Desafios e caminhos para o capital privado no Brasil em mais uma janela de oportunidade
Entenda quais são os principais fatores que moldam o futuro dos investimentos privados no Brasil e descubra quais são as tendências que podem impactar essa dinâmica
Colunista
Publicado em 7 de novembro de 2024 às 14h00.
No artigo de março, explorei como o Brasil pode se beneficiar das recentes mudanças no cenário global de investimentos , especialmente com a diminuição do capital privado na China e o aumento dos investimentos na Índia. Concluí que o Brasil tem a chance de se tornar um dos principais destinos para investidores globais de capital privado se tivermos a habilidade em comunicar a magnitude das nossas fortalezas - o que, obviamente, é uma ótima janela de oportunidade.
É claro que esse caminho não é retilíneo e não se trata aqui de projetar planos cartesianos, como se houvesse uma fórmula mágica para que o Brasil possa, enfim, deslanchar na captação destes investimentos. Nosso país, claro, enfrenta e enfrentará desafios significativos na atração desse capital.
Mas, após anos de tantas incertezas, parece que a confiança dos investidores internacionais está se recuperando - ou, pelo menos, saindo de um estado de desconfiança absoluta. Inclusive, nas últimas semanas, ajudei a organizar um encontro com investidores que, em conjunto, têm trilhões de dólares para investir no mundo e a grande conclusão do encontro foi de que nós, Brasileiros, estamos mais pessimistas do que eles. Para garantir um fluxo de investimentos que sustente o crescimento a longo prazo, alguns obstáculos precisam ser superados e alguns deles são mais prementes e estão bem na nossa frente.
Neste artigo, discutirei os principais fatores que moldam o futuro dos investimentos privados no Brasil e as tendências que podem impactar essa dinâmica.
Não abordarei neste momento o ambiente econômico e político que influencia as decisões de investimento, nem os efeitos da volatilidade cambial, que é um dos principais inimigos desse tipo de investimento. Também deixarei a discussão sobre segurança jurídica e previsibilidade para um próximo artigo - até porque só esse tópico não renderia um só artigo, mas (infelizmente) uma coleção deles.
Em vez disso, focarei nos tipos de investimentos de capital privado no Brasil e nas categorias que têm se destacado.
Com mais de trinta anos de experiência em investimentos privados com capital estrangeiro no Brasil, testemunhei mudanças significativas no mercado. Entre as principais, destaco: a profissionalização do setor, com gestores experientes e estratégias bem definidas; a flutuação no número de gestores de private equity; a especialização em diferentes estratégias (como controle ou participações minoritárias); o crescimento dos investimentos em tecnologia através do venture capital; e o surgimento de novas categorias de fundos, como Crédito Privado e Situações Especiais.
Para que essas categorias prosperem, é fundamental que haja um alinhamento de diversos fatores: a escolha da empresa certa, o preço justo (o único fator controlável pelo investidor), a estrutura adequada, o crescimento da empresa, a parceria com bons sócios (um fator crucial), um suporte operacional eficaz e um ambiente propício para saídas. Além disso, estabilidade econômica, controle cambial e segurança jurídica são essenciais.
O investidor, de certa maneira, vive uma dicotomia (e o estrangeiro mais ainda). Os fatores internos são fundamentais e são aqueles que verdadeiramente fazem um negócio dar certo - e, por isso, serão sempre prioridade. Mas, elementos externos da macroeconomia são capazes de alavancar ou implodir qualquer estratégia, ainda que perfeita - e, por isso, são sempre tão estudados e questionados.
Modelos de Sucesso no Brasil
Investimentos de Controle
Nos investimentos de controle, observamos que gestores com equipes operacionais robustas, que mantêm os fundadores com participação minoritária, obtêm sucesso. Essa abordagem preserva a história, a cultura e a visão estratégica da empresa. Exemplos notáveis incluem Vinci, Advent e Pátria. Alguns adotam a estratégia de “buy&build”, que consiste em adquirir uma empresa inicial e expandi-la por meio de fusões e aquisições. Exemplos de sucesso incluem a Odata, construída “do zero” pelo Pátria, e a compra pela Advent do Walmart Brasil, um enorme trabalho de melhoria e posterior venda para o Carrefour. Estas melhorias acontecem quando estes fundos conseguem atrair gestores experientes e altamente competentes para levar estes empresas para um novo patamar de venda e rentabilidade.
Participações Minoritárias
Nas participações minoritárias, onde o fundador mantém o controle, os riscos são elevados, especialmente em relação à governança. Já presenciei casos em que fundadores agiram de maneira isolada, considerando os investimentos como empréstimos e não como sociedade. Contudo, gestores como Kinea e Crescera conseguiram resultados muito positivos por meio de contratos sólidos, mecanismos de proteção (principalmente de rentabilidade mínima) e boas governanças similares às dos contratos de controle. Contudo, o investimento em participações minoritárias é predominante em Private Equity no Brasil, refletindo a resistência dos empresários em perder o controle.
Especialização Setorial
Gestores com especializações setoriais também podem ter sucesso, especialmente em nichos suficientemente amplos para selecionar as melhores oportunidades. Setores como infraestrutura e energia continuam a ser cruciais para investimentos privados no Brasil, embora apresentem riscos de execução elevados (risco de construção, por exemplo) e retornos relativamente baixos.
Tecnologia e Inovação
O cenário de tecnologia e inovação no Brasil transformou-se, com investimentos sendo realizados não apenas por fundos de venture capital, mas também por indivíduos, famílias, empresas e até fundos de Private Equity focados em estágios mais avançados. Esse ambiente dinâmico ajudou a fortalecer o ecossistema de startups, permitindo ciclos de investimento mais completos. O foco em datacenters e nuvem, software como serviço, e IA (Inteligência Artificial) é vital para o aumento da produtividade no país e continuará à atrair capital nos próximos anos, tanto nacional quanto estrangeiro.
Oportunidades em Situações Especiais
O Brasil, com suas adversidades, é um terreno fértil para investimentos em Situações Especiais, que envolvem a reestruturação de empresas pós-recuperação judicial e a recuperação de créditos não pagos. Esses investimentos requerem conhecimento profundo e uma equipe jurídica experiente - além de boas doses de resiliência com os fatores externos e a insegurança jurídica. Além destas categorias, o Brasil apresenta, pelo longo prazo de uma ação judicial, um enorme oportunidade de usar ativos judiciais como colateral de empréstimos para empresas. Sendo o segundo país do mundo com mais disputas judiciais, o país terá continuas oportunidades neste tipo de operação.
Crescimento do Private Debt
O setor de Private Debt está em rápido crescimento no Brasil, com instrumentos como CRIs, CRAs e debêntures ganhando destaque. Essa classe de ativos oferece oportunidades de diversificação com retornos mais estáveis, e esperamos um crescimento contínuo nesse segmento.
Conclusão
Acredito que os tipos mais promissores de investimentos privados no Brasil incluem: controle com equipes operacionais, participações minoritárias com sócios confiáveis, investimentos em tecnologia e inovações, e Situações Especiais.
O Brasil tem uma oportunidade única de atrair capital de longo prazo, mas isso depende de uma comunicação eficaz com investidores globais e da continuidade das reformas estruturais. Como disse, a janela de oportunidade está aberta e cabe a nós, setor produtivo, tentar aproveitá-la e instigar as autoridades a fazerem o mesmo. O sucesso nessa jornada pode reposicionar o Brasil como um dos principais destinos de capital privado do mundo.