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Índice de eficiência em carbono da B3 tem empresas poluentes. Entenda o motivo

Nova carteira seleciona empresas que declararam volume de emissões em 2020; nova edição tem Petrobras, JBS e Braskem

Petrobras (PETR3) (Paulo Whitaker/Reuters)

Petrobras (PETR3) (Paulo Whitaker/Reuters)

Os inúmeros padrões de divulgação das informações corporativas nem sempre fazem dos índices de sustentabilidade algo de fácil compreensão. Os critérios de avaliação para companhias que dizem seguir práticas ESG são muitos, e muitas vezes tornam as carteiras com foco no ambiental, social e governança complexas e que fogem da lógica de causa e consequência, dizem especialistas.

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O índice de carbono eficiente (ICO2) da B3 é um exemplo disso.  Na última segunda-feira (03) a Bolsa anunciou as empresas que irão compor a carteira do índice até abril deste ano. Ao contrário do que foi visto nas edições anteriores, a carteira de 2021 contempla não apenas 50, mas as 100 empresas com as ações mais líquidas da bolsa (IBrX 100), ou seja, as companhias com maior volume negociado. Em um ano, houve um aumento de 132% no número de empresas que integram a carteira.

Para participar do ICO2, as empresas deveriam apresentar, até o final do ano passado, seus inventários sobre emissões de gases do efeito estufa.  Juntas, as 58 companhias representadas somam 3,3 trilhões em valor de mercado - 63,6% do valor total de mercado das companhias listadas na bolsa brasileira.

De acordo com a B3, o índice tem como objetivo fomentar as discussões sobre as mudanças climáticas no Brasil e evidenciar o comprometimento de empresas com a economia de baixo carbono.

A questão é que, apesar do nome, o índice não é formado por empresas eficientes em emissão de carbono. Na prática, o ICO2 é um índice de transparência. Para fazer parte dele, basta que empresas do IBrX100 reportem suas emissões, enquanto o termo“eficiência” está relacionado a fazer mais com menos, ou seja, emitir o mínimo carbono possível. Para chegar à porcentagem de participação na carteira, a B3 calcula o eficiente entre emissões (em toneladas) e receita bruta de cada empresa.

Para Renata Faber, analista de ESG da EXAME Research, o fato de o nome do índice não refletir o que ele realmente é pode gerar confusão para o investidor. “Não faz sentido, por exemplo, setores altamente emissores de GEE, como combustível fóssil, estarem ao lado de empresas como Suzano ou Klabin, que são sequestradoras líquidas de carbono”, diz.

Segundo Fabio Alperowitch, fundador da FAMA Investimentos, primeira gestora voltada a fundos ESG no país, a questão não representa uma falha da B3, mas deve ser observada com cautela por novos investidores interessados. “Quando olhamos para um público que está começando a se familiarizar com as questões ESG, ele subentende que todas as empresas listadas no índice têm práticas positivas para a mudança climática, mas essa não é a metodologia aplicada”, diz.

Para Alperowitch, o papel institucional da B3 é extremamente relevante para a integração de novos participantes no mercado ESG. “Com cada vez mais investidores simples entrando neste mercado, é necessário explicar que nem sempre o título de um índice corresponde ao que de fato é entregue por ele. Naturalmente, os engajados com a causa climática não vão querer se aprofundar nas metodologias de cada índice. Ela irá pensar que as empresas aderentes estão de acordo com a maneira dela pensar".

Um dos exemplos disso está na presença da JBS no índice. A frigorífica, apesar de ter 1,4% de participação na carteira, tem também uma das maiores emissões de carbono entre todas as companhias do setor. A JBS emitiu 6.517.388 toneladas de CO2 em 2020. O peso da empresa na carteira é quase o dobro da concorrente Marfrig, que tem apenas 0,8% de participação.

O cálculo proporcional também chama a atenção: a Marfrig emite 16,1 toneladas por milhão de reais de receita, enquanto a JBS emite, sob o mesmo cálculo, 30 toneladas. A Marfrig é conhecida por seus esforços sustentáveis e anunciou, inclusive, um plano decenal para rastrear todo o gado até 2030 que irá custar 500 milhões de reais.

Segundo a JBS, o tema das mudanças climáticas é uma das cinco prioridades da empresa, que destina 2 bilhões de reais ao ano para reduzir emissões, economizar água e tratar resíduos gerados pelas suas operações.

O combate ao desmatamento ilegal na Amazônia também aloca uma parcela de investimentos na empresa, que já mantém um sistema de monitoramento de fornecedores diretos e pretende monitorar também todos os indiretos. Além disso, lançou um fundo que vai destinar 250 milhões de reais nos próximos cinco anos em projetos de conservação e recuperação do bioma e que pretende chegar a 1 bilhão de reais até 2030 com a participação de outros investidores. A JBS também afirma que tem esforços nos setores de energia e economia circular.

