Tecnologia

De WhatsApp a vazamentos de CPF: proteger dados nunca foi tão importante

Nesta quinta comemora-se o Dia Mundial da Privacidade; preocupação das gigantes de tecnologia com a privacidade dos usuários pode estar diretamente ligada a um fator econômico

Dados: especialistas os consideram "o ouro da internet" (Westend61/Getty Images)

Dados: especialistas os consideram "o ouro da internet" (Westend61/Getty Images)

share
Tamires Vitorio

Tamires Vitorio

Publicado em 28 de janeiro de 2021 às 06h00.

O usuário abre uma rede social, navega por diversos perfis, depois decide dar uma pesquisada no Google sobre um produto em especial que viu em uma foto publicada no Instagram – segundos depois, um anúncio do mesmo item aparece em seu feed de notícias do Facebook.

No site de uma varejista, o indivíduo coloca dados pessoais como seu CEP e CPF. Em um aplicativo de relacionamentos, indica sua sexualidade e sua localização para encontrar parceiros mais próximos a ele. Claro que, até aí, nenhum problema grave foi observado – mas a situação muda quando os dados pessoais são compartilhados com terceiros sem o consentimento necessário para isso.

Esta quinta-feira, 28, é marcada como o Dia Internacional de Proteção de Dados Pessoais, ou Dia Mundial da Privacidade, data instituída em dezembro de 2006 para conscientizar usuários sobre a importância de proteger informações online e fazer com que as empresas adotem políticas mais sinceras em relação ao tema.

Logo no início deste ano uma política nova de privacidade que previa o compartilhamento de dados entre o WhatsApp e o Facebook não agradou os usuários e doeu no bolso. O número de downloads do app de mensagens na semana do dia 6 de janeiro caiu 16,5%, de 12,7 milhões na semana anterior para 10,6 milhões, fazendo com que os usuários buscassem aplicativos considerados mais seguros, como o Signal, app cujos downloads subiram 4.200% no mesmo período.

A atualização do WhatsApp, segundo a companhia, não afetaria o compartilhamento de dados de mensagens ou informações sobre o perfil dos usuários, mas sim conversas na versão de negócios do app — quando uma pessoa conversa com uma plataforma de serviços. Na dúvida, a solução encontrada pelo app de mensagens foi adiar os seus planos de 8 de fevereiro para 15 de maio.

Atualmente, o WhatsApp compartilha com o Facebook os números de telefone de seus usuários, a frequência com a qual o aplicativo é aberto, a resolução da tela do dispositivo, a localização estimada da internet, entre outras informações.

A nova política, então, não faria com que o fundador da rede social, Mark Zuckerberg, conseguisse ouvir seus áudios ou ler conversas pessoais – uma vez que estas são criptografadas –, mas sim aumentaria a integração entre o app e os demais do Facebook. Por exemplo: uma calça que estava sendo namorada no WhatsApp poderia aparecer mais tarde em um anúncio do Instagram, ou vice-versa.

A preocupação das gigantes de tecnologia (as conhecidas big techs, como Facebook, Amazon, Apple e Google) com a privacidade dos usuários pode estar diretamente ligada a um fator econômico. As empresas cada vez mais tentam se aventurar em novos nichos que vão além de postagens em feeds, vender livros, fabricar celulares e fazer pesquisas – e tentam a sorte no mercado financeiro, no qual os dados dos usuários precisam de uma camada de proteção ainda maior.

"Com a Libra do Facebook, o Google Play, o Apple Pay, entre outros, você vai vendo que você tem uma tendência a associar esses dados coletados em sua base com o mercado financeiro. Quem tiver os dados dos usuários mais seguros, consegue lançar antes ou expandir melhor os seus serviços", afirma Fabro Steibel, diretor executivo do Instituto de Tecnologia Social.

E problemas de compartilhamentos de dados não são aquietações exclusivas do WhatsApp ou das empresas ligadas ao Facebook. No ano passado, o aplicativo Grindr foi acusado de expor dados dos usuários sem consentimento e nesta semana foi multado em 11,7 milhões de dólares pelo governo da Noruega por violar as informações privadas dos indivíduos.

Segundo a acusação, o app de relacionamento gay mais famoso do mundo teria compartilhado a localização precisa das pessoas, bem como os códigos de rastreamento e o nome utilizado por elas para, ao menos, cinco companhias de anúncios. Uma das companhias que receberam dados do Grindr foi a MoPub, plataforma de anúncios mobile do Twitter, que pode ter compartilhado as informações coletadas com mais de 100 parceiros.

