CEO da corretora de criptomoedas Coinbase falou à EXAME sobre chegada no Brasil (Coinbase/Reprodução/Reprodução)
Editor do Future of Money
Publicado em 21 de março de 2023 às 07h30.
Última atualização em 21 de março de 2023 às 11h35.
Segunda maior corretora de criptomoedas do mundo, a primeira a abrir capital nos Estados Unidos e possivelmente a mais tradicional entre as empresas do setor, a Coinbase anunciou nesta terça-feira, 21, a sua chegada oficial ao Brasil. Não é o primeiro avanço internacional da companhia, mas pode ser visto como mais um passo ambicioso nos seus pouco mais de 10 anos de existência.
Em entrevista exclusiva à EXAME, o CEO da Coinbase, Brian Armstrong, explicou porque a empresa decidiu concentrar investimentos no Brasil, falou sobre a concorrência de peso que vai enfrentar no país, elogiou o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e explicou como o contexto regulatório brasileiro pode fazer do país um "líder na criação de uma clareza regulatória" global.
Ele também falou sobre o atual cenário do mercado cripto, os movimentos de preço dos últimos dias e a "quase crise" gerada pelas falências bancárias recentes nos EUA, que afetaram fortemente a stablecoin USDC, emitida pela Circle, empresa da qual a Coinbase é a principal acionista.
"Foi uma ironia, já que as pessoas estão tão acostumadas em dizer que o mercado cripto é volátil, e o que a gente vê agora é muito mais volatilidade no setor bancário", disse Brian Armstrong, que também questionou o sistema de reservas financeiras dos bancos tradicionais, reforçando que as empresas líderes do mercado cripto adotam práticas mais eficientes e seguras para os consumidores.
Confira abaixo os detalhes da entrevista.
Tradicionalmente, o Brasil assume posições de liderança quando o assunto é a adoção de novas tecnologias. Foi assim com a internet, com os smartphones e, mais recentemente, com o Pix. Assim, é natural que o país também seja um importante mercado para empresas de cripto e blockchain, e isso se comprova com a quantidade de companhias deste setor já consolidada no país - a própria Coinbase já atuava por aqui, embora sem dedicar muitos esforços a isso.
Apenas entre as corretoras de criptoativos, principal ramo de atuação da Coinbase, o Brasil tem marcas fortes como Mercado Bitcoin, Foxbit e a multinacional Binance, além das plataformas criadas por grandes instituições financeiras do país, como a Mynt, do BTG Pactual, e as soluções de Nubank, PicPay, Mercado Pago, entre outros.
"Em primeiro lugar, preciso dizer que eu acho que a competição é uma coisa boa. Queremos que existam muitos produtos e serviços diferentes integrados às criptomoedas e para isso é importante que haja diferentes empresas. Nossa esperança é que um dia toda grande empresas de serviços financeiros do Brasil, e também as de serviços não-financeiros, integrem cada vez mais e mais cripto e blockchain aos seus produtos", explicou o executivo.
"Só para trazer um exemplo: estamos acompanhando empresas como Meta e Google, marcas como Nike e LVMH, que estão experimentando com cripto, com Web3, com a tecnologia blockchain. Para nós, cripto é muito maior do que pagamentos e serviços financeiros. Vai afetar atantas áreas da economia... Então, no final das contas, mesmo em termos de concorrentes, nós queremos ver mais empresas usando cripto", disse Armstrong.
Sobre os diferenciais que a empresa pretende oferecer aos consumidores brasileiros, ele cita o fato de ser uma empresa de capital aberto e, portanto, com regras e regulação mais rígidas do que algumas de suas concorrentes, como a Binance: "Um dos nossos principais diferenciais é a confiança e nossos compromissos de compliance".
A definição, no entanto, não diferencia a Coinbase de outras empresas brasileiras de negociação de criptoativos, como a Mynt, do BTG Pactual, também uma empresa de capital aberto e portanto, rigorosamente regulada. "Neste caso, posso dizer que somos 100% focados em cripto. E se um banco ou algo do tipo quer adicionar cripto ao seu leque de produtos, ótimo. Nós podemos até ajudá-los a fazer isso", disse.
Assim como as concorrentes, a Coinbase também terá suporte ao Pix e, agora, investiu na tradução do seu aplicativo para o português, além de ajustar outras funcionalidades que, antes do desembarque oficial da empresa no país, não tinham foco no consumidor brasileiro, como o atendimento ao cliente, até aqui oferecido apenas em inglês.
