Tecnologia

Butantan fará teste clínico de vacina oral contra hepatite B

Nova vacina deverá ter a mesma eficácia da imunização por injeção, mas é mais barata e fácil de ser aplicada

Hepatite B: um dos desafios para se administrar vacinas por via oral é fazer com que os antígenos (responsáveis pela imunização) cheguem ao sistema imune (Getty Images)

Hepatite B: um dos desafios para se administrar vacinas por via oral é fazer com que os antígenos (responsáveis pela imunização) cheguem ao sistema imune (Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 24 de julho de 2013 às 14h57.

Recife - O Instituto Butantan deverá iniciar, em breve, testes clínicos de uma vacina oral contra hepatite B que promete ter a mesma eficácia da vacina injetável, mas mais fácil de ser aplicada e com custo mais baixo.

O anúncio foi feito por Osvaldo Augusto Brazil Esteves Sant’Anna, pesquisador do Instituto Butantan, durante conferência proferida nesta terça-feira (23/07) na 65ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Recife (PE).

“O protocolo para iniciar os testes clínicos da vacina está sendo preparando. A vacina é importante mundialmente por mudar um paradigma de vacinação”, disse Sant’Anna, à Agência FAPESP.

De acordo com o pesquisador, um dos desafios para se administrar vacinas por via oral é fazer com que os antígenos (responsáveis pela imunização) cheguem ao sistema imune, localizado fundamentalmente no intestino.

A dificuldade ocorre porque é difícil atravessar o suco gástrico – que possui acidez muito alta, além de proteases (enzimas que quebram proteínas) – e chegar incólume ao intestino, a partir de onde será realizada a ação de imunização. Por esse motivo, um dos únicos exemplos de vacina administrada por via oral atualmente no mundo é a Sabin, utilizada para imunizar crianças contra a poliomielite.

Sant’Anna, em colaboração com Marcia Fantini, professora do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), desenvolveu uma forma de encapsular e proteger os antígenos da ação do suco gástrico.

Com o uso de nanotubos de sílica – o segundo elemento mais presente na natureza –, os pesquisadores conseguiram que os antígenos da vacina de hepatite B atravessassem a barreira gástrica e chegassem intactos ao intestino.

“Os nanotubos de sílica têm estrutura parecida com favos de mel, com poros onde é possível inserir e encapsular antígenos”, explicou Sant’Anna, que coordena o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Toxinas – um dos INCTs financiados pela FAPESP e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) no Estado de São Paulo.

Os primeiros testes da vacina com sílica em camundongos foram realizados em 2001 e 2002, com uma vacina recombinante (feita de vírus geneticamente manipulados) contra hepatite B produzida pelo Instituto Butantan.


Inicialmente, a vacina foi aplicada nos animais de forma injetável. Em 2007, foram iniciados testes de administração por via oral em animais com a vacina recombinante contra hepatite B com sílica, formulada e envasada pelo Instituto Butantan e fabricada pela indústria farmacêutica Cristália.

O desenvolvimento da vacina resultou no depósito de uma patente, compartilhada pelo Instituto Butantan e pela Cristália. “Constatamos que a vacina oral com sílica melhorou muito a resposta imunológica dos animais. Ela realmente os imunizou efetivamente contra a hepatite B”, afirmou Sant’Anna.

A previsão é de que os testes com humanos sejam concluídos entre 2018 a 2020, e que a nova vacina chegue ao mercado em um prazo de dez anos. O protocolo para a realização desses testes está sendo montado pelo Instituto Butantan em parceria com a Cristália.

Aplicação em outras vacinas

A tecnologia de produção de vacinas com sílica está sendo testada para outras aplicações. Atualmente, os pesquisadores testam a tecnologia a fim de desenvolver, por exemplo, vacina com intimina – proteína presente em bactérias que colonizam a flora intestinal humana – para combater diarreias infecciosas. “Já sabemos que vacina com intimina funciona bem pela via oral”, disse Sant’Anna.

O grupo de pesquisadores também realizou ensaios preliminares com vacina antirrábica (contra a raiva animal), mas não ainda administrada pela via oral.

Os resultados dos testes indicaram que a sílica potencializa a ação da vacina. Além disso, também diminui a toxicidade de toxinas como a diftérica, utilizada para produzir soro antidiftérico em animais.

“Pelo fato de a sílica encapsular os antígenos, é possível utilizá-la para administrar toxina diftérica em cavalos, por exemplo, e produzir soro antidiftérico”, disse Sant’Anna. “Se a toxina for administrada sem sílica ou outra forma de proteção, o animal morre.”

Já nas vacinas para uso em humanos, uma das vantagens da administração por via oral, de acordo com o pesquisador, é a diminuição do custo econômico e operacional para aplicá-la.

A eliminação da necessidade de usar seringa e agulha reduz significativamente o preço da vacina. Além disso, não é necessário treinar enfermeiros e profissionais de atendimento à saúde para usá-la, como acontece hoje com as vacinas injetáveis. “Basta que os profissionais de saúde tenham consciência de como administrar a vacina via oral, como se faz hoje com a vacina Sabin”, disse Sant’Anna.

O desenvolvimento de vacinas com sílica integrará a linha de pesquisa do Centro de Toxinas, Resposta Imune e Sinalização Celular (CeTICS) – um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) apoiado pela FAPESP –, do qual Sant’Anna é um dos pesquisadores principais.

Um dos projetos que o pesquisador pretende desenvolver no âmbito do CeTICS é o estudo comparativo do dispêndio de energia pelo organismo humano imunizado com vacinas administradas por via oral e com outras formas de aplicação.

“O organismo não dispensa tanta energia ao receber uma vacina pela via oral. Além disso, a boca é a via natural da instalação de uma infecção. É, portanto, o canal propício para ações de vacinação”, destacou.

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