O retorno dos trabalhadores às fábricas em São Paulo aconteceu após decisão do Judiciário que definiu que a GM deveria reintegrar todos os trabalhadores demitidos em outubro (Dado Galdieri/Getty Images)
Repórter
Publicado em 9 de novembro de 2023 às 14h22.
Última atualização em 9 de novembro de 2023 às 18h27.
Nesta quarta-feira, 8, os trabalhadores da General Motors em São Paulo, multinacional fabricante de automóveis, voltaram a trabalhar após 17 dias de greve, devido as 1.245 demissões anunciadas em outubro.
Três unidades da GM passaram pelos cortes no último mês: foram 300 demissões na unidade de São Caetano do Sul, 839 demitidos na unidade de São José dos Campos e 106 desligados na unidade de Mogi das Cruzes, segundo informações dos sindicatos.
O retorno dos trabalhadores à fábrica ocorre após o judiciário definir que a GM deveria reintegrar os 1.245 trabalhadores demitidos.
Os funcionários reintegrados não voltarão para a linha de produção neste momento. O motivo: antes da greve, boa parte deles já estava em regime de suspensão de contrato, mais conhecido na sigla em inglês "lay off".
O lay off começou em 28 de junho deste ano em função do impacto das incertezas na economia sobre a demanda de carros da companhia. Na ocasião, 945 funcionários entraram no regime de lay off. Em 21 de outubro, a operação brasileira da GM anunciou a demissão desses profissionais e também a de outros 300 empregados.
O grupo de 1.245 funcionários não voltará para a linha de produção neste momento. Pela decisão do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo (TRT-SP), intermediada pelos sindicatos de metalúrgicos das três cidades com unidades da GM, o grupo ficará em licença remunerada por 30 dias. Depois disso, a GM deverá apresentar uma proposta de como aproveitar a mão de obra novamente em suas fábricas.
Para entender a decisão do judiciário, Rodrigo Chagas Soares, advogado trabalhista, sócio do escritório Granadeiro Guimarães e professor de direito sindical do Insper, falou à EXAME sobre a origem do acordo, segundo a decisão do Tribunal Regional do Trabalho do dia 31 de outubro de 2023.
No dia 28 de junho deste ano, de acordo com a assessoria dos Sindicatos dos Metalúrgicos de São José dos Campos e de Mogi das Cruzes, a GM firmou um acordo para suspender o contrato de trabalho de 945 funcionários, conhecido como “lay-off”.
“Neste período de suspensão, a legislação autoriza que a empresa deixe de pagar os salários e possa conceder ajuda compensatória mensal, sem natureza salarial, isenta de encargos previdenciários, com a possibilidade desse trabalhador ainda receber uma bolsa de estudos para sua qualificação profissional”, afirma Soares, que também é membro da Comissão de Direito Sindical da OAB de SP.
Durante a suspensão dos contratos de trabalho (no lay-off), apesar de não receber mais o salário, e sim uma ajuda de custo compensatória, os empregados ainda ficam na folha de pagamentos da companhia, ou seja, ainda são empregados, com carteira assinada. Esse status, no entanto, deve permanecer até durar o acordo coletivo de lay-off, conforme negociação coletiva realizada com o sindicato de trabalhadores.
“O acordo de lay-off tem um prazo determinado, ele pode valer por meses, assim como pode ser prorrogado também. De acordo com a legislação, caso ocorra demissão durante o período de suspensão contratual ou nos três meses subsequentes do retorno ao trabalho, a empresa pagará ao empregado, além das parcelas indenizatórias de uma rescisão sem justa causa, multa a ser estabelecida na negociação coletiva.”
No caso da GM, o acordo de lay-off firmado tem o prazo até maio de 2024, segundo os dois sindicatos que participaram da negociação.
Apesar de o acordo ter sido firmado até maio de 2024, a GM, alegando decisões financeiras, demitiu no dia 21 de outubro deste ano os 945 funcionários das unidades de São José dos Campos e de Mogi, e mais 300 funcionários da unidade de São Caetano do Sul que não estavam em lay-off.
“Segundo o judiciário, a empresa não poderia ter demitido, porque estava fora do prazo acordado com os sindicatos de suspensão dos contratos de trabalho”, diz Soares.
Para uma empresa desligar uma quantidade significativa de funcionários ela precisa notificar o sindicato para sua intervenção, não sendo necessária a concordância da entidade sindical, afirma o advogado.
“No caso da GM o acordo de suspensão contratual estava em andamento e mesmo assim acabou ocorrendo demissões de funcionários suspensos, ou seja, houve uma violação do acordo, como relatado pelo judiciário.”
Com a decisão da justiça, os sindicatos envolvidos afirmaram que a empresa fez uma nova negociação e teve que reintegrar os 1.245 funcionários em sua folha de pagamento, porém não mais no status de lay-off, e sim como “licença-remunerada”, status em quem o funcionário irá receber o salário normal mais benefícios. Esse acordo deve durar por um mês, até uma nova proposta ser apresentada pela empresa aos sindicatos.
Em protesto aos 1.245 funcionários demitidos no dia 21 de outubro, no dia 23 de outubro mais de 12 mil trabalhadores da GM entraram em greve nas três fábricas em São Paulo. O movimento levou a paralisação 100% da produção de veículos nas três fábricas de São Paulo, São José dos Campos, São Caetano do Sul e Mogi das Cruzes.
Além da reintegração dos demitidos, outra condição que estimulou o retorno às fábricas foi o pagamento de todos os dias parados para todos os funcionários que participaram das greves.
“Segundo a legislação, a participação em greve suspende a atividade do trabalho, ou seja, como o funcionário não trabalhará, não haverá pagamento de salário. Porém, esses dias podem sim ser remunerados, desde que haja uma negociação entre as partes, assim como a empresa poderá negociar uma extensão do horário de trabalho para compensar o tempo parado,” afirma o advogado.
O acordo de licença remunerada dos 1.245 deve durar por 30 dias, prazo que a empresa tem para apresentar novas propostas. Segundo a assessoria do Sindicato de São José dos Campos, nesta quarta-feira, 08, foi votado na unidade durante a assembleia com os trabalhadores o “estado de greve permanente” caso a companhia não cumpra com a licença remunerada.
Procurada, a assessoria da GM não respondeu.
O lay-off é uma medida que se tornou comum no Brasil. Segundo informações do Tribunal Superior do Trabalho, "o lay-off foi regulamentado em 2001 no Brasil e ganhou destaque em 2015, quando as montadoras de veículos usaram esse recurso para evitar demissões em massa". Em 2020, durante a pandemia da Covid-19, o lay-off foi novamente utilizado por empresas que enfrentaram crises financeiras, com base na legislação do período.
Um exemplo, segundo o advogado, foi o acordo de cooperação técnica de apoio à adesão do Programa Bolsa Qualificação (lay-off) entre Fecomércio-PE, Senac e Superintendência Regional do Trabalho em Pernambuco em março de 2021, que ofereceu 1.500 vagas para empresas associadas aos sindicatos representados pela Fecomércio, com um investimento de aproximadamente R$ 15 milhões para o setor de comércio do estado.
Um exemplo mais recente acontece com a empresa Caoa Chery, afirma Soares.
"A companhia anunciou o fechamento de sua fábrica em Jacareí (SP) até 2025, numa decisão que implicaria na demissão de mais de 400 funcionários. O sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região, no entanto, informou que essas demissões poderiam ser revertidas em um programa de lay-offs."
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