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Fintechs abrem as portas da inclusão no mercado de aluguel

Startups usam inteligência artificial para vencer barreiras comuns de entrada no mercado imobiliário

Inclusão dos sem moradia é desafio histórico (Pexels/Fotos Públicas)

Inclusão dos sem moradia é desafio histórico (Pexels/Fotos Públicas)

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Publicado em 14 de junho de 2022 às 16h30.

Por Carolina Rezemini* 

A moradia é mais que um direito constitucional. Mas, na realidade do cotidiano, muitas condições acabam por deturpar o cumprimento dessa garantia básica do ser humano.  

Nem todo mundo possui a capacidade financeira de adquirir uma casa própria. O aluguel, então, torna-se uma opção. Porém, o mercado de locação tradicionalmente estabeleceu obstáculos que vão além da disponibilidade de capital para cumprir com o fluxo das mensalidades. Muita gente não consegue nem vencer a etapa da assinatura do contrato, devido à impossibilidade de arcar com as garantias de aluguel estabelecidas por locadores e imobiliárias.  

A figura do fiador é um clássico nesse processo. Mas, como nem sempre é fácil encontrar alguém disposto a assumir esse papel, o mercado desenvolveu mecanismos para substituí-lo. Um deles é o depósito-caução, que exige ter uma reserva de geralmente três aluguéis, a serem depositados pelo inquilino no início do acordo para eventual uso em caso de inadimplência. Outra modalidade de garantia é o seguro-fiança, tipo de apólice de seguro que também fica a cargo do locatário e equivale, em média, a um valor entre um aluguel e meio e dois aluguéis por ano. 

Existe ainda um outro componente no conjunto dos entraves para conseguir alugar um imóvel. Ele diz respeito à aprovação do perfil do candidato a inquilino. Muitas vezes o problema dessa pessoa vai além do de não contar com um fiador: o impeditivo passa também pela ausência de um histórico no mercado financeiro e pela dificuldade de comprovação de renda, situação bastante comum entre trabalhadores informais e desbancarizados. 

De acordo com dados do IBGE, o Brasil tem 38 milhões de trabalhadores sem vínculo formal. Outro contingente cuja dimensão se destaca no país é o dos desbancarizados, que somam 34 milhões, segundo dados do Instituto Locomotiva referentes a janeiro de 2021.  

Tanto uns quanto outros muitas vezes se encontram barrados pelos mecanismos de análise cadastral das imobiliárias tradicionais na hora de buscar uma oferta de aluguel, justamente pela falta de lastro no sistema financeiro. Como alternativa, podem acabar avolumando a quantidade de locações informais no país, que configuram um território de incerteza e insegurança para todas as partes envolvidas nesses negócios.  

Gestão do risco imobiliário 

Mas já há quem olhe para esse cenário de exclusões e o enxergue não somente como imbróglio, mas também como oportunidade. As fintechs que têm aportado no Brasil já abriram os olhos para essa realidade até então pouco considerada pelo mercado. E buscaram caminhos para viabilizar a inserção desse público de pouco ou nenhum histórico financeiro favorável no campo de negociações por um lugar alugado para morar. 

Alcançar a inclusão dessas pessoas, porém, demanda uma mudança de paradigmas. E a compreensão de que as avaliações de perfil precisam lançar mão de variáveis que vão além dos números de holerites e contas bancárias. Não é por não possuir esse lastro que alguém necessariamente se tornará inadimplente em relação ao pagamento do aluguel.  

Uma prospecção comportamental abrangente pode ser bastante eficaz para determinar tendências de como um indivíduo vai proceder no momento de quitar suas obrigações financeiras. Afinal, existem paralelismos nas atitudes humanas. E é deles que se valem algoritmos de análise inteligente de dados. Eles permitem estabelecer parâmetros de risco a partir de padrões de ação que não necessariamente estão relacionados à seara das finanças. O modo como uma pessoa utiliza seu smartphone, por exemplo, pode dar indícios bastante confiáveis a respeito de sua pontualidade nos pagamentos de débitos. 

É desse tipo de aplicação de IA que se valem fintechs dispostas a atuar no mercado imobiliário sob uma perspectiva muito mais inclusiva. E que trazem novos modelos de administração do negócio de locação. Um deles é o de operar como um gestor de risco para imobiliárias e locadores, assegurando o repasse mensal dos aluguéis mesmo que os inquilinos deixem de cumprir com o compromisso em determinado mês. 

Ao assumir a gestão desse fluxo, a fintech se adapta às oscilações de renda próprias de um trabalhador informal, que, em geral, não possui um ganho mensal uniforme. Se, em um período, as contas orçamentárias não fecham para ele, isso pode ser compensado no mês seguinte, algo que se torna viável também para a lógica das quitações dos aluguéis desde que haja um intermediário — a fintech, no caso — gerenciando essas variações e blindando, em relação a elas, os donos de imóvel e as imobiliárias.  

Para a própria fintech, a blindagem contra a inadimplência é a inteligência na análise de risco dos locatários. A seu favor, também, há ainda outro dado a ser contabilizado, este de cunho mais geral: de acordo com uma pesquisa da empresa de recuperação de crédito Intervalor, divulgada no final do ano passado, quando falta dinheiro, a prioridade do brasileiro é pagar o aluguel. Dos entrevistados para o levantamento, 31,5% disseram ser essa a despesa mais importante do cotidiano. 

A entrada dessas novas empresas provoca uma mudança sensível de chave no mercado de locação. E configura um meio inovador de combate ao déficit habitacional. Espera-se que tais processos de mensuração de risco sejam cada vez mais adotados não apenas nesse segmento da economia, mas também em outros. Oportunidades para avançar em inclusão é que não faltam; criatividade e tecnologia tampouco. 

*Carolina Rezemini é diretora regional de Vendas para a América Latina da Credolab  

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