Turismo volta diferente, após retração e crescimento, diz Lummertz
Em entrevista à Bússola, secretário estadual de Turismo, faz um balanço de sua gestão e fala sobre os desafios da retomada após a pandemia
Bússola
Publicado em 30 de novembro de 2022 às 19h30.
Em entrevista exclusiva à Bússola, Vinícius Lummertz, secretário estadual de Turismo e Viagens, conta como teve que lidar com o setor turístico em tempos de pandemia, e sobre novos programas que deram protagonismo para a área.
Os últimos quatro anos foram, de fato, desafiadores para uma série de áreas essenciais para o funcionamento do Brasil. Com a pandemia, uma das mais afetadas, por razões óbvias, foi a do Turismo, que se viu, pela primeira vez na história recente, ficar praticamente um ano sem poder realizar qualquer atividade, devido à quarentena e os agravantes causados pelo coronavírus.
Ainda assim, o Estado de São Paulo passou por uma evolução significativa nessa área. Duas principais, em particular. O aumento no orçamento da Secretaria de Turismo e Viagens – que avançou em 64,28%, para R$ 527 milhões anuais, e a diminuição da dívida com empresas conveniadas – que foi reduzida em 79,82%, para R$ 854 milhões. Este reequilíbrio nas contas foi crucial para que novos programas e parceiras pudessem ser praticados para o desenvolvimento amplo do setor.
Além disso, ao fim de sua gestão à frente da Secretaria Estadual de Turismo e Viagens, Vinícius Lummertz, que também foi ex-ministro do Turismo (2018), conta que deixa um legado substancial para a área, de forma a fazer com o setor tenha condições de se planejar para os próximos dez anos, com possibilidades para aumentar sua capitalização, fluxo de turistas no estado de maneira sustentável.
Bússola: Quais foram os desafios de fomentar o turismo em uma gestão que teve o percalço da pandemia?
Vinícius Lummertz: Sem dúvida, o período da pandemia foi um momento extremamente desafiador, e inesperado. Diante da prioridade absoluta de preservar vidas e viabilizar a vacina, o setor de turismo sofreu muito com a queda de movimento e redução de atividade no período, como aconteceu em todo o mundo. Vale ressaltar que aqui em São Paulo tivemos restrições, mas em nenhum momento um lockdown. Isso se reflete, inclusive, nos números gerais da economia no ano de 2020.
Mas, inegavelmente, tivemos essa forte retração no turismo, de movimento e faturamento, que nos levou a um inédito PIB do turismo negativo em São Paulo de -19,8%, em 2020. Direcionamos nosso programa de crédito turístico em parceria com bancos públicos para auxílio às empresas, que possibilitou a tomada de crédito na ordem de R$ 2 bilhões durante a pandemia, ajudando a salvar o setor e muitos negócios voltados ao turismo. Da mesma forma, fomos pioneiros em estimular negociações trabalhistas para salvar centenas de milhares de empregos.
Conseguimos nos recuperar gradualmente, e vamos encerrar o ano de 2022 com um crescimento de 11% sobre o ano anterior, além da criação de 85 mil vagas diretas de emprego, o que são números bem acima do que havíamos projetado. O turismo volta, mas volta diferente, em uma nova fase.
Bússola: O que o senhor destaca de realizações da Secretaria de Turismo nestes últimos quatro anos?
Vinícius Lummertz: Em primeiro lugar quero destacar o apoio irrestrito dos governadores João Doria e Rodrigo Garcia à área de turismo, o apoio da Assembleia Legislativa, as parcerias com os prefeitos dos municípios turísticos, com outras secretarias do governo e o protagonismo do trade turístico.
Foi um grande trabalho que tratamos de catalisar. Um dos resultados é que São Paulo entra na rota turística comercial e de lazer no mundo, uma posição que agora precisará manter e expandir. Quando assumimos a gestão, encontramos o estado de São Paulo amplamente reconhecido como destino de turismo de negócios, mas percebido como pouco atrativo para o turismo de lazer. O que fizemos? Transformamos o Estado de forma que ele fosse mais visto, tanto por seus moradores, quanto por quem vem de fora daqui e do país.
Partimos de um plano estratégico-tático, o Plano 20-30, de forma a tratar de três questões fundamentais: da promoção, ao lançarmos o programa SP pra Todos, com uma exposição inédita em nível internacional, onde tivemos o segundo maior crescimento em buscas no início de 2020 no Google.
Um segundo aspecto importante foi a mudança no ambiente de negócios, a partir de um programa de crédito turístico orientado que chegará a R$ 5 bilhões disponibilizados no total, da legislação de Distritos Turísticos, que cria condições para desenvolver áreas turísticas de alto potencial, com parques temáticos, resorts, como Serra Azul, Olímpia e Andradina; da atenção a nossos parques naturais, com concessões e permissões de parques, e uma marca para os parques de São Paulo. Também criamos rotas cênicas para São Paulo, que estão identificadas e mapeadas e tornamos as rotas gastronômicas uma realidade, com centenas de restaurantes, lojas e empreendedores participando.
