"Em 2022 a inflação fechou em 5,8%, mas teve o efeito das desonerações de telecomunicações e energia elétrica. O núcleo de inflação terminou em 9,75%", afirmou (Lula Marques/Agência Brasil)
Agência de notícias
Publicado em 25 de abril de 2023 às 15h41.
Última atualização em 25 de abril de 2023 às 16h55.
O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, repetiu nesta terça-feira, 25, que reduzir a Selic "na canetada" teria efeitos muito ruins para o poder de compra da moeda. Segundo ele não há "bala de prata"para a política monetária no combate à inflação.
"Se fosse fácil resolver problema com canetada, já tínhamos feito. Se fizermos uma queda de juros artificial, vãos passar mensagem de que remuneração não esta adequada ao risco. As pessoas iam investir em outro lugar, o real iria desvalorizar, e ia começar um processo de expectativas crescentes de inflação", afirmou Campos Neto, em audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado.
O presidente do BC disse que, embora a inflação tenha caído, ela ainda é alta e precisa ser combatida. "Em 2022 a inflação fechou em 5,8%, mas teve o efeito das desonerações de telecomunicações e energia elétrica. O núcleo de inflação terminou em 9,75%", afirmou. "É importante ver núcleos de inflação desacelerando", acrescentou.
Campos Neto repetiu que o BC tem uma preocupação grande com juro real alto e seus efeitos no tecido da sociedade. Mais uma vez, ele disse que o Brasil precisa ter uma taxa de juros mais alta devida ao volume de crédito direcionado que retira potência da política monetária. "Os juros mais altos devido ao crédito subsidiado elevam custo para toda economia, inclusive para pobre", reafirmou.
Durante a audiência na CAE, o presidente do Banco Central disse que o debate sobre mudança de meta de inflação tem mérito e ocorre inclusive em países desenvolvidos, como os Estados Unidos.
"Alguns economistas consideram que aumentar a meta dá flexibilidade para a política monetária e exige menos juros. Mas outros economistas afirmam que aumentar a meta aumenta mais ainda a expectativa de inflação, porque eu não tenho credibilidade já que não estou cumprindo a meta. E na verdade eu não ganho flexibilidade, eu perco", afirmou Campos Neto.
Ele lembrou que o BC não tem autonomia para definir meta, estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). "E nem deveria, por conflito de interesse", completou.
O senador Cid Gomes (PDT-CE) usou um quadro negro para mostrar os impactos da Selic de 13,75% sobre os juros pagos pela União na gestão da Dívida Pública e entregou um boné do Santander para Campos Neto. "Pega o seu bonezinho e pede para sair", afirmou o parlamentar.
Ao responder o senador, o presidente do BC afirmou que não é o juro que faz dívida pública ser alta, mas sim a dívida que faz juro ser alto. "Tentativas de controlar juro de longo prazo não tiveram sucesso", repetiu, citando o caso da Argentina. "O mandato do BC dado pelo governo é perseguir uma meta de inflação de 3%, também dada por governo", respondeu.
Campos Neto argumentou que o Brasil não tem apenas 6 milhões de "rentistas" investidores. Segundo ele, 40 milhões de pessoas que têm algum fundo de pensão também são rentistas.
Ele ainda fez um aceno ao Congresso ao dizer que o spread de crédito caiu muito após medidas aprovadas no Parlamento.
Campos Neto avaliou que o Brasil tem um problema estrutural para reduzir despesas públicas. "Olhei bastante o tema de despesas do Brasil, separei as rubricas e olhei o histórico nos últimos 20 anos. Parte da razão do risco brasileiro ser alto é o pouco sucesso de programas para reduzir despesas de forma estrutural. Já tivemos reduções conjunturais que não duraram", afirmou, em audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado.
Campos Neto disse entender ser difícil cortar gastos. "Quando um plano fiscal é mais de corte de despesas, há um impacto maior na inflação do que quando o plano é mais de alta de receitas", alertou. "Entendemos a limitação do Brasil e o esforço do governo", acrescentou.
Para o presidente do BC, com a digitalização da economia - com parte do comércio saindo da ilegalidade e virando comércio eletrônico - espera-se que haja incremento na arrecadação de tributos.
Ele destacou que nunca reclamou das críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à atuação da autoridade monetária. "É natural que as pessoas anseiem por juros menores. É natural que esse debate venha à tona, apesar dos juros já terem sido maiores. Acho que presidente tem direito de falar de juros, em nenhum momento reclamei disso", afirmou, em audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado.
Campos Neto considerou que o Brasil ainda tem um trabalho grande para fazer em reversão de expectativas para, aí sim, poder começar a reduzir os juros de forma saudável.
O presidente do BC argumentou mais uma vez que a instituição não é culpada pelas mazelas do País, mas sim um ator que está no mesmo barco do governo e trabalha junto. "O Brasil tem fatores de risco, como dívida e CDS maiores que emergentes", alegou.
Campos Neto disse ainda na CAE que a preocupação fiscal entre agentes do mercado está bastante alta neste momento. Ele destacou que a aprovação de reformas ajuda o BC a reduzir os juros.
"Hoje os juros longos estão em 12%, em 2016 estava em 17%. Quando se aprovou o teto de gastos, houve uma queda pequena na Selic, mas a curva de juros futura caiu de 17% para 10%. O impacto da credibilidade fiscal na curva futura foi gigantesco, o que abriu espaço para o BC baixar os juros", afirmou o presidente do BC.
Campos Neto disse que o custo que combater a inflação no curto prazo é alto, mas que o custo de não combater é maior e perene. "É muito difícil trazer a inflação para baixo sem gerar nenhuma desaceleração na economia. Mas tentamos trazer o mínimo de custo para sociedade. Temos que tentar otimizar isso com o menor custo", afirmou, em audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado.
Campos Neto defendeu que haja equilíbrio fiscal e social - como propõe o governo -, mas lembrou que o volume de recursos é limitado.
Segundo ele, se o mercado passar a entender que haverá uma trajetória explosiva para a dívida, o governo passará a ter dificuldades em se financiar. "É preciso fazer social de forma responsável", completou.
Questionado por parlamentares da base do governo sobre o alto patamar da Selic, o presidente do Banco Central repetiu também que a diferença para os juros de outros emergentes hoje é menor que no passado. "O juro real no Brasil foi muito mais alto e por muito mais tempo, inclusive quando ninguém no mundo praticava um juro tão alto. Agora estamos próximos de México, Colômbia e Chile", rebateu.
Segundo o presidente do BC, a autoridade monetária tem trabalhado em algumas causas estruturais do juro real alto no Brasil, mas sinalizou que esse trabalho não cabe apenas à instituição. "Reformas e equilíbrio fiscal ajudam muito a reduzir juro real. Há uma conexão grande entre contas públicas em ordem e expectativas de inflação", reafirmou. "Em momento que tivemos choque de credibilidade positiva no fiscal, tivemos choque de melhor nas expectativas para o IPCA", acrescentou.
Confrontado pela pequena quantidade de bancos no Brasil, Campos Neto avaliou a quebra de bancos médios nos Estados Unidos deve gerar concentração naquele mercado e lembrou das iniciativas do BC para fomentar novos entrantes do sistema financeiro brasileiro. "Aqui estamos desconcentrando o mercado", completou.