Mundo

Bloqueio em Suez agrava gargalo logístico global (e risco de inflação)

Mesmo antes de o Ever Given encalhar no Canal de Suez na terça-feira, a rede de comércio global mostrava sinais de tensão devido aos problemas econômicos da pandemia de coronavírus

Ever Given: navio encalhado em Suez pode estar carregado com 1 bilhão de dólares em mercadorias (SUEZ CANAL/AFP)

Ever Given: navio encalhado em Suez pode estar carregado com 1 bilhão de dólares em mercadorias (SUEZ CANAL/AFP)

B

Bloomberg

Publicado em 26 de março de 2021 às 14h28.

Última atualização em 28 de março de 2021 às 10h26.

Desencalhar o navio porta-contêineres que bloqueia o Canal de Suez levará pelo menos até quarta-feira, um período mais longo do que o previsto que agrava os gargalos das cadeias globais de vários produtos, como petróleo, grãos e carros.

A paralisação prolongada do tráfego em uma das hidrovias mais importantes do mundo coloca ainda mais pressão sobre transportadoras de contêineres que já operam com capacidade total. Isso pode causar atrasos onerosos para empresas europeias que dependem de um fluxo constante de importações da Ásia e para consumidores, que se acostumaram com compras online rápidas durante a pandemia.

A tarefa de desencalhar o navio Ever Given, de 200 mil toneladas, exigirá cerca de uma semana de trabalho e possivelmente mais, disseram pessoas a par do assunto, que não quiseram ser identificadas. A expectativa inicial era de que a operação durasse apenas alguns dias.

“Os atrasos provavelmente aumentarão os custos, colocando ainda mais pressão inflacionária nas cadeias de suprimentos”, disse Chris Rogers, analista-chefe de comércio da Panjiva, da S&P Global Market Intelligence. “Os efeitos em cascata de curto prazo serão uma possibilidade maior de esgotamento de estoques de bens de consumo e o risco de que as cadeias de suprimentos de manufatura just-in-time, já atingidas pelo Brexit e pela escassez de commodities, possam enfrentar gargalos adicionais.”

Mesmo antes de o Ever Given encalhar no Canal de Suez na terça-feira, a rede de comércio global mostrava sinais de tensão devido aos problemas econômicos da pandemia de coronavírus.

O maior fluxo de mercadorias do mundo - entre a China e os EUA - enfrentou quase cinco meses de gargalos nos portos de Los Angeles e Long Beach. Importadores têm esperado várias semanas pela chegada das cargas, com o efeito indireto de que os exportadores não conseguem receber contêineres de aço vazios necessários para enviar carregamentos a outros países.

O temor agora é que a crise no Canal de Suez piore os desafios logísticos da Europa, resultando em viagens canceladas, escassez de contêineres e taxas de frete mais altas.

Os trabalhos realizados desde terça-feira por rebocadores e escavadeiras - equipamentos minúsculos em comparação com o navio de 400 metros - não deram resultados até agora. Enquanto as equipes de resgate trabalham, a fila de espera de navios carregados com bilhões de dólares em petróleo e bens de consumo aumentou para mais de 300 em relação a 186 na quarta-feira, de acordo com dados Bloomberg.

Imagem de satélite mostra canal de Suez nesta semana: bloqueado pelo navio Ever Given (Roscosmos/Handout via REUTERS)

Caso a carga do navio encalhado precise ser descarregada ou grandes reparos feitos no próprio canal, “então o tempo de inatividade certamente pode durar pelo menos duas semanas”, de acordo com Randy Giveans, vice-presidente sênior da Equity Research for Energy Maritime, da Jefferies LLC. O Ever Given pode estar carregado com quase US$ 1 bilhão em mercadorias, de acordo com a IHS Markit.

Os navios com planos de atravessar o Canal de Suez começam a optar por desvios caros e demorados em torno da África para manter o fluxo das entregas.

Os custos de frete também estão subindo - o preço de enviar um contêiner de 12 metros da China para a Europa quase quadruplicou em relação a um ano atrás -, o que representa mais um peso em meio aos gargalos causados pela pandemia.

Com o bloqueio do canal, cerca de 2 milhões de barris por dia de fluxos de petróleo estão retidos, de acordo com estimativas da Braemar. A paralisação também afeta graneleiros que transportam produtos como trigo e minério de ferro. Fabricantes globais já se preparam tanto para atrasos dos embarques de produtos acabados quanto de matérias-primas cruciais para as linhas de produção.

A Caterpillar, maior produtora de máquinas dos EUA, disse que enfrenta atrasos para os embarques e até considera enviar produtos por via aérea se necessário, enquanto a japonesa Envision AESC, fornecedora de baterias para veículos elétricos, disse que depende do Canal de Suez para algumas importações de eletrodos.

Para as linhas de contêineres que transportam cerca de 80% do comércio global de mercadorias, um gargalo prolongado entre a Europa e a Ásia pode prejudicar os calendários dos navios definidos com meses de antecedência para que os importadores possam planejar as compras, gerenciar estoques e manter as prateleiras das lojas estocadas ou as linhas de produção em funcionamento.

O problema se agrava a cada dia. Navios que chegam com vários dias de atraso não podem ser esvaziados e recarregados a tempo de fazer a viagem de volta programada. Com isso, as transportadoras cancelam viagens e limitam ainda mais a capacidade, o que também eleva as taxas de frete.

--Com a colaboração de Stephen Stapczynski, Jack Wittels, Shiho Takezawa, Christian Wienberg, Kyunghee Park, Jinshan Hong, Sheela Tobben e Kevin Varley.

Acompanhe tudo sobre:Canal de SuezComércio exteriorEgitoLogísticaOriente Médio

Mais de Mundo

Ex-militantes do partido de Assad entregam suas armas em Damasco

Kremlin agradece declarações de Trump sobre perigo de ataques com ATACMS contra a Rússia

Líder insurgente convoca celebrações nesta sexta-feira e promete “construir” a Síria

Mala nuclear: o que é e como ela simboliza o poder na transição presidencial dos EUA