Uma outra iniciativa de impacto estruturante é o acordo para redução da alíquota de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços) sobre o querosene de aviação, que trouxe 700 novas frequências aéreas para São Paulo. A isso, soma-se a concessão de 22 aeroportos no interior do Estado, que estão recebendo investimentos. Criamos e implementamos estruturas náuticas em nossos rios e praias, para começar a dar escala a um setor de grande importância e encadeamento, o setor náutico.
Além disso, ampliamos o número de parcerias firmando 1.055 novos convênios, com a liberação recorde de R$ 661 milhões, que permitiu a conclusão de mais de 800 obras turísticas em todo o estado.
Bússola: Que legados acredita que deixará para o Estado?
Vinícius Lummertz: O principal legado, nós acreditamos, foi ter ajudado a trazer o turismo para o centro da pauta econômica do Estado. Além de São Paulo ter se firmado nacionalmente e um pouco internacionalmente como destino turístico de negócios, lazer, natureza, a questão dos investimentos e do desenvolvimento planejado passou a ser uma pauta importante: desenvolvemos portfólio de áreas disponíveis para investimentos em turismo, que hoje disponibiliza mais de 150 áreas no turinvestsp.com, inclusive com muitos investimentos já realizados, participamos de road shows internacionais mostrando as condições para investir no turismo de São Paulo. É necessário ampliar a oferta de atrativos, resorts, destinos, pois São Paulo vive o fenômeno de ter mais demanda do que oferta de turismo. Isso é uma oportunidade única. E esse caminho acredito que ajudamos a abrir, é um legado a ser trilhado.
Também procuramos dotar a Secretaria de maior inteligência técnica a partir de parcerias com a InvestSP e a FIA, além de desenvolvermos o CIET – Centro de Inteligência da Economia do Turismo, que hoje elabora previsões econômicas e estimativas do PIB do turismo, de vários índices de atividade, além de ajudar os municípios turísticos a elaborar as suas próprias projeções e dados.
Na infraestrutura turística, além de ter aumentado os repasses aos municípios turísticos, vamos possibilitar que além de obras possam ser contratados outros serviços e toda uma estrutura de apoio para que os municípios possam também planejar e desenvolver outros aspectos do turismo.
Bússola: Como o senhor projeta o turismo em São Paulo para os próximos anos?
Vinícius Lummertz: Nossas projeções indicam que a economia do turismo pode chegar a R$ 330 bilhões até 2030, um crescimento de quase 50% em relação a hoje. Isso se deve ao grande potencial do turismo brasileiro, e à situação de termos ampla demanda em São Paulo. Para isso, é importante trilhar com intensidade as estratégias de promoção, apoio ao ambiente de negócios e infraestrutura que se iniciaram.
Outro aspecto importante é o olhar para o futuro e para o emprego: esse potencial de crescimento significa muitas oportunidades de trabalho e empreendedorismo, mas é preciso prepararmos os recursos humanos de hoje e do futuro. Para isso, implantamos matérias eletivas de turismo na grade curricular das escolas públicas do Estado. Somente no primeiro ano desta implantação, 180 mil estudantes optaram por esta escolha.
Ainda no campo da educação, serão oferecidas bolsas de mestrado e doutorado em parceria com o Centro Paula Souza, Instituto Federal e outros. Em 2019, assinamos um Termo de Cooperação com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para poder captar um recurso internacional de US$ 300 milhões para promoção, comunicação e infraestrutura turística.
Bússola: E como o senhor projeta o turismo do futuro, em nível nacional?
Vinícius Lummertz: Vejo, inegavelmente, com muito otimismo e um pouco de preocupação. Otimismo, porque o Brasil é deliberadamente um dos grandes potenciais, senão o grande potencial de crescimento do turismo no mundo, reconhecido internacionalmente por isso. Se um em cada três novos empregos no mundo até 2032 será criado pelo turismo, quantos desses empregos podem ser brasileiros?
Por outro lado, temos uma situação de ambiente de negócios, regulatória e de incentivo a investimentos ainda muito difícil. O turismo brasileiro ainda não está inserido na cadeia global do turismo, como o agronegócio brasileiro está no centro da cadeia global.
Para tornar esse potencial uma realidade, uma estratégia concatenada em várias verticais: promoção nacional e internacional contínua e em padrões de excelência, melhores condições competitivas e de preço para a conectividade integrada (aérea, rodoviária e outros), melhorias de infraestrutura nos destinos, investimentos em recursos humanos, um modelo para atrair investimentos em distritos ou áreas especiais de forma sustentável e organizada, crédito assistido em grande escala e com garantias.
O turismo brasileiro, uma vez com melhores condições sistêmicas, e integrado à cadeia global do turismo, deverá dar um salto espetacular, com muitas oportunidades, empregos e desenvolvimento de modelos de negócio e organização empresarial que temos no mundo e que aqui estão apenas engatinhando.
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