Outro problema quanto a segurança dos dados dos usuários acontece quando eles vazam. Recentemente uma falha gigantesca levou ao vazamento de cerca de 220 milhões de CPFs de brasileiros e 40 milhões de CNPJs.

A provável fonte da informação seria o Serasa Experian, que foi notificado pela Senacon (Secretaria Nacional do Consumidor) e pelo Procon e nega o envolvimento na divulgação dos dados pessoais. Em alguns dos casos, junto aos números, também foram divulgadas fotos, data de nascimento e gênero dos indivíduos em arquivos indexados pelo Google. Um ciclo vicioso – e que parece não ter fim.

A Apple, por sua vez, lançará em breve um recurso chamado App Tracking Transparency, cujo objetivo é avisar os usuários quando um aplicativo não respeitar a sua privacidade.

Quando se tornar vigente, o recurso exigirá que uma notificação seja enviada às pessoas pedindo permissão para que exista um rastreamento "de aplicativos e sites de outras empresas" – e a expectativa é que os usuários não aceitem.

A ferramenta não foi vista com bons olhos por todos. Para Zuckerberg, o impedimento de anúncios personalizados pode afetar diretamente nos negócios do Facebook e pode "tornar a internet mais cara" porque, segundo ele, muitos serviços digitais são gratuitos por conta da publicidade.

Zuckerberg também acredita que, ao tornar essa opção viável, a Apple manterá todos os dados do usuário para si mesma, tirando a possibilidade de outras empresas fazerem o mesmo.

Para Steibel, isso pode ser explicado por uma teoria econômica chamada de "chutar a escada". "A teoria diz que o primeiro que chega em determinado lugar tende a chutar a escada que o levou até lá para evitar que outras tenham acesso aos mesmos dados e características", afirma. "As empresas que estão comentando sobre privacidade estão em dois lados. O primeiro você vê que são empresas que fazem da privacidade um diferencial, esse é o caso do Signal. O segundo tipo são empresas que já têm muito acesso aos dados, e por isso elas têm a forma de mantê-los, como a Apple", diz.

Isso pode ter acontecido na briga com o aplicativo de vídeos chinês TikTok no ano passado. O app, popular entre jovens e adolescentes, esteve sob acusação de compartilhar dados dos usuários com o governo da China e de não proteger os dados de pessoas menores de 13 anos – por tais motivos, o TikTok sofreu ameaças de ser banido nos Estados Unidos. O que não aconteceu, mas deixou o aplicativo em tensão por meses a fio.

Muitos especialistas na área de tecnologia acreditam que os dados são como ouro da internet. Em 2020, o metal precioso fechou em alta, e tudo indica que seu irmão menos físico dará o que falar em 2021.

Onde entra a LGPD

A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) consiste na regulamentação da proteção de dados pessoais e privacidade dos indíviduos nas redes sociais e prevê a adoção de políticas e planos de proteção destes. Com ela, o usuário tem mais controle de para onde vão seus dados quando inseridos em determinados sites, e poderá saber o que é feito com eles.

Ela é baseada do Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR, na sigla em inglês) e, na prática, dá aos consumidores mais controle e às empresas mais responsabilidade na adoção práticas mais transparentes na guarda e uso de dados. O mote da LGPD e da GDPR é o mesmo: as empresas precisam de consentimento específico para o uso de dados pessoais.

O Brasil, como país, nunca baniu aplicativos por compartilhamento de dados ou por outro motivo. Em 2015 o WhatsApp foi alvo de proibições que deveriam acontecer por 48 horas, mas que acabaram durando somente treze.

Outros apps, como o FaceApp, que desde 2017 é acusado de ter uma política invasiva e problemática, não foram proibidos em terras brasileiras apesar das brechas nos termos de segurança. Apesar disso, a Apple e o Google foram multados por veicular aplicativos do tipo em suas plataformas.

Acompanhe tudo sobre:AmazonEmpresas de internetExame HojeFacebookInstagramInternetLGPD – Lei Geral de Proteção de DadosRedes sociaisSerasa ExperianTikTokTwitterVarejoWhatsApp

Mais de Tecnologia

Estúdio processa Elon Musk por uso de imagens de “Blade Runner” em evento da Tesla

CEO da AWS, da Amazon, sugere demissão para quem discordar de retorno presencial

Por que a Anvisa proibiu o "chip da beleza"?

Voo barato? Atualização do Google Flights promete passagens com preços ainda mais baixos