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Futuro do audiovisual brasileiro está em cheque, mas potencial não falta

Congelamento de verbas da Ancine traz incertezas ao setor, que multiplicou sua produção nos últimos anos

Que horas ela volta? (Que horas ela volta?/Divulgação)

Que horas ela volta? (Que horas ela volta?/Divulgação)

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Clara Cerioni

Publicado em 28 de abril de 2019 às 12h00.

Última atualização em 29 de abril de 2019 às 13h51.

São Paulo — O futuro das produções audiovisuais no Brasil está em cheque. No último dia 18, a Ancine (Agência Nacional do Cinema) suspendeu todos os repasses de recursos para que os conteúdos continuem rodando após um pedido do Tribunal de Contas da União (TCU), que tem questionado a forma de prestação de contas da agência.

A decisão da Ancine repercutiu negativamente entre os envolvidos no segmento. A diretora-presidente do Spcine, agência de cinema e audiovisual do município de São Paulo, Laís Bodanzky, lançou uma carta aberta em defesa do audiovisual brasileiro

"A Spcine manifesta seu repúdio ao que considera o desmonte da política audiovisual", escreveu a diretora de Bicho de Sete Cabeças.

Uma produtora com conhecimento no assunto, que preferiu não se identificar, afirma que essa situação é uma resposta à falta de articulação política por parte dos representantes da Ancine.

"Já faz mais de cinco anos que o tribunal pede para que os trabalhos sejam suspensos, mas as gestões anteriores sempre reverteram essa decisão por meio de acordos, porque sabem da importância de manter o setor ativo", afirma a produtora.

Ela lembra que os repasses foram cancelados no mesmo dia que quatro filmes nacionais foram selecionados para o Festival de Cannes, que acontece desde 1946 e é uma das principais vitrines do cinema mundial.

Em nota enviada à reportagem, a Ancine afirma que os problemas de hoje com o TCU são "problemas gerados em gestões anteriores".

"O passivo de prestação de contas, acumulado ao longo dos últimos dez anos, e o sistema Ancine + Simples, condenado pelo TCU, são problemas gerados em gestões anteriores. A gestão atual, iniciada em janeiro de 2018, sabe da importância de atender às regras dos órgãos de controle e está desde o ano passado em contato próximo com o TCU mostrando a importância da atividade e mantendo a operação em andamento. Entre as ações tomadas pela gestão atual estão o fim da utilização do sistema Ancine + Simples e a criação de um plano de ação para atender às exigências do TCU", diz a nota.

Apesar das dificuldades, profissionais do cinema brasileiro ouvidos por EXAME estão confiantes no futuro do setor e se espelham em exemplos de fora e no potencial econômico do cinema para convencer o governo da importância de se investir nessa área.

"No início do século XX, os Estados Unidos reconstruíram sua economia com o apoio fundamental de Hollywood e isso foi essencial para estabelecer a identidade cultural dos americanos, que hoje é fortíssima. O mesmo podemos repetir no Brasil", explica Diane Maia, da produtora Mar Filmes e uma das representantes da Frente dos Produtores do Audiovisual.

Na mesma lógica, outra inspiração para o Brasil pode ser a Coreia do Sul, que no começo desta década elaborou um plano de ação para internacionalizar a sua cultura pop, com o K-pop e o K-drama (novelas de TV sul coreanas).

Hoje, o produto cultural do país asiático é o mais valioso do mundo e gerou cerca de 18 bilhões de dólares só no ano passado.

O Brasil aumentou os investimentos nos últimos anos e houve uma alta no número de títulos lançados, o que facilita a manutenção de todo um ecossistema de produção.

Em 2017, de acordo com Observatório Brasileiro do Cinema e do Audiovisual, foram produzidos 154 filmes nacionais, contra 89 produções brasileiras de 2009.

"Com o ritmo cada vez mais acelerado, todas os fornecedores envolvidos na produção de um filme são valorizados, desde as produtoras até a distribuidora. São milhares de players envolvidos", diz Silvia Cruz idealizadora e diretora da Vitrine Filmes, empresa de distribuição de filmes nacionais.

Um mapeamento da empresa Motion Picture Association – América Latina (MPA-AL), de 2016, mostra que o setor injeta 23 bilhões de reais no país por ano e emprega, direta e indiretamente, mais de 495 mil pessoas.

O diretor da Ancine, Christian Castro, afirmou durante o Rio2C, maior evento de audiovisual da América Latina que aconteceu na semana passada no Rio de Janeiro, que a partir desta semana os recursos já serão normalizados.

Segundo ele, a decisão de paralisar os repasses foi tomada para que os servidores da Ancine não fossem responsabilizados juridicamente no futuro pelo TCU.

"A Ancine é de 2001, então está hoje em sua pior fase da vida: a adolescência. Ela está se adaptando e se adequando para conseguir respeitar as normas desse setor que, a cada dia, cresce e se transforma mais", diz a produtora Carol Kotscho, que também é representante da Associação de Roteiristas do Brasil.

Ela, junto com a produtora Diane Maia, estavam presentes no Rio2C e afirmam que durante o evento uma representante do BNDES participou de uma mesa para apresentar os projetos de investimento no audiovisual brasileiro. "Eles têm interesse, mas é nosso papel apresentarmos as inúmeras possibilidades de retorno do setor", conclui Maia.

A expectativa dos produtores é que as emissoras de televisão também se mobilizem para que não haja um colapso do setor no país.

Os canais de TV paga são obrigados, por lei, a dedicar três horas e meia por semana de seu horário nobre a conteúdos nacionais, com pelo menos metade desse material feito por produtoras independentes. Sem os repasses das verbas, contudo, não haverá o que ser transmitido.

*Reportagem atualizada em 29 de abril para acrescentar o posicionamento da Ancine.

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