Beirute: cerca de 100 pessoas morreram com a explosão supostamente causada por nitrato de amônio (Marwan Tahtah/Getty Images)
Tamires Vitorio
Publicado em 5 de agosto de 2020 às 11h08.
Última atualização em 5 de agosto de 2020 às 16h18.
Na tarde desta terça-feira, 4, uma explosão gigantesca em Beirute, capital do Líbano, deixou ao menos 3,7 mil feridos e cerca de 100 mortos e gerou uma onda sísmica equivalente a um terremoto de 3,3 de magnitude. No momento da explosão, a principal suspeita era de que uma fábrica de fogos de artíficio havia entrado em combustão. Horas mais tarde, no entanto, a teoria foi contestada. A suspeita atual é de que um armazém com cerca de 2.700 toneladas de nitrato de amônio armazenadas de forma errada podem ter provocado o acidente.
Por si só, o composto químico, um sal cristalino inodoro, incolor ou branco, produzido pela reação da amônia e do ácido nítrico, não é perigoso, mas se torna uma vez que tem contato com produtos ou materiais oxidantes, ou ao ser aquecido e causa explosões gigantescas, como a que aconteceu no Líbano. "Ele é principalmente utilizado como fonte de nitrogênio em fertilizantes, mas também pode ser utilizado para fins bélicos em conjunto com outras substâncias", explica Carlos Eduardo Souto de Oliveira, químico, doutor em geoquímica e pesquisador no IAG-USP.
Ao entrar em combustão, o nitrato gera o óxido nitroso, que pode agravar o efeito estufa e ser 273 vezes mais nocivo do que o dióxido de carbono.
Por ano, cerca de 20 milhões de toneladas do químico são produzidas no mundo todo.
Ele também tem sérios efeitos na saúde humana, como irritações nos olhos, na pele e no tratorrespiratório, sem contar o sangue, que pode sofrer diretamente com uma substância presente no nitrato, causando uma doença chamada metahemoglobinemia, comumente chamada de doença do bebê azul. Os sintomas de inalação do nitrato são tosse, dor de garganta, falta de ar e sensação de sufocação.
Ao ter contato com o ar afetado pela combustão, como foi o caso dos moradores de Beirute, deve-se remover lentes de contato, lavar os olhos em água corrente por pelo menos 15 minutos, lavar a pele irritada com sabonete e água, cobrir a pele com uma boa dose de loção hidratante, beber muita água e leite e também induzir o vômito. Outras orientações, em inglês, podem ser encontradas neste site.
No Brasil, o composto químico é controlado pelo exército por sua capacidade bélica, mas é utilizado, principalmente como fertilizante ou como explosivo para ajudar na mineração.
Segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Tecnologia em Nutrição Vegetal (Abisolo), somente em 2018 o Brasil importou 1 milhão de toneladas de nitrato.
Em 2017, o país produziu 407.838 toneladas de nitrato de amônio --- um declínio de 28% se comparado a 2016, quando foram produzidas 522.786 toneladas por aqui, segundo a empresa americana de tecnologia de dados Knoema.
Em 1995, o terrorista americano Timothy McVeigh conseguiu comprar 2267 quilos de nitrato de amônio para produzir uma bomba, misturada com outros agentes explosivos. McVeigh não conseguiu por as mãos em outros compostos, como a hidrazina e em uma quantidade grande de TNT.
Apesar disso, o nitrato misturado com um combustível inflamável matou 168 pessoas no estado de Oklahoma, nos Estados Unidos.
Mesmo não sendo essa a sua principal função, grandes quantidades do nitrato de amônio podem ser até 40% mais poderosas que o TNT.
Para que ele seja mantido de forma segura, o composto deve ser colocado em um container fechado, sem aberturas ou entrada de ar ou substâncias inflamáveis.
Ele também não deve ser estocado próximo de substâncias combustíveis, líquidos inflamáveis ou corrosivos, sólidos inflamáveis ou substâncias que emitam calor. "O nitrato deve ser armazenado longe de combustíveis e outros materiais orgânicos, como óleos, graxas, lubrificantes, solventes, explosivos de qualquer tipo e até mesmo metais, como alumínio, magnésio em pó. Outro requisito importante a ser evitado são as condições de confinamento em altas temperaturas", diz Oliveira.
Esta não foi a primeira vez que o nitrato de amônio causou um acidente e deixou vítimas. Em 1921, 561 pessoas morreram após uma explosão em uma usina em Oppau, na Alemanha.
Em 1947, na cidade do Texas, uma explosão do tipo matou mais de 500 pessoas --- e é considerada uma das maiores explosões acidentais na história dos Estados Unidos.
Na França, cerca de 300 toneladas de nitrato de amônia armazenadas em um hangar da usina química AZF, em Toulouse, explodiram em 21 de setembro de 2001, causando a morte de 31 pessoas. A explosão pôde ser ouvida a 80 km de distância.
Em 2013, uma usina que usava o nitrato como fertilizador também explodiu, e matou 15 pessoas.