Economia colaborativa: dividir ao invés de acumular
Descubra como economizar, faturar e empreender usando a regra de dividir, em vez de acumular
Da Redação
Publicado em 25 de abril de 2015 às 08h08.
O fotógrafo paranaense Gustavo Benke, de 28 anos, é uma referência entre os amigos quando o assunto é desapego e capacidade de compartilhar. Sua casa, na capital paranaense, está sempre de portas abertas para acolher parentes, amigos e amigos de amigos, pelo tempo que precisar.
No local, que comporta até dez pessoas, basta colaborar nas despesas e ajudar na manutenção para viver em um estilo comunitário com direito a Wi-Fi. Há dois anos, ao ingressar na faculdade de música em Florianópolis, o fotógrafo decidiu replicar seu estilo de vida na casa que aluga na praia do Campeche.
Esse compartilhamento do espaço acaba beneficiando a todos — os hóspedes, que economizam com a estadia, e Gustavo, que recebe ajuda nas despesas. “As pessoas veem a maneira como eu cuido do espaço, e se sentem inspiradas a cuidar também, então muita gente deixa sua contribuição — uma hortinha, uma pintura, uma varrida na casa e por aí vai”, diz ele, que também tem o hábito de trocar seu trabalho de fotógrafo pelos bens ou serviços de que necessita.
Gustavo representa um movimento que já vem sendo descrito como a principal tendência econômica do século 21 — a chamada economia colaborativa. Ao conectar desconhecidos com interesses e necessidades comuns, redes sociais e aplicativos facilitam o compartilhamento e a troca de serviços e objetos numa escala sem precedentes.
Por essa razão, há quem atribua à economia colaborativa o poder de reduzir o desperdício, aumentar a eficiência no uso dos recursos naturais, combater o consumismo e até reduzir a desigualdade social no mundo. Ainda é preciso observar se o movimento realmente será capaz de cumprir toda essa agenda.
Mas não resta dúvida, por enquanto, do poder da economia colaborativa de fomentar negócios baseados no compartilhamento. Prova disso é que a plataforma Airbnb — de oferta de cômodos vagos e imóveis para locação por temporada — tem hoje um valor de mercado superior ao de grandes grupos hoteleiros, como o Hyatt. Só em 2014, os empreendimentos colaborativos movimentaram mais de 110 bilhões de dólares em todo o mundo, segundo a revista Forbes.
Hoje, é possível economizar e lucrar com esse movimento fazendo bicos nas horas vagas, compartilhando veículos, a casa ou espaços de trabalho e trocando objetos, como livros e roupas. Sem falar na possibilidade de viabilizar projetos individuais, como a publicação de um livro ou a gravação de um filme, via financiamento coletivo.
Para Nicolau Reinhard, especialista em tecnologia da informação da Fundação Instituto de Administração da USP, um dos pontos mais favoráveis à disseminação da economia colaborativa é ser um modelo vantajoso tanto para quem oferece quanto para quem contrata um serviço. “Eliminamos os intermediários e os custos de uma estrutura formal de comércio”, diz Nicolau.
Este, aliás, é o conceito por trás das redes de financiamento coletivo Eco Rede Social, voltada para projetos de sustentabilidade, e Eco do Bem, para projetos culturais, criadas pela publicitária Izabella Ceccato, de 38 anos, de São Paulo. A inspiração veio de uma experiência vivida em 2012, quando Izabella passou seis meses na Inglaterra numa comunidade do Transition Town Movement, iniciativa que incentiva a transformação das cidades em modelos sustentáveis.
Izabella aprendeu a abrir mão do carro e hoje só usa carona compartilhada ou transporte público, além de ter desistido de gastar fortunas na renovação do guarda-roupa — é frequentadora assídua de bazares de troca. Só em janeiro, ela economizou cerca de 2 000 reais em roupas, sapatos e acessórios novos graças ao intercâmbio de peças entre as frequentadoras. “Meu grande aprendizado com o compartilhamento é que não precisamos comprar tantas coisas para viver bem, com conforto”, diz Izabella.
Fonte de renda
Em São Paulo, o designer Wolf Menke, de 33 anos, é um dos que fazem do compartilhamento não só uma ferramenta para economizar mas também uma fonte de renda.
Em 2013, ele criou o espaço de coworking House of Work, na badalada Vila Madalena, bairro da capital paulista conhecido por sua efervescência cultural. No ano passado, após recuperar o investimento, Wolf decidiu deixar o emprego de diretor de arte de uma agência publicitária para abrir seu segundo espaço de compartilhamento, a House of Food, o primeiro restaurante coworking do Brasil.
