Juros altos devem ser enfrentados com negocição de taxas e prazos e carro usado como entrada (Agência Brasil)
Agência de notícias
Publicado em 24 de março de 2025 às 08h42.
Última atualização em 24 de março de 2025 às 08h53.
O dublador Eduardo Drumond, 25 anos, levou um susto ao entrar numa concessionária do Rio para comprar um carro. Ele já havia comprado usados à vista, mas queria tentar um upgrade para um modelo novo e mais completo. Estava disposto a fazer seu primeiro financiamento, mas ficou surpreso quando viu na proposta do vendedor juros muito elevados em vez das velhas ofertas de taxa zero comuns no setor há poucos anos.
"Ao ver o valor e o número de parcelas fiquei receoso. Pensei muito, já que não teria possibilidade de pagar à vista desta vez, então, negociei na loja taxas melhores e diminuí o financiamento de 48 para 36 vezes. Fora que me ofereceram bons benefícios", conta.
Assim como Drumond, muitos motoristas estão pensando duas vezes na hora de comprar moto ou carro financiado por causa dos juros altos em um tipo de crédito que costumava ter taxas mais baixas por contar com o próprio veículo como garantia. Mas, com a alta da taxa básica de juros — na semana passada o Banco Central (BC) elevou mais uma vez a Selic em um ponto percentual, para 14,25% ao ano —, o custo do financiamento de automotores explodiu.
De acordo com dados do BC, a média das taxas no segmento ficou em 25,8% ao ano em 2024. Em janeiro deste ano, chegou a 29,5%, patamar mais alto desde a pandemia, quando os juros básicos sofreram forte queda antes de voltarem a subir. É também o maior percentual desde abril de 2009, quando chegou a 29,8%. Com o tempo, foi caindo e no período entre 2019 e 2020 chegou a ficar abaixo dos 20%. Com a alta da inflação após a pandemia e o novo ciclo de alta da Selic, as taxas do crédito para veículos subiram junto, com leve trégua em 2023.
Mesmo com o pico de janeiro, as vendas de motos e carros mantiveram o bom momento do setor no primeiro bimestre deste ano com 356,2 mil emplacamentos, segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). Foi o melhor desempenho para o período desde 2020, mas as vendas estão abaixo do esperado. Para agentes do setor, o crédito caro está freando a demanda.
"Se compararmos os primeiros dois meses e meio (janeiro, fevereiro e metade de março), o volume avançou 2,9% em relação ao mesmo período do ano passado. Mas em 2024 foi 14% superior a 2023", diz Cassio Pagliarini, CMO da Bright Consulting, consultoria especializada no setor, acrescentando que a expectativa do mercado para os dois primeiros meses do ano era de um avanço de 6%.
Para o consultor, preços altos, queda na confiança do consumidor e juros explicam a desaceleração:
"Numa condição de financiamento mais difícil, a expectativa é que as montadoras façam o socorro das concessionárias, porque o banco não vai fazer um financiamento com alto risco de inadimplência ou uma taxa que não compensa. Espera-se que as montadoras lancem incentivos de venda ou taxas subsidiadas junto aos seus bancos cativos para ajudar nas transações".
Murilo Briganti, COO da Bright Consulting, não vê alívio nas taxas para carros e motos no curto prazo, já que o próprio BC indicou que a Selic continuará subindo para conter a inflação. A taxa básica influencia diretamente o custo de todos os financiamentos no país, inclusive o de veículos.
A Selic alta eleva o custo do dinheiro para os bancos, que captam recursos no mercado com base nela. Emprestar fica mais caro e arriscado para os bancos, que elevam suas taxas e exigências para evitar calotes e preservar lucros. Com isso, o consumidor na ponta paga juros bem acima da Selic ao financiar um carro ou moto.
"Com um financiamento mais caro, o consumidor começa a procurar contratos de financiamento com entrada maior e prazos reduzidos para fugir dos juros elevados. Além de existir uma maior preocupação com a liquidez de revenda dos veículos", diz Briganti.
O especialista lembra que outro motivo de os bancos ficarem mais restritivos na aprovação de crédito automotivo é o risco do aumento da inadimplência, cuja média no país em fevereiro ficou em 4,37% para pessoas físicas e 2,6% para pessoas jurídicas, segundo dados do BC.
Mas, para quem quer uma moto ou carro novo, qual a melhor saída no cenário atual? Os consultores financeiros concordam: pagar à vista. A alta dos juros também torna aplicações em renda fixa mais vantajosas para juntar dinheiro.
"O ideal sempre é fazer o pagamento à vista, mas sabemos que a maioria da população tem dificuldade para ter essa reserva. Mas dá para fazer um planejamento de cinco anos, onde se pode investir um valor mensal na renda fixa, como CDB ou Tesouro Selic, para a execução da compra à vista", diz Aline Soaper, fundadora do Instituto Soaper, de treinamentos e desenvolvimento profissional e pessoal.
Ela lembra que veículos são bens passivos, geram custos de manutenção. Portanto, um bom negócio é usar um antigo como entrada para um novo. É o que fez o cartógrafo Caio Portugal, do Rio, depois de ver o custo alto do financiamento:
"Ofereci meu carro antigo como entrada e completei a diferença com pagamento à vista".