COP27: Justiça climática e racismo ambiental são temas urgentes para sociedade civil brasileira
Na COP27, EXAME conversa com representantes de organizações que se articulam para mostrar que, para mitigar os efeitos das mudanças climáticas, é preciso priorizar povos originários, quilombos e negros
Marina Filippe
Publicado em 10 de novembro de 2022 às 07h05.
De Sharm el-Sheik
Enquanto chefes de estado negociam como financiar medidas de adaptação e mitigação dos danos das mudanças climáticas, a sociedade civil se mobiliza em peso e cobra urgência na COP27, a Conferências das Partes, que ocorre até 18 de novembro em Sharm el-Sheikh, no Egito. E a participação dos brasileiros é extremamente relevante e diversa.
No Brazil Climate Action Hub, um dos três espaços do Brasil na COP27 - sendo os outros o Consórcio Amazônia Legal e o do Governo Federal - há o protagonismo de indígenas, quilombolas, executivos e articuladores que discutem temas como transição energética justa, justiça climática e racismo ambiental. O espaço é organizado pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS), o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) e o Instituto ClimaInfo.
"Aqui conseguimos entender os assuntos relevantes, como eles estão sendo debatidos e a representatividade de cada país. Temos hoje, pela primeira vez em 27 COPs, o pavilhão da justiça climática, do jovem e da criança e da segurança alimentar. Isto mostra a consolidação de temas por conta da pressão da sociedade civil nas mesas de negociações. E o Brasil, como sempre, está dando um show ao refletir como a sociedade do país tem um papel relevante no desenvolvimento da agenda climática", afirma Flávia Bellaguarda, Fundadora do Youth Climate Leaders e LACLIMA.
Para avançar nas temáticas de clima, é essencial, por exemplo, que os povos originários estejam no centro do debate. Um levantamento doMapBiomas, com base em imagens de satélites e em inteligência artificial, mostra que entre 1985 e 2020as áreas mais preservadas do Brasil foram as indígenas, com desmatamento de 1,6%.
"Estar numa conferência como a COP nos dá oportunidade mostrar a realidade dos territórios indígenas. Aqui, a gente espera que quem vai nos ouvir possa mitigar os impactos que sofremos, como o desmatamento e a mineração", diz Vanda Witoto, liderança indígena.
As áreas quilombolas seguem a mesma lógica de luta e preservação de biomas. Pensando nisto, pela segunda vez a Conaq, a Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos, apresenta uma delegação na COP, sendo 10 participantes neste ano.
"Estar aqui evidencia o racismo ambiental e a importância dos quilombos. E diz para o mundo que queremos participar da discussão porque nós contribuímos para a diminuição do aquecimento global", afirma Celia Pinto, coordenadora da Conaq. "Precisamos pensar a economia não desassociada às questões ambientais e de direitos humanos."
O racismo ambiental faz ainda com que as pessoas das periferias, onde no Brasil está a maior parte da população negra, estejam entre as que mais sofrem os impactos negativos das mudanças climáticas. Pensando nisto, Amanda Costa, ativista climática, fundadora do Perifa Sustentável e jovem embaixadora da ONU, participa da COP27 para amplificar o tema e mudar esse cenário.
"Quando falamos de crise alimentar e desastres naturais estamos falando de crise climática. A COP é um evento global, mas que muitas vezes fica restrita para uma bolha branca, rica, privilegiada que tem acesso ao conteúdo. Parte da minha missão é fazer com que essa narrativa alcance cada vez mais pessoas", afirma.
Douglas Belchior, fundador da Uneafro Brasil e membro da Coalizão Negra por Direitos, reforça essa lógica e lembra que é preciso mais ação. "Não há possibilidade de enfrentar as mudanças climáticas sem enfrentar o racismo.A Coalizão é composta por quase 300 organizações que atuam politicamente com diferentes ações e, aqui, participamos cobrando para que o Brasil esteja alinhado com a elaboração dos movimento socioambientais, além de buscarmos ocupar os espaços de decisão ao pressionar a responsabilidade do estado".
Para ele, agora o desafio é pressionar os governos a fugir de falsas soluções. "Precisamos ter metas ambiciosas, como desmatamento zero, regulamentação de terras indígenas e quilombolas. A sociedade civil está mobilizada".