Com uma cozinha industrial totalmente equipada, bem como equipe de garçons e ajudantes, ele loca o espaço para chefs pelo prazo de um dia ou de uma semana. O cozinheiro só leva os ingredientes e vende as refeições que produzir. O hoje empreendedor não se arrepende da transição profissional. “Passei a utilizar os recursos e a minha criatividade de maneira mais produtiva”, diz Wolf.
Agora, ele acaba de comprar uma terceira casa na região e se prepara para abrir a House of Learning, espaço de coworking para aulas e palestras. Por causa de um projeto da criação de um House of Work em favelas, Wolf foi selecionado pelo Yunus Negócios Sociais, incubadora e aceleradora de negócios com sustentabilidade financeira e potencial de impacto social, fundada pelo Nobel da Paz Muhammad Yunus.
Aos poucos
Mesmo quem não planeja empunhar a bandeira da economia colaborativa em tempo integral pode lucrar ou pelo menos poupar ao incluir algum hábito de compartilhamento na rotina. São inúmeras as possibilidades proporcionadas por plataformas colaborativas para quem quer economizar, faturar com bicos nas horas vagas ou até empreender (veja lista de sites e apps). Colocar na ponta do lápis o tamanho da economia que pode ser feita com o compartilhamento pode ser um bom incentivo para começar.
Porém, quem quer ganhar dinheiro com o compartilhamento deve dispor de uma boa dose de desapego para dividir quartos, casas, carros, espaços de trabalho, roupas e tempo (veja quadros). “É possível viajar, ter mobilidade, um negócio e ainda ganhar qualidade de vida com o compartilhamento”, diz Izabella. “Mas realizações só acontecem para quem está aberto a fazer diferente”, afirma.
Conheça os prós e contras de cada tipo de compartilhamento e avalie se você realmente estaria preparado para a troca de alguns tipos de bens e serviços
Transporte – quem quer compartilhar o próprio carro deve estar disposto a ser pontual e a levar na esportiva situações como encontrar pequenos arranhões no veículo. Se você é o tipo de pessoa que coloca apelido carinhoso no carro e não deixa o sobrinho de dois anos comer biscoito lá dentro, talvez não seja uma boa ideia.
O lado positivo aparece em situações inusitadas. “No Natal, um usuário deixou um panetone e um bilhete carinhoso em agradecimento pelo carro, algo que nunca aconteceria numa locadora convencional”, diz Clayton Guimarães, da Fleety, plataforma que permite compartilhar seu carro ou alugar o de outra pessoa por dia ou por hora.
Hospedagem – quem compartilha um quarto da casa ou o sofá definitivamente não pode ter o hábito de ver TV na sala só de cuecas ou entrar no cômodo onde está o hóspede para pegar um livro às 3h da manhã. Se você valoriza demais a privacidade, pode ficar desconfortável em ter alguém estranho usando seu chuveiro e abrindo a geladeira.
A mesma regra vale para o aluguel de um imóvel ocioso – é preciso ter jogo de cintura para lidar com situações como louça quebrada ou o guarda-sol fora do lugar habitual.
Animais de estimação -- quem abre a casa para receber um bichinho, precisa gostar mesmo de animais e ter o espaço preparada para a estadia dos peludos – como dizer para o dono que o bichano fraturou a pata porque sua janela não tem tela de proteção? Outra dica é receber animais do porte certo para você e seu local.
Uma senhora de 70 anos pode dar conta de um poodle, mas não irá passear com um rottweiler, por mais dócil que ele seja. Para evitar roubadas, preencha sua ficha da forma mais completa, deixando claro o tipo de hóspede que pretende receber: cães, gatos, pássaros, tamanho e raça.
Coworking – sua mesa parece uma praia pós-tsunami? Você não vive sem suas plantas, bichinhos e porta-retratos espalhados ao redor do mouse? Talvez compartilhar um espaço de trabalho não seja a sua. Para isso, organização e respeito com o colega são fundamentais. Não vale espalhar seu material na baia ao lado, nem berrar ao telefone.
Pontualidade é outro detalhe importante: se você contratou os serviços do hub por seis horas, é deselegante ficar mais três horas por lá sem acertar as contas no final. Uma das vantagens, por outro lado, é o networking que esse tipo de experiência proporciona. “É interessante se relacionar com os profissionais que estão no local durante um café ou almoço”, diz Samy Dana, economista da FGV.
