Como manter o espírito inovador sendo enorme, segundo o CEO da Heineken
Prestes a completar seis anos na presidência da companhia, Mauricio Giamellaro enfrenta um desafio que combina escala e ousadia: manter a inovação e o crescimento em um dos setores mais competitivos do mercado brasileiro
Repórter
Publicado em 14 de novembro de 2024 às 16h06.
Última atualização em 14 de novembro de 2024 às 17h09.
Prestes a completar seis anos como CEO da Heineken Brasil, Mauricio Giamellaro segue com um grande lema: gente feliz brinda mais! Sob sua liderança, ele criou a Diretoria da Felicidade, que ajudou a diminuir o turnover e levou a operação brasileira se tornar uma das maiores da companhia no mundo.
Para Giamellaro, o segredo para crescer sem perder o dinamismo está em pensar como uma startup, mesmo sendo gigante. “Inovar em uma organização grande como a nossa exige permitir erros e aprendizados”, afirma.
Com 12 anos na companhia, o CEO já havia passado por outras gigantes como Unilever, Pepsico e Reckitt Benckiser, mas foi na Heineken que encontrou o que chama de "momento mágico": o alinhamento entre seus valores pessoais e os da empresa.
“Respeito, paixão, coragem e diversão são os pilares da Heineken e também os meus. Quando você encontra uma empresa que compartilha seus valores, o trabalho deixa de ser apenas trabalho”, afirma Giamellaro que é o primeiro brasileiro a ser o presidente da Heineken no Brasil.
Uma trajetória guiada por valores familiares
Nascido na Zona Leste de São Paulo, Giamellaro diz que aprendeu a ser líder com a sua família. Filho de um corretor de imóveis e de uma secretária executiva, o executivo cresceu em um lar que valorizava o respeito e a empatia.
“Meu pai me ensinou o valor das relações humanas, enquanto minha mãe me mostrou a importância da disciplina e da determinação”, diz o CEO. “Esses são princípios que carrego até hoje e que transmito para meus dois filhos e minha equipe”.
Economista por formação, Giamellaro começou a carreira no setor público trabalhando no Ministério da Fazenda na área de tributos fiscais, mas a mudança para a iniciativa privada veio em 2001, ao aceitar uma oportunidade na área de vendas da Unilever, no Vale do Paraíba. Após um ano e meio, Giamellaro virou supervisor de vendas da companhia, ocupando o seu primeiro cargo como líder. “Lembro que mudei radicalmente minha vida para ficar mais perto da minha esposa. Então, fui pelo coração, o que já mostra um pouco do que eu acredito ser a grande diferença que um líder tem que ter.”
Para o executivo, algo que ele aprendeu logo em seu primeiro cargo de liderança foi a importância de três ações: escutar, reconhecer e direcionar. “Algo que eu aprendi naquela época como líder, e que levo até hoje, é que um bom líder precisa saber se conectar com as pessoas, ou seja, ter a humildade de escutar, descobrir as fortalezas de cada um do time e criar um propósito claro para a equipe”, afirma Giamellaro.
O convite para o topo da Heineken
Com a experiência de mais de 15 anos atuando com vendas em diferentes setores, Giamellaro entra na Heineken em 2012 como vice-presidente de vendas e distribuição. Em 2019, o convite para ocupar a cadeira de CEO, que era ocupada pelo francês Didier Debrosse, chega ao paulista que aceita e segue até hoje com o desafio de continuar destacando a companhia no setor que ele diz ser o mais desafiador de sua carreira – e do mercado brasileiro.
“Eu já trabalhei com queijo, com margarina, com molho de tomate, com produto de limpeza, com medicamento, isotônico, enfim, de tudo que eu já fiz, mas o segmento de bebida é sem dúvida o mais competitivo, o mais nervoso. Não dá para ficar entediado, é impossível”.
