A inclusão na sua empresa pode começar com você; se não há espaço, mude
Apesar de haver muito caminho pela frente, pequenos avanços estão acontecendo e devemos nos inspirar neles para seguir motivados
Bússola
Publicado em 6 de janeiro de 2023 às 15h30.
Última atualização em 6 de janeiro de 2023 às 15h37.
Durante muitos anos, sempre que eu entrava em uma sala de reunião, tinha o hábito de contar quantas mulheres estavam ali. Geralmente eu era a única. Com quase 20 anos no mundo corporativo, tive o privilégio de trabalhar em vários países na Europa e América, além da Austrália, ocupando diversas posições. Hoje vivo em Atlanta, nos Estados Unidos, liderando as operações de marketing para a América Latina da Manhattan Associates, uma das principais empresas do mundo em soluções de tecnologia para a cadeia de suprimentos e comércio omnicanal. Este ano, recebi o convite para ser embaixadora da Diversidade & Inclusão para o time, o que me trouxe não somente novas responsabilidades mas também diversos aprendizados.
Um dos principais deles é o entendimento de que essa é uma pauta que não pode partir somente do RH e das Comunicações Corporativas. Eles têm, sim, um papel importante no processo de aumentar a diversidade e promover a inclusão, mas na minha opinião as iniciativas mais valiosas partem de dentro dos times. Vejo o movimento corporativo pelo qual estamos passando, e vejo o movimento que estamos fazendo dentro do nosso time. O fato de a nossa líder direta se importar com o assunto faz com que a gente se sinta acolhido e tenha espaço para viver a diversidade e a inclusão da forma mais genuína possível. Não estamos falando de slides com pessoas que parecem diferentes e de um website bonito. Sentimos a inclusão de forma real no nosso dia a dia.
Além de aprender com experiências de voluntariado, debates e conversas temáticas do nosso time, outro projeto também contribuiu para o meu crescimento em 2022. Como host da série especial sobre Diversidade & Inclusão do podcast Siga o líder, tive a oportunidade de conversar com profissionais de grandes empresas sobre o assunto e me inspirar em suas histórias. Rafaela Bartholomeu, Chief Operations Officer da L’Occitane, por exemplo, trouxe sua experiência sobre os desafios das mulheres na Supply Chain. Rafaela nasceu no interior de São Paulo e hoje mora em Nova York, é mãe de dois meninos, e está entre os executivos mais importantes de uma das maiores empresas de cosméticos e perfumaria do mundo. Para ela, ser autêntica e estar em um ambiente de genuína flexibilidade e autenticidade é um dos primeiros passos para conquistar um lugar no mundo corporativo. Um ambiente no qual ser você mesma não é um problema, ajuda a acolher e incluir a todos, sobretudo às mulheres.
Como líder no setor, Rafaela está em uma posição que geralmente não pertence às mulheres. Ela também confessou que, assim como eu, por muito tempo, contava quantos homens e quantas mulheres estavam presentes em suas reuniões. Como muitas outras áreas, as posições de liderança da cadeia de suprimentos têm sido tradicionalmente ocupadas por homens. E embora elas tenham ganhado terreno na área (41% da força de trabalho em 2021, ante 39% no ano anterior), o cenário entre as posições de gestão está longe de ser o ideal. Em 2021, as mulheres representavam apenas 15% dos cargos de liderança executiva na cadeia de suprimentos, uma queda ante os 17% do ano anterior, segundo o Gartner. Alguns apontam para a pandemia como justificativa pela queda — mas mesmo 17% não era um número digno de comemoração. Rafaela fala de como seus desafios por ser mulher hoje guiam a forma como educa seus filhos. Mais uma prova de que está tudo ligado: o mundo corporativo e a "vida real".
Ainda no podcast, também tive a oportunidade de conhecer a história de como a Via, uma das maiores empresas do varejo brasileiro, implementou um projeto para aumentar a diversidade entre os líderes de logística. Fernando Gasparini, diretor-executivo de Supply Chain, e Amanda Carvalho Ferreira, gerente de Diversidade e Inclusão, falaram sobre como nasceu o Projeto Lapidar e o impacto dele na vida dos colaboradores. Ele começou em 2021, a partir da constatação de que a empresa tinha 53,9% dos funcionários da área de logística autodeclarados pretos ou pardos, mas eles eram apenas 22% entre os líderes no setor.