O fotógrafo paranaense Gustavo Benke, de 28 anos, é uma referência entre os amigos quando o assunto é desapego e capacidade de compartilhar. Sua casa, na capital paranaense, está sempre de portas abertas para acolher parentes, amigos e amigos de amigos, pelo tempo que precisar.
No local, que comporta até dez pessoas, basta colaborar nas despesas e ajudar na manutenção para viver em um estilo comunitário com direito a Wi-Fi. Há dois anos, ao ingressar na faculdade de música em Florianópolis, o fotógrafo decidiu replicar seu estilo de vida na casa que aluga na praia do Campeche.
Esse compartilhamento do espaço acaba beneficiando a todos — os hóspedes, que economizam com a estadia, e Gustavo, que recebe ajuda nas despesas. “As pessoas veem a maneira como eu cuido do espaço, e se sentem inspiradas a cuidar também, então muita gente deixa sua contribuição — uma hortinha, uma pintura, uma varrida na casa e por aí vai”, diz ele, que também tem o hábito de trocar seu trabalho de fotógrafo pelos bens ou serviços de que necessita.
Gustavo representa um movimento que já vem sendo descrito como a principal tendência econômica do século 21 — a chamada economia colaborativa. Ao conectar desconhecidos com interesses e necessidades comuns, redes sociais e aplicativos facilitam o compartilhamento e a troca de serviços e objetos numa escala sem precedentes.
Por essa razão, há quem atribua à economia colaborativa o poder de reduzir o desperdício, aumentar a eficiência no uso dos recursos naturais, combater o consumismo e até reduzir a desigualdade social no mundo. Ainda é preciso observar se o movimento realmente será capaz de cumprir toda essa agenda.
Mas não resta dúvida, por enquanto, do poder da economia colaborativa de fomentar negócios baseados no compartilhamento. Prova disso é que a plataforma Airbnb — de oferta de cômodos vagos e imóveis para locação por temporada — tem hoje um valor de mercado superior ao de grandes grupos hoteleiros, como o Hyatt. Só em 2014, os empreendimentos colaborativos movimentaram mais de 110 bilhões de dólares em todo o mundo, segundo a revista Forbes.
Hoje, é possível economizar e lucrar com esse movimento fazendo bicos nas horas vagas, compartilhando veículos, a casa ou espaços de trabalho e trocando objetos, como livros e roupas. Sem falar na possibilidade de viabilizar projetos individuais, como a publicação de um livro ou a gravação de um filme, via financiamento coletivo.
Para Nicolau Reinhard, especialista em tecnologia da informação da Fundação Instituto de Administração da USP, um dos pontos mais favoráveis à disseminação da economia colaborativa é ser um modelo vantajoso tanto para quem oferece quanto para quem contrata um serviço. “Eliminamos os intermediários e os custos de uma estrutura formal de comércio”, diz Nicolau.
Este, aliás, é o conceito por trás das redes de financiamento coletivo Eco Rede Social, voltada para projetos de sustentabilidade, e Eco do Bem, para projetos culturais, criadas pela publicitária Izabella Ceccato, de 38 anos, de São Paulo. A inspiração veio de uma experiência vivida em 2012, quando Izabella passou seis meses na Inglaterra numa comunidade do Transition Town Movement, iniciativa que incentiva a transformação das cidades em modelos sustentáveis.
Izabella aprendeu a abrir mão do carro e hoje só usa carona compartilhada ou transporte público, além de ter desistido de gastar fortunas na renovação do guarda-roupa — é frequentadora assídua de bazares de troca. Só em janeiro, ela economizou cerca de 2 000 reais em roupas, sapatos e acessórios novos graças ao intercâmbio de peças entre as frequentadoras. “Meu grande aprendizado com o compartilhamento é que não precisamos comprar tantas coisas para viver bem, com conforto”, diz Izabella.
Fonte de renda
Em São Paulo, o designer Wolf Menke, de 33 anos, é um dos que fazem do compartilhamento não só uma ferramenta para economizar mas também uma fonte de renda.
Em 2013, ele criou o espaço de coworking House of Work, na badalada Vila Madalena, bairro da capital paulista conhecido por sua efervescência cultural. No ano passado, após recuperar o investimento, Wolf decidiu deixar o emprego de diretor de arte de uma agência publicitária para abrir seu segundo espaço de compartilhamento, a House of Food, o primeiro restaurante coworking do Brasil.