Na Heineken, o executivo completará em fevereiro 6 anos de presidência, devido a dois fatores. O primeiro ele chama de “momento mágico”, quando o funcionário encontra uma empresa que tem os meus valores. O segundo motivo que o mantém no cargo de CEO, inevitavelmente, são os resultados.
“Essa é a empresa que mais tempo fiquei e confesso que eu nem vi o tempo passar. Encontrei alinhamento entre os meus valores e o da empresa, e agora como CEO consigo direcionar ainda mais os valores da companhia para aquilo que eu acredito”, afirma Giamellaro.
Os marcos do CEO
Lembra que o lema de Giamellaro é “gente feliz brinda mais!”? Para fazer desse pensamento uma realidade, o executivo teve a ideia de criar em 2023 a Diretoria da Felicidade. O novo departamento foi baseado na Ciência da Felicidade, que avalia os funcionários e cria ações voltadas para a saúde mental, física e social dos funcionários.
“Essa é uma conquista que eu levo com muito orgulho, afinal vejo a Heineken sendo reconhecida pelo aspecto de saúde mental e de felicidade dos funcionários”, afirma o CEO que participou nesta semana do Mind Summit, evento que reuniu líderes e especialistas para debater saúde mental e felicidade nas empresas, em São Paulo.
Hoje, a Heineken conta com 1.300 embaixadores de felicidade entre seus 14 mil funcionários no Brasil. Além disso, a empresa realiza pesquisas quinzenais para medir os níveis de felicidade dos funcionários, alcançando uma taxa de resposta de 82%. "Nos últimos três anos, tivemos os melhores indicadores de crescimento, participação de mercado e lucro", diz Giamellaro. Outra grande conquista do novo departamento foi a redução do turnover voluntário, de 5% para 0,7%.
O segundo grande marco da presidência de Giamellaro foi ver a operação da Heineken no Brasil se transformar na maior operação da companhia no mundo. “Vi a Heineken Brasil sair de 17ª para a primeira operação no mundo, isso também é motivo de muito orgulho, para mim e para o meu time.”
Outro marco foi o avanço em diversidade e inclusão. Atualmente, 43% das lideranças da empresa no Brasil são ocupadas por mulheres, com a meta de alcançar 50% até 2026. O foco, porém, está na diversidade racial, afirma o CEO. A Heineken busca atingir 40% de representatividade em cargos de chefia até 2030. “Já avançamos muito na inclusão de gênero, mas agora nosso foco está em ampliar a representatividade racial. Para isso, seremos cada vez mais intencionais,” afirma.
“O meu escritório é na praia”
Para ser feliz com o que faz e continuar dando resultado como CEO neste mercado tão competitivo, Giamellaro diz que precisa ser feliz fora do trabalho também, mas para isso ele diz que é preciso ter muita disciplina. Ele acorda 5h30 da manhã, faz academia e só depois vai trabalhar. “Estipulo um limite para sair do trabalho, estourando no máximo até as 19h, depois vou sair com a minha esposa para um cinema ou restaurante”, diz. “Eu prezo pela qualidade de vida e preciso dar o exemplo”.
Com o regime de trabalho 100% home office para o administrativo, que engloba cerca de 4.500 funcionários, inclusive o CEO, Giamellaro acaba conseguindo dedicar um tempo para ele e para a família. E por isso, aprovou algumas regras internas para que seus funcionários também possam ter uma vida além do trabalho. Reuniões após as 18h não é para existir e toda sexta-feira os funcionários podem sair mais cedo, o famoso “Short Friday”.
“Hoje o meu escritório é na praia. Costumo ir para o escritório, em São Paulo, duas ou três vezes na semana. Tenho um apartamento na cidade onde fico com a minha esposa e o meu cachorro, mas boa parte da semana costumo trabalhar do litoral”, afirma o CEO que vive em São Sebastião, litoral paulista.
Como inovar sendo enorme?
