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Como a agroecologia pode ser uma alternativa para enfrentar a fome e as mudanças climáticas?

Sistema agrícola alternativo ganhou força na década de 70 e é visto como uma das soluções no combate à fome

Modelo proposto adota princípios ecológicos na organização dos sistemas alimentares, abrangendo todas as etapas, desde a produção até o consumo. (Elpidio Costa Junior/Getty Images)

Modelo proposto adota princípios ecológicos na organização dos sistemas alimentares, abrangendo todas as etapas, desde a produção até o consumo. (Elpidio Costa Junior/Getty Images)

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Publicado em 15 de maio de 2024 às 15h00.

Última atualização em 27 de maio de 2024 às 10h44.

O mundo busca alternativas para combater a fome, especialmente em regiões mais vulneráveis, há décadas. Em meados de 1970, surgiu um conceito que tem ganhado força e popularidade atualmente, e que se coloca como uma possível solução para levar mais alimentos para as pessoas: a agroecologia.

O modelo proposto adota princípios ecológicos na organização dos sistemas alimentares, abrangendo todas as etapas, desde a produção até o consumo. Para o membro do Núcleo Executivo da Associação Nacional de Agroecologia, Paulo Petersen, o sistema do agronegócio não está organizado para combater a fome.

"O Brasil se apresenta como o celeiro do mundo, mas temos milhões de pessoas passando fome. Então, não há uma incapacidade de produção, mas sim na forma como os sistemas alimentares atuais estão organizados, que não produzem alimentos para a população, mas para ser "commodity", mercadoria destinada principalmente para a indústria e exportação."

O especialista afirma que a agroecologia entra nesse cenário com uma perspectiva de produzir de forma diversificada e sustentável. Além disso, o sistema distribui uma alimentação diversificada e saudável para a população, e enfrenta o problema da fome com alimentos saudáveis.

A agricultura familiar, modelo de produção cujas propriedades somam 3,9 milhões no Brasil, e ocupa cerca de 80 milhões de hectares, é um modelo baseado na agroecologia. Segundo dados divulgados pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), as fazendas familiares produzem cerca de 35% dos alimentos do mundo.

Segundo o estudo publicado na revista acadêmica Nature Food, intitulado "As colheitas para uso alimentar direto são insuficientes para cumprir o objetivo de segurança alimentar da ONU", os rendimentos das culturas alimentares são baixos em comparação com aqueles destinados à exportação, rações e processamentos.

 A pesquisa também revela que, mantendo-se as tendências globais dos últimos 20 anos, em 2030, as culturas voltadas para exportação e uso industrial representarão aproximadamente 23% e 8% do total de hectares colhidos, respectivamente, com uma tendência de aumento de área. Por outro lado, as culturas destinadas à alimentação, que atualmente ocupam cerca de 37% dos hectares, diminuirão para 29%.

Apesar da tendência de redução das áreas destinadas às culturas alimentares apresentada pelo estudo, uma pesquisa feita pela Secretaria de Inteligência e Relações Estratégicas da Embrapa, mostrou que espaços voltados para culturas de exportação e processamento também podem alimentar o mundo. Segundo o estudo, o mercado brasileiro alimenta mais de 800 milhões de pessoas, e a contribuição do país para o abastecimento mundial deverá aumentar ainda mais nos próximos anos.

Nesse contexto, Peterson reforça a necessidade de políticas públicas voltadas para estes sistemas. "Precisamos de maior investimento público na área de pesquisa, mas sobretudo na área de ensino, porque a formação continua sendo orientada para a reprodução do modelo do agronegócio", finaliza. 

Mudança no consumo e na relação com o alimento

O ano era 2019 e o Brasil tinha acabado de voltar para o mapa da fome. Nessa mesma época, Giovanna Monteiro era estudante de gastronomia na Universidade Federal da Bahia (UFBA) e foi lá que ela teve o primeiro contato com a agroecologia.

Durante um evento, Giovanna se deu conta de que a maioria dos agricultores familiares produziam alimentos com base nos princípios da agroecologia, mas não sabiam nomear essa prática.

"Eu vi que os agricultores familiares faziam desse jeito porque os pais, os avós, tinham passado para eles. Então, foi isso que me atraiu na agroecologia, esse sistema ancestral, que passa de pai para filho", explica a gastróloga.

A partir daí, Giovanna se dedicou mais ao tema e, em 2021, decidiu fazer um intercâmbio voluntário em uma propriedade que adotava sistema agroflorestal, outro braço da agroecologia, em Camaçari, na Bahia. A experiência foi fundamental para que a jovem percebesse como a agroecologia é um sistema rentável e sustentável.

O contato dela com a agroecologia foi na contramão desse movimento. Quanto mais ela conhecia este sistema alimentar, mais ela mudava o seu pensamento sobre os modelos de agricultura, os alimentos e a natureza.

 "Eu consegui entender o tempo da natureza e do alimento. Por isso, mudou a forma como eu pensava a alimentação. Entendi o tempo que a natureza precisa e o meu tempo, porque também sou natureza. A agroecologia me ensinou a respeitar o tempo da natureza no geral".

O sistema alimentar, para Giovanna, também contribui para a ascensão social e econômica de mulheres. Atualmente, ela faz parte do "Despertar Trancoso", um projeto social em Trancoso, na Bahia, dando aulas de gastronomia sustentável para as pessoas naturais da região, em situação de vulnerabilidade e baixa renda.

Ela ensina mulheres de 14 a 64 anos de idade a olhar para o que temos aqui na região e produzir com esses alimentos. “Essas mulheres tiveram seus olhares treinados para consumir industrializados e a ideia é fazer com que elas voltem com os aprendizados ancestrais das suas avós, das suas bisavós, das suas mães, de produzir em casa e gerem renda a partir disso", finaliza.

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