O Lapidar proporciona treinamento e coaching para essas pessoas, trazendo as habilidades necessárias para que elas possam seguir avançando em suas carreiras. Para mim, o Projeto Lapidar, iniciativa do próprio Gasparini, é a maior prova de que D&I não depende exclusivamente do RH e representa a esperança de que todos podemos melhorar o mundo com o nosso trabalho, mesmo num ambiente que envolve competitividade e almeja o lucro. A ideia do Gasparini virou realidade e está impactando diretamente a vida de muitas pessoas, até mesmo em outras áreas fora da Supply Chain.
Além dos exemplos que aprendi em nosso podcast, tenho lido bastante sobre o assunto e me aproximado de outras empresas para conhecer iniciativas que têm mudado a forma de trabalhar a inclusão. Um projeto específico do Google, parceiro global estratégico da Manhattan, me ensinou o quanto é importante repensar a diversidade desde o recrutamento. Desafiar os padrões do que deveras buscamos em um "profissional qualificado". Afinal, o que é um profissional qualificado? Quais são as verdadeiras habilidades diretamente relacionadas ao seu sucesso no mundo corporativo? A gerente de produto e inclusão, Melina López, fala apaixonadamente sobre o programa Next Step em um dos episódios de seu podcast "Ouça mais alto".
O Next Step oferece estágio para estudantes negros de qualquer curso, sem requisito de inglês avançado, e tem o objetivo de levar mais equidade ao processo de seleção e formar talentos. Eles oferecem aulas de idioma e outros treinamentos para os estagiários. Afinal de contas, o que é mais importante? Uma pessoa com garra e habilidades para vencer desafios, ou que fale outros idiomas? Ok, por que não os dois, mas por que sim começar a seleção eliminando os que não falam inglês? Por que assumir que só quem teve experiência no exterior pode trazer isso para sua empresa? Achei este programa incrível e mais um exemplo real do enorme papel que as empresas têm na sociedade. Elas podem sim ser a maior plataforma para a mudança, citando Marc Benioff.
Todos esses exemplos mostram que a D&I acontece em vários níveis com diferentes escalas de complexidade: desde a seleção de colaboradores, o empoderamento deles dentro do time e o espaço que eles têm para crescer na empresa simplesmente por proporcionar um ambiente com mais autenticidade. E não estamos falando apenas de diversidade de gênero ou racial, esses são apenas alguns casos de sucesso para nossa inspiração.
A lição que tiro deste meu primeiro ano como embaixadora da Diversidade & Inclusão é que, apesar de haver muito caminho pela frente, pequenos avanços estão acontecendo e devemos nos inspirar neles para seguir motivados e constantemente colocando a barra mais alta. Participar deste processo de D&I é menos complexo do que possa parecer.
Dependendo de onde você e sua empresa estão em sua jornada, começar aprendendo sobre o Projeto Lapidar, ou o Programa Next Step pode ser uma boa alavanca. Mas se sua organização ainda não está pronta para isso, que tal começar sua jornada simplesmente com autenticidade? Muitas empresas já entenderam que dar espaço para que os funcionários possam ser eles mesmos é um excelente passo, que no final das contas acaba trazendo não somente um ambiente de trabalho mais acolhedor e inclusivo, mas resultados melhores para a companhia. Quantas boas ideias são perdidas todos os dias porque inúmeros funcionários não sentem que podem ser ouvidos… Não seja parte dessa turma e ajude outras pessoas a saírem dela!
Como dizemos aqui nos Estados Unidos, deixo para vocês meus "dois centavos" de contribuição e um resumo do que penso sobre este assunto: a inclusão pode começar com sugestões que você leve para seu RH ou simplesmente promovendo um ambiente de autenticidade no seu time. Se você não conseguir, busque então um lugar onde você possa ser quem você é. Mude de time, mude de empresa, mude de mercado, até encontrar seu espaço. Você será mais feliz todos os dias, a empresa vai tirar muito mais valor da sua presença, e a inclusão vai começar a acontecer à sua volta de forma orgânica, de dentro dos times para fora.
*Rachel Filipov é head de marketing para a América Latina e embaixadora da Diversidade & Inclusão da Manhattan Associates
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