Outro caso peculiar é o da Klabin. A empresa tem 1% de participação na carteira, perdendo para a petroquímica Petrobras, que tem 2,2%. O detalhe é que Klabin e a concorrente Suzano são conhecidas por serem "sequestradoras de carbono", ou seja, capturam mais desse componente do que emitem na atmosfera. A Petrobras, por sua vez, é a principal emissora de carbono do mercado brasileiro, com mais de 150 toneladas de carbono emitidas por milhão de reais da sua receita, totalizando 59.084.457 toneladas lançadas na atmosfera no último ano.

Situação parecida acontece com o índice elaborado pelo CDP, organização sem fins lucrativos que mede o impacto de empresas e governos. No início do ano passado, o CDP lançou o índice de Resiliência Climática, que busca relacionar o resultado financeiro das 100 empresas mais líquidas da bolsa brasileira aos dados sobre ações ambientais reportados por elas. “Na prática, o índice elenca as empresas que melhor reportam, mesmo que elas transgridam o meio ambiente com as suas emissões”, diz Alperowitch.

Especialistas ouvidos pela reportagem desconhecem casos similares em outras bolsas no exterior. Segundo os analistas e gestores, há particularidade brasileira de o nome de um indicador sustentável ser considerado como sua metodologia.

Mudanças nos índices

Para solucionar as dúvidas em torno dos parâmetros usados para avaliações, a B3 já prevê reformulações para o seu principal índice ligado ao tema da sustentabilidade: o ISE. Atualmente, essa é a principal plataforma de informações ESG disponível para o investidor comum.

O ISE é formado por 46 ações de 39 companhias, cujo valor de mercado ultrapassa 1,8 trilhão de reais. Juntas, as companhias somam 1,8 trilhão de reais em valor de mercado. É o equivalente a 38% do total do valor de mercado das companhias com ações negociadas na B3.

No último ano, a bolsa divulgou as intenções de alterar os critérios de avaliação, adotando padrões ESG internacionais, além de tornar a metodologia mais transparente, disponibilizando publicamente os questionários respondidos pelas empresas. Parte do projeto também consiste na setorização dos questionários de acordo com o segmento das listadas e na avaliação de notícias veiculadas na empresa sobre cada companhia.

Dentre todas as propostas, a única que a B3 já concluiu foi disponibilizar os formulários de respostas das empresas para o livre acesso do público. Ainda não há previsão para a conclusão das demais etapas. Já no caso do ICO2, a B3 prevê mudanças em 2021 para além da ampliação para as 100 empresas mais líquidas como critério de seleção. Em nota enviada à reportagem, a B3 diz que o ICO2 deve ter reformulações como a atribuição de pesos adicionais às companhias que demonstrem avanços na agenda climática por meio da compensação de suas emissões, emissão de títulos temáticos para desenvolvimento de projetos de impacto socioambiental positivo e estabelecimentos de metas baseadas em ciência.

A Bolsa também diz que "considera ampliar o apoio às empresas, oferecendo capacitação na jornada de gestão climática e informações técnicas que contribuam para o desenvolvimento de ações concretas pelas companhias".

“O índice precisa de mais ajustes e avanços nos próximos anos. E deveria olhar não apenas a divulgação, mas para o que a empresa está pensando, ponderando a eficiência e o segmento de mercado de cada uma delas”, diz Eduardo Grytz, sócio da X8 Investimentos, gestora de fundos de impacto.

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Para ir além, a Bolsa deverá seguir tendências relevantes vistas em mercados internacionais. Índices globais que olham para as emissões de carbono têm ampliado a avaliação do tópico. No caso do índice de eficiência em carbono da Morgan Stanley, por exemplo, a inserção depende não apenas da prestação de informações sobre emissões, mas da avaliação das compensações, eficiência energética e estoques - sobretudo para empresas que trabalham com commodities.

O avanço dos critérios dos índices sustentáveis é um movimento natural e a situação atual condiz com o momento do tema no país. Contudo, novos padrões também dependerão do ativismo de investidores e alocadores ao pressionar a própria B3 por mais informações e mais detalhamento das informações prestadas. “Assim, empresas irão fugir do simples marketing de dizer que controlam suas emissões, mas vão apresentar ações concretas de como estão fazendo isso”, diz Grytz. “Ao mesmo tempo, as empresas que decidirem não reportar vão ser deixadas para trás e estarão de fora de uma agenda que hoje é urgente”.

 

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