O presidente argentino Javier Milei ao lado de Donald Trump e Elon Musk em um jantar organizado em homenagem ao presidente eleito dos Estados Unidos, em 14 de novembro de 2024 em Palm Beach, Flórida (Divulgação/AFP)
Repórter de macroeconomia
Publicado em 15 de dezembro de 2024 às 06h01.
Em seu primeiro ano de mandato, completado neste começo de dezembro, o presidente argentino Javier Milei buscou se aproximar de Donald Trump. Os dois trocaram elogios públicos ao longo de 2024, e Milei foi o primeiro líder estrangeiro a se encontrar com o republicano depois que ele venceu as eleições presidenciais.
No encontro, durante um jantar de gala em 14 de novembro em Mar-a-Lago, mansão de Trump na Flórida, Milei subiu ao palco e fez elogios. "Foi o maior retorno político da história, desafiando todo o 'establishment' político, inclusive arriscando a própria vida", disse o argentino.
Agora, há a expectativa de que o argentino compareça à posse de Trump, marcada para 20 de janeiro, algo incomum. Pela tradição das últimas décadas, chefes de Estado estrangeiros não vão na posse do presidente dos EUA, mas Trump convidou alguns líderes com quem tem alinhamento ideológico. A assessoria de Trump disse que foram feitos convites, mas não confirmou os nomes.
Nos dias antes e depois da visita de Milei a Trump após a eleição, o argentino deu mais sinais de alinhamento ao republicano. Em 30 de outubro, ele demitiu a chanceler Diana Mondino depois que a Argentina deu um voto contra o embargo dos EUA a Cuba na ONU. No dia 13 de novembro, determinou que a delegação argentina deixasse a COP29, em Baku, antes do final. Trump é contra o Acordo de Paris e minimiza as consequências das mudanças climáticas.
No G20, em 18 de novembro, Milei também buscou impor suas visões. Ele assinou a declaração final do encontro, no Rio de Janeiro, mas deixou claro que discordava de vários pontos.
"O presidente Javier Milei não acompanha vários pontos da declaração, entre eles: a promoção da limitação da liberdade de expressão em redes sociais, o esquema de imposição e vulnerabilidade da soberania das instituições de governança global, o tratamento desigual ante a lei e especialmente a noção de que uma maior intervenção estatal é a forma de lugar contra a fome", disse o governo argentino, em nota.
"A aliança entre Trump e Milei não vai tanto em termos bilaterais, mas sim no que podem fazer juntos em alguns fóruns, como as Nações Unidas e a COP ", diz Juan Carranza, analista político.
Carranza avalia que Milei não deverá retirar a Argentina de imediato do Acordo de Paris, como Trump promete fazer com os Estados Unidos, porque ele tem minoria no Congresso e porque a saída dificultaria exportações, especialmente para a União Europeia.
Ao mesmo tempo em que se aproximou de Trump, Milei buscou reduzir o tom contra a China e adotar um tom pragmático com o Brasil. Na campanha eleitoral, Milei disse que não faria negócios com comunistas.
Um ano depois, ele fez elogios públicos ao país. "A China é um parceiro comercial muito interessante, porque não exige nada, só quer que você a deixe em paz", disse Milei, em outubro.
Em novembro, ele se reuniu com o presidente Xi Jinping às margens do G20. Após o encontro, disse, em uma rede social, que enviava seus "mais sinceros desejos de bem-estar ao povo da China".
"Com Trump, Milei está definitivamente tentando ser seu amigo, e eles estão falando a mesma língua. E eles meio que vêm do mesmo campo. Milei foi muito anti-China durante sua eleição, e está vindo de uma base muito negativa para uma base na linha de 'ok, eu posso trabalhar com a China. Vamos achar uma posição justa e equilibrada", diz Malcolm Dorson, estrategista-chefe de mercados emergentes da gestora americana Global X.
"Não vejo o mesmo tom positivo que ele tem com os EUA. Com a China, ele está apenas tentando manter todas as portas abertas", afirma Dorson.
Carranza também vê uma relação pragmática entre Argentina e China, e dá como exemplo o swap cambial entre os dois países. Em outubro de 2023, o banco central chinês disponibilizou US$ 6,5 bilhões à Argentina por este instrumento. No mês seguinte, a Argentina usou US$ 2,6 bilhões dele para pagar parte de sua dívida com o FMI. O acordo foi renovado em junho deste ano.
Apesar das críticas de Milei no G20, e de um cumprimento protocolar ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante o evento, o governo argentino assinou um acordo com o Brasil para exportar gás das reservas de Vaca Muerta ao país, em um sinal claro de que as posturas ideológicas não impedem acordos.
“A Argentina faz mais discursos do que gestos. Existe um discurso e uma realidade. No mundo real, é uma questão de sobrevivência", disse Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia do Brasil, em entrevista coletiva. "Outro dia faltou gás em uma cidade argentina e nós suprimos."