Com uma cozinha industrial totalmente equipada, bem como equipe de garçons e ajudantes, ele loca o espaço para chefs pelo prazo de um dia ou de uma semana. O cozinheiro só leva os ingredientes e vende as refeições que produzir. O hoje empreendedor não se arrepende da transição profissional. “Passei a utilizar os recursos e a minha criatividade de maneira mais produtiva”, diz Wolf.
Agora, ele acaba de comprar uma terceira casa na região e se prepara para abrir a House of Learning, espaço de coworking para aulas e palestras. Por causa de um projeto da criação de um House of Work em favelas, Wolf foi selecionado pelo Yunus Negócios Sociais, incubadora e aceleradora de negócios com sustentabilidade financeira e potencial de impacto social, fundada pelo Nobel da Paz Muhammad Yunus.
Aos poucos
Mesmo quem não planeja empunhar a bandeira da economia colaborativa em tempo integral pode lucrar ou pelo menos poupar ao incluir algum hábito de compartilhamento na rotina. São inúmeras as possibilidades proporcionadas por plataformas colaborativas para quem quer economizar, faturar com bicos nas horas vagas ou até empreender (veja lista de sites e apps). Colocar na ponta do lápis o tamanho da economia que pode ser feita com o compartilhamento pode ser um bom incentivo para começar.
Porém, quem quer ganhar dinheiro com o compartilhamento deve dispor de uma boa dose de desapego para dividir quartos, casas, carros, espaços de trabalho, roupas e tempo (veja quadros). “É possível viajar, ter mobilidade, um negócio e ainda ganhar qualidade de vida com o compartilhamento”, diz Izabella. “Mas realizações só acontecem para quem está aberto a fazer diferente”, afirma.
Conheça os prós e contras de cada tipo de compartilhamento e avalie se você realmente estaria preparado para a troca de alguns tipos de bens e serviços
Transporte – quem quer compartilhar o próprio carro deve estar disposto a ser pontual e a levar na esportiva situações como encontrar pequenos arranhões no veículo. Se você é o tipo de pessoa que coloca apelido carinhoso no carro e não deixa o sobrinho de dois anos comer biscoito lá dentro, talvez não seja uma boa ideia.
O lado positivo aparece em situações inusitadas. “No Natal, um usuário deixou um panetone e um bilhete carinhoso em agradecimento pelo carro, algo que nunca aconteceria numa locadora convencional”, diz Clayton Guimarães, da Fleety, plataforma que permite compartilhar seu carro ou alugar o de outra pessoa por dia ou por hora.
Hospedagem – quem compartilha um quarto da casa ou o sofá definitivamente não pode ter o hábito de ver TV na sala só de cuecas ou entrar no cômodo onde está o hóspede para pegar um livro às 3h da manhã. Se você valoriza demais a privacidade, pode ficar desconfortável em ter alguém estranho usando seu chuveiro e abrindo a geladeira.
A mesma regra vale para o aluguel de um imóvel ocioso – é preciso ter jogo de cintura para lidar com situações como louça quebrada ou o guarda-sol fora do lugar habitual.
Animais de estimação -- quem abre a casa para receber um bichinho, precisa gostar mesmo de animais e ter o espaço preparada para a estadia dos peludos – como dizer para o dono que o bichano fraturou a pata porque sua janela não tem tela de proteção? Outra dica é receber animais do porte certo para você e seu local.
Uma senhora de 70 anos pode dar conta de um poodle, mas não irá passear com um rottweiler, por mais dócil que ele seja. Para evitar roubadas, preencha sua ficha da forma mais completa, deixando claro o tipo de hóspede que pretende receber: cães, gatos, pássaros, tamanho e raça.
Coworking – sua mesa parece uma praia pós-tsunami? Você não vive sem suas plantas, bichinhos e porta-retratos espalhados ao redor do mouse? Talvez compartilhar um espaço de trabalho não seja a sua. Para isso, organização e respeito com o colega são fundamentais. Não vale espalhar seu material na baia ao lado, nem berrar ao telefone.
Pontualidade é outro detalhe importante: se você contratou os serviços do hub por seis horas, é deselegante ficar mais três horas por lá sem acertar as contas no final. Uma das vantagens, por outro lado, é o networking que esse tipo de experiência proporciona. “É interessante se relacionar com os profissionais que estão no local durante um café ou almoço”, diz Samy Dana, economista da FGV.