Para manter o espírito inovador sendo enorme, a Heineken criou, sob o comando de Giamellaro, a Heineken Spin, que possui quatro unidades de negócio: circularidade de embalagens, agricultura regenerativa, transição energética e marcas de impacto.
“Sabemos que no nosso negócio, temos que ser bom naquilo que dá para ser bom. Então, a sabemos fazer cerveja bem e sabemos fazer marca bem”, diz o CEO que afirma que agora a companhia está apostando muito forte em sustentabilidade. “Esse será o nosso diferencial”.
Entre as iniciativas está uma recicladora de vidro que conta com a parceria da Ambipar (companhia de gestão ambiental) e um aporte inicial da Heineken de R$ 150 milhões. A outra unidade de negócio investiu em uma distribuidora de energia, que segundo o executivo, coloca a Heineken hoje como a empresa que possui o maior número de contratos de energia verde. “Temos 40 mil contratos com o grupo Ultra e a Raízen”, diz o CEO.
Na parte de inovação do produto, a companhia apostou, além de novas categorias de cervejas, produtos não alcoólicos como um energético, água em lata, e o Clash’D, que é um refrigerante feito à base de malte, mas sem álcool.
“Sabemos que, para inovar, é preciso criar espaços que permitam começar pequeno. Foi por isso que lançamos a Heineken Spin, que nos permite testar e errar antes de escalar,” diz o CEO.
A companhia segue competitiva na divulgação da marca por meio do patrocínio de grandes eventos. No caso da marca Heineken, a empresa patrocina a Champions League, o Rock in Rio, o The Town e a Fórmula 1. “Vamos continuar investindo nessas plataformas para os próximos anos”, diz o CEO que reforça o patrocínio da marca Amstel na Libertadores.
Na área tecnológica, a companhia também tem feito investimentos significativos em inteligência artificial para otimizar operações e melhorar a experiência dos funcionários. “Hoje, usamos IA para prever a cor da cerveja, otimizar o uso de insumos e até identificar padrões que podem indicar maior turnover entre os funcionários,” conta o CEO.
Nos últimos cinco anos, a equipe de tecnologia no Brasil cresceu de 40 para mais de 150 pessoas, refletindo a importância crescente do digital no planejamento estratégico da empresa. Além disso, a plataforma Heishop, que digitaliza pedidos diretos com clientes, já é responsável por quase 80% das vendas realizadas nos centros de distribuição.
Os resultados no mercado brasileiro
Em 2023, a receita da Heineken, segundo o balanço global, chegou a 30,3 bilhões de euros, 5,7% maior na comparação anual. O lucro, porém, caiu 14%, para 2,3 bilhões de euros, abaixo da previsão de analistas. Apesar do desempenho global não ter atendido as expectativas do mercado, quando o foco é Brasil, o balanço é positivo. Ao lado do México e da China, o Brasil foi um dos melhores em volumes e receita para a companhia. Segundo o CEO do Brasil, um dos motivos foi apostar na estratégia de premiumização do portfólio e no controle de custos.
“Conseguimos explorar grandes oportunidades, especialmente em produtos premium e retornáveis. Além disso, nosso foco em inovação e eficiência nos diferencia em um mercado tão competitivo”, afirma o CEO.
A marca lidera o segmento de cervejas premium no país, com 50% das vendas desse mercado, e se consolidou como referência também no segmento de super premium e economy. “Por conta da Heineken, o brasileiro hoje bebe uma cerveja de melhor qualidade. Hoje de cada 10 cervejas premium vendidas no Brasil, 5 são Heineken. Isso é motivo de muito orgulho para mim e para meu time,” afirma.
Para Giamellaro, o diferencial da Heineken está no foco no "como" e não apenas no "o quê". “Queremos crescer, mas sem perder a essência que nos diferencia. O nosso foco sempre será nas pessoas e na forma como conduzimos o negócio, porque isso é o que verdadeiramente importa”.