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Indústria no sufoco contrata menos no Brasil

A desaceleração do setor industrial brasileiro prejudica o crescimento do país e afeta a geração de empregos nas demais áreas da economia

Fábrica da Vulcabras: neste ano, a indústria calçadista registrou redução de 5,3% no número de postos de trabalho (Germano Lüders / EXAME)

Fábrica da Vulcabras: neste ano, a indústria calçadista registrou redução de 5,3% no número de postos de trabalho (Germano Lüders / EXAME)

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Da Redação

Publicado em 14 de fevereiro de 2014 às 17h32.

São Paulo - A atividade da indústria sofreu retração em novembro, segundo levantamento divulgado em dezembro pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). A produção industrial passou de 54,5 pontos em outubro para 48,4 em novembro — um índice que varia de zero a 100.

Os números abaixo de 50 pontos indicam queda da produção. No acumulado do ano, a indústria perdeu 145.000 postos de trabalho de novembro de 2012 a novembro de 2013, informou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Índices negativos que se somam a uma sequência de crescimentos pífos ou de recuos do setor. 

Um dos efeitos disso é que a cidade de São Paulo — cuja economia é fortemente baseada na indústria — vem diminuindo sua contribuição para o Produto Interno Bruto Brasileiro. Em 2007, a cidade era responsável por 12,1% do PIB. Em 2011, essa participação caiu para 11,5%, segundo o IBGE.

O exemplo de são Paulo é reflexo de um quadro maior. De acordo com dados da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), em 2012 a participação da indústria no PIB brasileiro foi de 13,3%, o mesmo nível alcançado no ano de 1955, antes do plano de metas industriais do presidente Juscelino Kubitschek.

No mesmo ano, o setor de serviços representou 68% de toda a riqueza produzida pelo país, um crescimento de 4 pontos percentuais em relação a 2004. Diante desse quadro, tem ganhado força a tese de que o país estaria passando por uma desindustrialização. Para os especialistas, não há dúvidas de que a indústria brasileira desacelerou.

Porém, eles alertam que isso não quer dizer que o parque industrial brasileiro esteja diminuindo de tamanho. "O parque industrial continua amplo e com capacidade de renovação", diz Anita Kon, economista, pesquisadora do Ipea e professora da PUC de São Paulo.

O que diminuiu, esclarece a pesquisadora, é a importância relativa da indústria na geração de riquezas frente a outros setores. "A indústria brasileira está passando por um momento de estagnação que desestimula investimentos e inovação", explica.


Como o setor industrial é considerado um dos motores da economia brasileira, as outras áreas produtivas podem sofrer com sua desaceleração. Estima-se que, para cada real produzido pela indústria, outros 2,2 reais são gerados nos outros setores da economia brasileira. 

"Com a indústria indo mal, o país inteiro vai mal, tanto em termos de produtividade quanto em termos de criação de empregos", diz José Ricardo Roriz Coelho, diretor do departamento de competitividade e tecnologia da Fiesp, de São Paulo. Com a continuidade da desaceleração industrial, devem acontecer, nos próximos meses e anos, o fechamento de postos de trabalho no setor, além de uma migração de profissionais para outras áreas da economia.

"Em um momento de crise industrial como o que passamos, é importante ter fexibilidade para mudar de área caso seja necessário”, diz Daniela Ribeiro, gerente sênior das divisões de engenharia, marketing e vendas da Robert Half, consultoria de recrutamento, de São Paulo.

Sem saída

Mas quais são as causas desse cenário? Para os empresários do setor, o grande entrave ao crescimento da indústria nacional é o famoso custo Brasil. Por causa dos impostos e do excesso de burocracia, produzir no Brasil sai muito caro. "É 34 vezes mais caro produzir algo no Brasil do que em países asiáticos, por exemplo", afirma José Ricardo, da Fiesp.

Além disso, há o problema da infraestrutura: por termos estradas e portos deficientes (e sobrecarregados), o deslocamento da produção é mais lento e dispendioso. "Com isso, fica muito mais vantajoso importar produtos do que produzir internamente",  explica José Ricardo.

Para completar, há um descompasso entre o aumento dos salários e o crescimento da qualificação, o que diminui nossa produtividade. "Como existe pouca mão de obra qualificada, é difícil fazer com que a indústria brasileira ganhe competitividade", diz Reinaldo Nogueira, professor de economia da escola de economia e administração Ibmec, de Belo Horizonte.

Além desses fatores, há o lobby das grandes indústrias, que preferem criar barreiras protecionistas para impedir a entrada de concorrentes mais competitivos no mercado brasileiro, em vez de investir em tecnologia e treinamento de mão de obra.

"O setor também é fraco porque o Brasil tem uma cultura que não permite a ousadia e a inovação — a Apple, por exemplo, nunca poderia ter sido fundada aqui, com todos os nossos entraves", diz Reinaldo. A consequência é a previsão pessimista da Fiesp de que o Brasil só será um país industrialmente forte daqui a 40 anos — considerando a velocidade com que esses problemas de infraestrutura são resolvidos.


Os especialistas admitem que a redução da importância da indústria diante do setor de serviços é um processo natural,  que também ocorreu em países desenvolvidos. "É uma mudança natural, as demandas da população mudam e a economia acompanha essa inclinação", afirma Reinaldo Nogueira, do Ibmec.

O problema é que o Brasil ainda não está maduro para essa transição. "Ainda precisamos atender às demandas básicas de uma população emergente, que está chegando à classe média e quer comprar produtos manufaturados, que deveriam ser produzidos pela indústria nacional”, afirma José Ricardo, da Fiesp.

De acordo com o estudo da entidade, essa transição do foco da economia para o setor de servitranços seria natural quando o PIB per capita chegasse a 20.000 dólares anuais por habitante — no Brasil, a média é de 11.000 dólares. "Quando a renda chega a esse patamar, é natural que as pessoas busquem alternativas além dos bens de consumo, como viagens e passeios, e aqueçam o setor terciário", explica José Ricardo.

Só que, por aqui, a indústria já está perdendo suas forças. "Não seria um problema tão grande se o nosso setor de serviços fosse produtivo, mas as horas trabalhadas ali não são muito rentáveis para a economia", afirma Reinaldo.

Resultado: sem investimentos em infraestrutura e na qualificação e sem mudanças nas regras trabalhistas e tributárias que permitam à indústria brasileira deslanchar, o país deve continuar perdendo competitividade nos próximos anos, com consequências imprevisíveis para o desenvolvimento e para os empregos no país no longo prazo.

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