Tentativa de afastar Gilmar Mendes de recurso incomoda Supremo
Ministros da Corte consideraram trecho do despacho de Bretas uma provocação
Estadão Conteúdo
Publicado em 22 de março de 2019 às 08h21.
Brasília — A tentativa do juiz federal Marcelo Bretas de evitar que o ministro Gilmar Mendes , do Supremo Tribunal Federal (STF), seja o relator de possíveis recursos contra a prisão do ex-presidente Michel Temer incomodou integrantes da Corte. Em sua decisão, Bretas argumenta que o caso não tem relação com a Operação Calicute, que prendeu o ex-governador do Rio Sérgio Cabral e que tem Mendes como relator no Supremo.
O alerta foi interpretado como uma espécie de "vacina". Gilmar Mendes já concedeu habeas corpus a diversos ex-integrantes do governo fluminense que foram alvo da investigação ou de ações derivadas. Ministros da Corte ouvidos pelo Estadão/Broadcast em caráter reservado afirmam que a definição sobre o responsável por julgar uma eventual contestação da prisão de Temer no STF é o próprio tribunal - em última instância, o presidente da Corte, ministro Dias Toffoli . E consideraram esse trecho do despacho de Bretas uma provocação.
"Apenas para evitar confusões a respeito da competência para eventual impugnação desta decisão, repito que estes autos guardam relação de conexão e continência com a ação penal derivada da denominada operação Radioatividade e seus vários desdobramentos", afirma Bretas em seu despacho. "Não há relação entre este procedimento e as ações penais derivadas das denominadas operações Saqueador e Calicute e seus desdobramentos", completou o magistrado.
No Supremo, quando um processo é protocolado, a secretaria judiciária verifica se algum ministro é prevento para julgar o caso, ou seja, se alguma outra ação relacionada já é de competência de um dos 11 integrantes da Corte. Se ninguém se encaixar no critério, é determinada distribuição por sorteio eletrônico. Se o ministro escolhido como relator entende que não é prevento para julgar o processo, ou se considera que um colega deveria ser o relator, a ação é enviada para a presidência da Corte definir a relatoria.
O mesmo acontece se alguém contestar o fato de um ministro ter sido selecionado para relatar o processo. Neste caso, a palavra final será do presidente.
Recado
Na decisão, Bretas ainda mandou um recado ao STF, que na semana passada abriu por conta própria inquérito para apurar ameaças e críticas a ministros da Corte e divulgação de fake news. Antes de entrar no mérito, o juiz afirma que "nenhuma investigação deve ser iniciada pela autoridade judiciária", em respeito à Constituição e ao princípio da inércia - segundo o qual o magistrado não deve agir se não for provocado.
"Não é permitido aos magistrados afirmarem, ab initio (desde o início), quais crimes merecem ser investigados e a respeito dos quais haveria elementos probatórios mínimos a justificar a atuação ministerial e/ou policial", escreveu. Bretas afirma ainda que "esta atividade judicial espontânea" é própria de sistema inquisitoriais e "totalmente vedada a qualquer membro do Judiciário brasileiro". As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.