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Governo Lula aposta em pragmatismo para lidar com eventual vitória de Trump nos EUA

Biden e Lula vivem momento de proximidade, e possível vitória de Trump mudaria prioridades do governo americano. Brasil observa com cuidado o cenário no país

Rafael Balago
Rafael Balago

Repórter de macroeconomia

Publicado em 19 de março de 2024 às 11h47.

WASHIGNTON DC, EUA - Brasil e Estados Unidos vivem um momento de boa relação entre os governos. Os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Joe Biden defendem pautas comuns, como o combate à crise climática e o aumento dos direitos aos trabalhadores. No entanto, os americanos vão às urnas neste ano, e há chance de uma mudança de comando: o ex-presidente Donald Trump está na disputa e com chances reais de vitória. E para autoridades brasileiras consultadas pela EXAME a ordem do dia é tratar uma eventual vitória de Trump com pragmatismo. 

Embora Trump tenha postura contrária a Biden em temas como mudanças climáticas e a política externa dos EUA, autoridades do governo brasileiro esperam que uma eventual troca de comando na Casa Branca não afete de forma significativa as relações entre os dois países.

"Temos que ter um certo pragmatismo. Negócios à parte. Todo mundo tem direito às suas preferências, mas quando você está em uma função como a nossa, liderando um país como o Brasil, você não pode incorrer no erro que o governo passado cometeu. Por conta de preferências em relação a Argentina, China e os próprios Estados Unidos, o Brasil perdeu negócios importantes e deixou de estar presente no mundo. Isso não pode acontecer”, disse Jorge Viana, presidente da Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos), em entrevista em Washington. 

Os presidentes Lula e Joe Biden, durante visita do líder brasileiro à Casa Branca, em fevereiro de 2023 (Ricardo Stuckert/PR/Flickr)

Diplomatas ouvidos pela EXAME avaliam que uma vitória de Trump não deve reverter as parceiras em temas ambientais de forma rápida, pois muitas delas envolvem negócios que, ao final, podem trazer lucros para empresas americanas. Assim, elas não teriam interesse em abrir mão desses projetos. 

O republicano questiona as medidas para conter as mudanças climáticas. Quando presidente, ele retirou os EUA do Acordo de Paris, principal acordo internacional sobre o tema. Os americanos voltaram ao tratado com a posse de Biden. Trump não vê problema em manter o uso de combustíveis fósseis e não tem pressa em acelerar a adoção de energias limpas, uma das bandeiras de Biden.  

O ex-presidente também defende uma política externa mais isolacionista, com menor atuação dos EUA em organismos internacionais. Ele ainda iniciou uma guerra comercial com a China, com medidas que acabaram sendo mantidas durante o governo Biden. 

Viana, da Apex, avalia que o conflito comercial com os asiáticos abre espaço para um avanço brasileiro. "Os Estados Unidos estão buscando reduzir as exportações da China, e o Brasil precisa aproveitar essa oportunidade para substituir essas importações", disse.

O Brasil avalia oportunidades inclusive para ampliar sua participação nas cadeias de fornecimento de semicondutores e chips consumidos pelos EUA.

"Tem havido uma conversa muito interessante com nossos interlocutores nos Estados Unidos de que o Brasil teria condições e interesse de aproveitar o movimento que tem sido feito nos Estados Unidos de desenvolvimento de cadeias de produção para semicondutores", afirmou a embaixadora do Brasil em Washington, Maria Luiza Viotti.

Na diplomacia brasileira, a postura é a de seguir buscando uma posição de neutralidade, para manter parcerias tanto com a China quanto com os EUA.

Os profissionais do Itamaraty costumam ressaltar com frequência que as relações entre os países não dependem apenas das relações diretas entre os presidentes, mas dos acordos e parcerias feitos entre os diversos níveis de governo. 

200 anos de relações Brasil-EUA

Para os próximos meses, há vários eventos previstos para avançar pautas em comum. Também haverá a celebração dos 200 anos das relações diplomáticas entre os dois países, em maio.

Em fevereiro, o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, esteve em Brasília e se reuniu com o presidente Lula. A Secretária do Tesouro, Janet Yellen, também veio ao país e fez elogios públicos à reforma tributária brasileira e ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Os dois secretários vieram ao país e também participaram de eventos do G20, grupo presidido pelo Brasil neste ano. A reunião de cúpula do G20 será nos dias 18 e 19 de novembro no Rio de Janeiro, e há a expectativa de que Biden compareça. A ocasião traz a oportunidade de uma visita de Estado a Lula, para retribuir a ida do brasileiro à Casa Branca no ano passado. Biden não veio à América do Sul como presidente desde que tomou posse. Em novembro, também serão realizadas as eleições americanas, e o democrata poderá chegar ao Brasil como presidente recém-reeleito ou como candidato derrotado. 

Uma vitória de Trump seria celebrada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, que expressa admiração pessoal pelo republicano e buscou se aproximar dele em seu governo. Durante a pandemia, ambos buscaram minimizar a gravidade da crise e combateram medidas como o isolamento social e o uso de máscaras. Em 2020, o então presidente brasileiro deu apoio público ao republicano na disputa pela reeleição. Depois da divulgação dos resultados, Bolsonaro demorou semanas para reconhecer a vitória de Biden. 

Com isso, a relação do governo Bolsonaro com Biden começou de forma  mais distante. A primeira reunião bilateral entre os dois ocorreu em junho de 2022, em meio à Cúpula das Américas, em Los Angeles. Na ocasião, Bolsonaro se comprometeu a aceitar o resultado das urnas. Ele disputou a reeleição em outubro e perdeu para Lula. Ao mesmo tempo, parlamentares democratas e outros líderes políticos americanos buscaram questionar publicamente o Brasil pelo aumento do desmatamento e pelo risco à democracia. 

O governo americano buscou deixar claro que não toleraria nenhum tipo de golpe ou ação para mudar o resultado das eleições no Brasil. A vitória de Lula foi reconhecida rapidamente por Biden, que o recebeu na Casa Branca em fevereiro de 2023, logo no início do mandato do brasileiro.

Em um sinal de que as divergências políticas não afetam tanto os negócios, o fluxo comercial entre os dois países teve recorde em 2022, ano em que Bolsonaro e Biden eram presidentes e não tinham relação próxima. As trocas entre os dois países movimentaram 88,7 bilhões de dólares, segundo dados da Amcham (Câmara de Comércio Brasil-EUA).

Em 2023, o valor recuou para 74,8 bilhões de dólares, puxada em parte por uma forte queda nas importações de produtos americanos pelo Brasil. 

Eleições nos EUA

A EXAME cobre em detalhes as eleições americanas em seu podcast O Caminho para a Casa Branca. Acompanhe todos os episódios:

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O repórter viajou a convite da Apex. 

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