China quase triplica produção de automóveis em 14 anos e reorganiza mapa de fabricação no mundo
Relatório da ONU aponta consolidação do gigante asiático como líder na fabricação de carros, especialmente os elétricos e mostra novas oportunidades e desafios para países em desenvolvimento
Repórter
Publicado em 29 de novembro de 2024 às 13h49.
Última atualização em 29 de novembro de 2024 às 13h49.
As mudanças nos padrões globais de comércio e investimento estão alterando o mapa da produção automobilística, uma das mais complexas cadeias de produção industrial do mundo, de acordo com a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento ( UNCTAD ) da ONU. Em relatório récem-publicado, a organização aponta novas tendências no setor, nas quais a eficiência de custos e a demanda regional estão remodelando os antigos centros de produção em um cenário que consolida a China como líder absoluta na produção de carros, especialmente no mercado de veículos elétricos. E mostra novos desafios, mas também oportunidades, para os outros países em desenvolvimento.
Em 2023, 93.546.599 veículos foram fabricados globalmente. Desse total, pelo menos 30 milhões foram feitos pelo país asiático, incluindo 58% de todos os carros sem motor a combustão produzidos no mundo.
A China assumiu a liderança na produção ainda em 2009, quando produziu 13.790.994 veículos, não tão distante do segundo maior fabricante na época, o Japão, com mais de 7 milhões. Passados 14 anos, ela quase triplicou a produção, superando em duas vezes o segundo maior produtor de carros no ano passado, os Estados Unidos, que registraram mais de 10,6 milhões de unidades.
A série histórica da agência da ONU mostra que, de 1999 a 2023, a participação de outras nações em desenvolvimento como Índia e México também passaram a ser significativas, "refletindo a mudança de polos de produção", destaca o estudo.
De Detroit e Stuttgart para emergentes
Originalmente, a fabricação de automóveis estava concentrada em polos como Detroit, nos EUA, Stuttgart, na Alemanha, e Nagoya, no Japão. Porém, ao longo das últimas décadas, houve migração para países com menores custos de mão de obra e boas condições comerciais.
Os carros americanos e japoneses ainda representaram fatia importante do mapa da produção em 2023, mas são seguidos de perto pela Índia, com 5,8 milhões de unidade, e a Coreia do Sul, com 4,2 milhões de veículos.
E o domínio da China na fabricação de veículos elétricos representa um marco não apenas para a indústria, mas também para a transição energética. Com forte apoio governamental, incentivos fiscais e um mercado consumidor interno crescente, o país se tornou o principal hub global de produção e consumo desse tipo de carro.
A previsão é de que, em 2024, as vendas chinesas de carros elétricos ultrapassem 12 milhões de unidades. "O número reflete seu papel como um centro de produção massivo e um crescente mercado consumidor de veículos elétricos", avalia a UNCTAD. A organização também chama atenção para a liderança do país na produção de baterias, que são o componente mais caro e pesado dos veículos elétricos.
O dado reforça o princípio "produza onde você vende", segundo ela, já que o transporte de baterias onera os custos e dificulta a exportação em grande escala.
Desafios para outros países
A globalização da indústria automobilística sempre foi marcada pela busca de economias de escala. Para que a produção de veículos seja rentável, as montadoras precisam fabricar centenas de milhares de unidades em uma mesma plataforma.
Em 2023, essa escala aumentou: as fabricantes agora precisam produzir cerca de um milhão de veículos por ano para atingir a lucratividade, aponta a UNCTAD. Esse modelo, no entanto, está fora do alcance de muitos países em desenvolvimento e até mesmo de economias avançadas menores.
O relatório cita como exemplo o Chipre, com apenas 12.500 veículos vendidos em 2023. Assim como a Áustria, que fabrica carros quase exclusivamente para exportação e não tem condições de competir diretamente.
Mercados emergentes têm cases de sucesso
Embora o cenário seja desafiador, alguns países em desenvolvimento têm conseguido se destacar. A Tailândia é hoje um dos principais exportadores de veículos comerciais leves graças à presença de montadoras japonesas que estabeleceram plantas voltadas tanto para o mercado interno quanto para exportação regional.
O Brasil e o México também desempenham papéis importantes na América Latina, ainda que com volumes bem inferiores ao da China, EUA e Japão.
A agência da ONU menciona que ambos os países atraíram investimentos devido a suas localizações estratégicas e acordos comerciais regionais, mas permanecem focados em modelos de menor valor agregado. O México fabricou 4.002.047 veículos, enquanto o Brasil aparece com 2.324.838 veículos, no ano passado.
Impactos e oportunidades
Embora a transição para os veículos elétricos traga mudanças significativas, os princípios básicos da localização da produção e da necessidade de economias de escala permanecem constantes, segundo a Conferência para o Comércio e Desenvolvimento.
A fabricação de veículos independentes do motor à combustão ainda exige altos volumes para ser economicamente viável. Fábricas de baterias, por exemplo, precisam produzir entre 400 mil e 500 mil unidades anualmente para justificar o investimento.
O relatório avalia que os países em desenvolvimento precisam olhar para a diversificação econômica, o fortalecimento de cadeias de valor locais e a criação de políticas que atraiam investimentos para setores de alta tecnologia. A conclusão é que a transição para uma economia mais verde e digital apresenta tanto desafios quanto oportunidades para aqueles dispostos a se adaptar.