 ou mais e sua vida em cinco anos com 8 ou mais, e como "sofrendo" se avaliarem tanto a situação atual quanto a futura com 4 ou menos. Aqueles no meio estão "lutando"."

Acompanhe tudo sobre:VenezuelaNicolás Maduro

Mais de Mundo

Exportações da China devem bater recorde antes de guerra comercial com EUA

Yamandú Orsi, da coalizão de esquerda, vence eleições no Uruguai, segundo projeções

Mercosul precisa de "injeção de dinamismo", diz opositor Orsi após votar no Uruguai

Governista Álvaro Delgado diz querer unidade nacional no Uruguai: "Presidente de todos"