O avanço da Coinbase para outros mercados, fora dos Estados Unidos, não é exatamente uma novidade, já que a empresa também tem atuação em países de Ásia e Europa. Mas é a primeira vez que a empresa o faz com força total - e com anúncio oficial.
A notícia, inclusive, vem após rumores de que a Coinbase estaria buscando um novo lugar para hospedar a sua plataforma, devido às incertezas legais do setor de cripto e blockchain nos EUA, já que o país ainda não tem uma regulamentação clara deste mercado.
Brian Armstrong não confirma a informação sobre mudança, mas diz que a lei de criptomoedas aprovada no Brasil em 2022 foi um fator determinante para a chegada da empresa ao país: "Estamos comprometidos com uma expansão internacional. Mas uma das grandes razões é que o Brasil tem sido um líder em termos de clareza regulatória, e você pode ter acompanhado um pouco do que aconteceu e está acontecendo nos EUA, onde há bem menos clareza, o que nos permitiu gastar mais recursos investindo no exterior".
Ele também elogiou a gestão de Roberto Campos Neto à frente do Banco Central e a posição de liderança do Brasil na inovação financeira global: "No Brasil, ficamos agradavelmente surpresos ao ver o trabalho do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Ele está promovendo e apoiando a inovação e apresentando uma estrutura regulatória clara, o que tem sido um sinal muito importante para investirmos mais no mercado brasileiro. A aprovação da nova lei de regulamentação de cripto no Brasil torna o cenário ainda mais favorável e a visão da Coinbase é entrar no país com ainda mais força".
Antes de desembarcar oficialmente no país com a sua plataforma de negociação e outros serviços com criptoativos, a Coinbase já atuava no mercado brasileiro, ao menos indiretamente, através do seu braço de venture capital. O capital de risco foi investido em empresas como a gestora Hashdex e a corretora mexicana Ripio, entre outras.
"A Coibase Ventures tem como objetivo desenvolver o ecossistema ao redor do mundo. E, como é comum no mercado de serviços financeiros, às vezes esses diferentes negócios se sobrepõem uns aos outros. Mas isso mais ajuda do que atrapalha e, no final das contas, favorece o crescimento do setor", disse, explicando também que a Coinbase não pretende se desfazer das suas participações em empresas brasileiras após abrir seu escritório no país.
"Acho que em cripto, tendemos a focar menos na competição entre as empresas e pensamos mais em como podemos crescer todo o espaço em 100 vezes. E ainda estamos muito no começo do universo cripto. Queremos apoiar e colaborar com todas as startups por aí?", completou.
A falência de grandes bancos nas últimas semanas, em especial o Sillicon Valley Bank (SVB) nos EUA e o Credit Suisse na Suíça, tiveram intervenções pesadas dos bancos centrais dos dois países, temores e uma série de desdobramentos sobre diferentes setores, inclusive cripto. Para Brian Amrmstrong, entretanto, este último saiu favorecido do ocorrido.
"Temos visto toda essa atividade no setor bancário, o que foi uma ironia, já que as pessoas estão tão acostumadas em dizer que o mercado cripto é volátil, e o que a gente vê agora é muito mais volatilidade no setor bancário", disse o CEO da Coinbase, complementando que, apesar disso, a empresa ainda mantém fortes relações com parceiros bancários e ainda trabalha "com vários bancos que são sistemicamente importantes globalmente".
"No caso da Coinbase, posso dizer que nossas operações estão em boa forma. Mas acho que o colapso de alguns desses bancos regionais fez com que as pessoas questinassem o setor, perguntando se o dinheiro nessas contas está seguro e se o sistema bancário de reservas fracionárias, que é o conceito básico de grande parte do sistema financeiro tradicional, é de fato seguro", disse o executivo, na esteira da falência do SVB. Caso o banco não fosse "socorrido" pelo Fed nos EUA, deixaria milhares de credores e clientes no prejuízo - entre eles a Circle, emissora da stablecoin USDC e que tem a Coinbase como principal acionista.
"No universo cripto, não fazemos operações bancárias de reservas fracionárias. Nós apenas armazenamos todos os ativos, um para um. Então, na verdade, as falências bancárias eu acho que até aumentaram o interesse por cripto. Vimos, por exemplo, que o número de downloads de aplicativos de cripto aumentou consideravelmente desde o ocorrido nos EUA. As próximas semanas e meses serão interessantes para vermos como isso se desenrola", explicou.
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