Donald Trump: presidente vinha com taxas altas de aprovação antes da pandemia (Kevin Lamarque/Reuters)
Carolina Riveira
Publicado em 15 de agosto de 2020 às 08h00.
Está aberto o balcão de apostas sobre quem será o próximo presidente americano depois das eleições de 3 de novembro. E o que era talvez uma das projeções mais esperadas dessa eleição foi publicada nesta semana: o site FiveThirtyEight, do estatístico Nate Silver, colocou no ar seu modelo de probabilidade e apontou que Joe Biden tem 73% de chances de vencer as eleições contra o presidente Donald Trump.
A estimativa do FiveThirtyEight, a partir de agora, mudará diariamente até as eleições. Mas, ao lançar a projeção, Silver escreveu um artigo afirmando, desde já, que é "muito cedo para descartar Trump" e uma possível vitória do republicano.
Na média das pesquisas nacionais, Biden está na frente com 53% a 46% do total de votos. E, contando estado a estado nas pesquisas, o democrata ganharia por 326 a 212 no colégio eleitoral -- o número que importa nos EUA.
Mas, afinal, o próprio Silver reconhece que deu 71% de chances de vitória a Hillary Clinton antes da eleição de 2016 (e foi, incrivelmente, a projeção mais conservadora da época, enquanto outros veículos chegaram a estimar 99% de chance de vitória da democrata).
Desta vez, Silver e estatísticos de todo o mundo estarão cautelosos. No artigo, o fundador do FiveThirtyEight chegou a citar em tom de questionamento um link para declarações do economista progressista e prêmio Nobel Paul Krugman, que classificou a reeleição de Trump como "quase impossível".
Após a bagunça geral das pesquisas na eleição passada, Silver listou argumentos que podem fazer o jogo virar para Trump até o dia do pleito. Veja abaixo cinco dos principais pontos levantados pelo estatístico.
O modelo de eleições americano vira sempre motivo de "porém" quando se discute o pleito do país. Em 2016, Hillary Clinton ganhou em total de votos (48% a 46%). No Brasil, seria o suficiente para levar a eleição. Mas a democrata ganhou menos estados e ficou com 227 votos no colégio eleitoral, ante 304 de Trump.
Desta vez, Biden aparece vencendo em mais estados decisivos. Mas foram esses estados que deram a vitória a Trump em 2016. O próximo presidente precisará ganhar em lugares como Michigan, Flórida, Pensilvânia e Ohio, alguns dos chamados "estados-pêndulo", que costumam mudar de voto a cada eleição.
O quanto esses eleitores mudaram de Trump para Biden em quatro anos? A vantagem de Biden não é tão relevante nesses lugares, sendo de menos de cinco pontos em alguns deles. O suficiente para mudar facilmente nos próximos meses.
Na projeção do FiveThirtyEight, há 10% de chance de Trump perder em votos nacionais mas ganhar no colégio eleitoral (como fez em 2016). Para Biden, essa chance é muito menor, de 1 em 750. Ou seja, Biden precisará de uma vitória nacional ampla, enquanto Trump pode, como fez em 2016, ganhar nos estados que importam. "Isso reflete o fato de que o estado decisivo [o tipping-point state, no termo americano]", diz Silver, "está um pouco à direita do voto nacional". Ponto para Trump.
O coronavírus, à primeira vista, prejudicou Donald Trump. Apesar de oposição ferrenha dos democratas, o presidente tinha níveis mais altos de aprovação antes da pandemia. E o desemprego nos EUA estava abaixo de 4%, uma mínima histórica. Mas o fato é que o coronavírus trouxe uma dose significativa de incerteza para ambos os candidatos nas semanas que estão por vir.
Os democratas, vale lembrar, passaram os últimos quatro anos brigando entre si sobre a melhor forma de se opor a Trump. Agora, a tendência é que as diversas frentes da oposição se unam em torno de Biden. O candidato também escolheu nesta semana a ex-procuradora e senadora Kamala Harris para ser sua vice na chapa, atendendo a apelos de parte da base do partido para escolher uma mulher e negra.
Mas, ainda que as rusgas na ala progressista americana desapareçam, a pandemia atrapalhou atos de campanha de Biden (o que pode jogar contra ou a favor da chapa) e trouxe à tona a discussão sobre comparecimento dos eleitores. Como o voto nos EUA não é obrigatório, muitos eleitores podem decidir por não votar. Trump, enquanto isso, tem feito campanha contra o voto por correio.
Além disso, caso a curva de casos do coronavírus melhore nos EUA até a eleição ou haja a aprovação de uma vacina com doses garantidas nos EUA, a popularidade do presidente pode subir.
Silver aponta que "as pesquisas frequentemente mudam substancialmente entre agora e novembro". Em 2008, Barack Obama tinha menos de três pontos de vantagem contra o senador John McCain na média nacional das pesquisas. Em 2012, tinha meros 0,5 ponto contra o empresário Mitt Romney. Terminou vencendo ambos os pleitos por margens maiores, de ao menos quatro pontos.
Na outra ponta, a essa altura da corrida eleitoral, muitos têm margens maiores do que no dia da eleição. Em 1992, as pesquisas mostravam Bill Clinton vencendo por 20 pontos percentuais de vantagem, mas ele venceu por menos de seis.
As margens, é claro, dizem respeito aos votos absolutos, uma análise que não funciona sozinha no modelo americano. Mas os números históricos dão uma mostra de como o cenário varia em poucas semanas. Clinton tinha quase sete pontos de vantagem à essa altura em 2016. No dia da eleição, contudo, foram só dois pontos à frente de Trump em votos absolutos. Isso tudo indica que Biden pode ver sua liderança diminuir.
Silver também aponta que as pesquisas estão se tornando mais precisas (por tecnologia e precauções metodológicas) e que, além de tudo, o cenário político dos últimos quatro anos tornou mais fácil prever as eleições americanas. O motivo é a polarização, que tornou o voto dos eleitores menos volátil, com menos gente mudando de opinião. Outro dos principais erros em 2016 foi que pesquisas levaram pouco em conta eleitores que tendiam a Trump, como os menos escolarizados -- o que deve acontecer menos desta vez.
Mas, ainda há quase 30% de chances de vitória para Trump, diz ele, as mesmas chances que tinha em 2016.
A projeção do FiveThirtyEight leva em conta fatores como taxa de desemprego, consumo, indústria, renda, o mercado de ações, a inflação e o avanço do Produto Interno Bruto (PIB). O próprio Silver, contudo, aponta que as projeções envolvendo fatores econômicos têm sido "terríveis" e pouco confiáveis. Enquanto Trump perde com resultados negativos do PIB, poderia ganhar numa projeção com PIB positivo no terceiro trimestre -- uma recuperação que analistas já apontam que deve acontecer.
Silver afirma ainda que o fator renda fica favorável a Trump diante do "auxílio emergencial" americano, os benefícios de 600 dólares por semana a trabalhadores demitidos que o governo americano aprovou durante a pandemia. O auxílio acabou neste mês e democratas e republicanos ainda não chegaram a um acordo para renová-lo.
Mas, tal como no Brasil -- onde o auxílio emergencial ajudou a alavancar a popularidade do presidente Jair Bolsonaro --, Trump pode ser beneficiado pelos programas de distribuição de renda às vésperas da eleição, diz Silver. "Em outras palavras, nossa projeção acredita que é longe de ser óbvio que a economia vai derrubar Trump, principalmente se ele conseguir contar uma história de recuperação em novembro", escreve o estatístico.