Carreira

A Volvo vai muito além das cotas de deficientes

Em vez de sair contratando para atingir a cota de pessoas com deficiência, a Volvo planejou por dez anos a inclusão desses profissionais.

Trabalhador cego da Volvo: graças à capacidade tátil aguçada, ele consegue identificar falhas na pintura que às vezes não se percebe a olho nu (Marcelo Almeida)

Trabalhador cego da Volvo: graças à capacidade tátil aguçada, ele consegue identificar falhas na pintura que às vezes não se percebe a olho nu (Marcelo Almeida)

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Da Redação

Publicado em 28 de novembro de 2013 às 19h27.

São Paulo - Em julho deste ano, a lei de cotas para pessoas com deficiência (Lei no 8.213/91) completa 22 anos. Apesar do tempo em vigor, muitas empresas ainda enfrentam dificuldade em cumpri-la, alegando não encontrar pessoas qualificadas que se encaixem nas necessidades e especificidades dos cargos na quantidade exigida pela lei.

Na montadora Volvo, isso não era diferente. Mas, em vez de apenas reclamar das dificuldades, a empresa se planejou durante anos para permitir que a entrada de pessoas com deficiên­cia fosse algo natural e, mais do que tudo, sustentável. 

Desafio

Assim como todas as empresas com mais de 1 000 funcionários, a Volvo precisava ter em seu quadro de empregados 5% de pessoas com deficiên­cia desenvolvendo diversas funções. O desafio é enorme para as companhias no Brasil. A Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência constatou que 325 000 pessoas com necessidades especiais trabalhavam em 2011.

Se todas as empresas cumprissem a lei, haveria mais de 900 000 trabalhadores nessas condições no mercado de trabalho — o que mostra o buraco ainda existente quando o assunto é preenchimento de cotas para pessoas com deficiência. “O universo é grande, mas as opções são poucas, pois infelizmente muita gente ficou à margem da sociedade e não se capacitou para o mercado de trabalho”, diz o coor­denador de recursos humanos da Volvo, Ricardo Nanami. 

Solução 

Diante dessa questão, a Volvo entendeu que a solução não era apenas contratar mas também incluir esse cidadão no ambiente de trabalho e na sociedade.

Para isso, era fundamental atuar em três frentes: mapear, com a ajuda de uma consultoria, quais tipos de deficiência se adequariam mais às posições e funções na fábrica de caminhões e ônibus, em Curitiba; encontrar parceiros para capacitar e formar pessoas com deficiência que pudessem ser incluídas no processo produtivo da companhia; e, por fim, preparar os demais funcionários para receber os novos colegas com alguma restrição física e trabalhar o processo de aceitação e inclusão dentro dos variados grupos que existem na empresa.


O processo de mapeamento aconteceu de 2000 a 2003, mas foi em 2005 que o projeto tomou proporções maiores, quando a Volvo estabeleceu com a Universidade Livre para Eficiência Humana (Unilehu) uma organização não governamental que ajuda na qualificação e no processo de inclusão dos portadores de deficiência.

Só essa parceria rendeu, no ano passado, a capacitação de 200 funcionários em libras, a linguagem de sinais para surdos e mudos. “Percebemos que era importante que os demais soubessem como se comunicar com um surdo e que basta, por exemplo, colocar a mão no ombro dele para indicar que alguém quer falar com ele”, diz Nanami.

Em 2006, a empresa avançou no projeto de inclusão, instituindo entre seus benefícios um auxílio-escola especial para filhos de funcionários com deficiência, mostrando sua preocupação com o tema.

Paralelamente a tudo isso, a companhia passou por adaptações estruturais de acessibilidade, oferecendo caminhos mais seguros para cegos com faixas e rampas e elevadores para cadeirantes, para dar fluxo normal à circulação com segurança na fábrica. Em algumas áreas, houve até rebaixamento do piso para anões (no momento, a empresa conta com dois anões trabalhando na fábrica).

No processo de mapeamento das funções que receberiam bem trabalhadores com deficiência, a Volvo se surpreendeu positivamente com algumas descobertas.

“Temos dois cegos na área de pintura, por exemplo, que fazem parte da checagem por causa de sua capacidade tátil aguçada”, diz Nanami. “Eles conseguem identificar falhas que às vezes não se percebe a olho nu.” Mas foi a adoção da Lei de Cotas no programa aprendiz que fez a Volvo atingir e ultrapassar a meta dos 5%.

Diferentemente do programa jovem aprendiz, o aprendiz com deficiência não tem limite de idade e fica até dois anos na companhia, período no qual tem a oportunidade de realizar cursos de aprendizado do Senai, que o qualificam para ser absorvido pela empresa no final do processo. 

Resultado

Somados os 37 aprendizes especiais com os demais 180, a Volvo conseguiu, em fevereiro deste ano, ultrapassar a meta dos 5%. O programa e a política de inclusão adotada pela companhia no Brasil deram tão certo que o curso de Libras vai constar do próximo relatório socioambiental global da empresa, publicado pela sede, em Gotemburgo, na Suécia.

No final, a rotatividade geral da empresa (de apenas 15% ao ano) também se repetiu nesse grupo (hoje é de 4%) — o que é uma façanha, dado o tradicional turnover de mercado que ocorre entre os profissionais com deficiência. “É uma satisfação ver que um projeto que nasceu há dez anos conseguiu atingir sua maturidade de forma contínua e sustentável e hoje é exemplo para outras empresas”, acrescenta Nanami.

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