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Negócios que fluem

O Brasil tem um problema histórico de saneamento, e consertar isso é a missão da Aegea. Atuando em um setor que deve receber 116 bilhões de reais em investimentos nos próximos anos, a Melhor do ESG 2023 transforma água em benefício e lucro em impacto positivo

 (Leonardo Yorka/Exame)

(Leonardo Yorka/Exame)

Rodrigo Caetano
Rodrigo Caetano

Editor ESG

Publicado em 14 de junho de 2023 às 06h00.

Última atualização em 14 de junho de 2023 às 09h29.

Radamés Casseb, CEO da Aegea, empresa líder do setor de saneamento no Brasil, sabe de cor a história de seu estado natal, o Acre.

De forma bem-humorada, Casseb conta como o Barão do Rio Branco, com sua reconhecida habilidade diplomática, convenceu peruanos e bolivianos a ceder o território ao Brasil em troca de um valor em dinheiro e da promessa de construção de uma ferrovia até o mar. “No final, nem pagamos nem construímos”, brincava o executivo, enquanto era clicado pelo editor de fotografia Leandro Fonseca, da EXAME — fotos que ilustram esta reportagem e a capa desta edição da revista. 

Mais do que um aficionado pela história, Casseb é um conhecedor da realidade social do país. E sabe que Rio Branco, a capital acreana, tem um dos piores serviços de saneamento do Brasil. Cerca de 40% de seus moradores não recebem água tratada, e quase 80% carecem de coleta de esgoto. Não por acaso, o Acre apresenta uma das piores taxas de mortalidade infantil entre as unidades da federação, perdendo apenas para Roraima e Amapá. Essa é uma realidade que, infelizmente, acomete boa parte da população brasileira. 

Os índices de saneamento brasileiros são, nas palavras de Casseb, medievais. São quase 35 milhões de pessoas sem acesso a água tratada e 100 milhões sem coleta de esgoto. Quase metade do esgoto coletado não é tratada, e apenas 18 entre os 100 maiores municípios tratam mais de 80% de seu esgoto. Ineficiências na distribuição geram perdas superiores a 40%, o equivalente a 7.500 piscinas olímpicas de água tratada por dia. Em um ano, esse desperdício seria suficiente para abastecer uma população de 63 milhões de pessoas.

Márcia Costa, vice-presidente, e Radamés Casseb, CEO, da Aegea: cultura de valorização de pessoas e contratação de executiva aos 58 anos (Leandro Fonseca/Exame)

“O acesso à água está na base da dignidade humana”, afirma Casseb. “A gestão da água, há algum tempo, é tida como a atividade mais importante para a adequação e a manutenção do tecido social. Na pandemia, isso ficou mais claro. A água era a última barreira de defesa, e a falta de saneamento se apresentou como um dos maiores riscos para a humanidade. Nosso corpo é 70% água. O mundo é 90% água.” Reverter esse quadro medieval no Brasil e levar água potável, segura e acessível para toda a população é a razão de existir da Aegea, uma empresa ESG por natureza. 

Essa não é, no entanto, a única razão que faz da Aegea a Melhor do ESG 2023. Ter um propósito é apenas o começo. Dessa visão sobre a atividade econômica se desenvolve uma estratégia de atuação sustentável, que considera o negócio um vetor de bem-estar social, entregando valor para a sociedade tanto quanto para o acionista. Isso é possível porque a Aegea também enxerga os fatores ambientais como parte do negócio e trabalha para que sua presença, assim como no caso social, traga melhorias ao meio ambiente. Não basta preservar, é preciso regenerar. 

(Arte)

No ano passado, a Aegea aderiu ao Programa Floresta Viva, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A empresa está investindo 10 milhões de reais para a recuperação de biomas da Mata Atlântica e do Pantanal. Cerca de 340.000 árvores de espécies nativas serão plantadas. Em parceria com a ONG WWF Brasil, foram iniciados estudos sobre a resiliência hídrica das bacias hidrográficas mais relevantes para a captação de água em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, um passo importante para direcionar os trabalhos de preservação e recuperação dos mananciais. 

A disponibilidade hídrica, para a empresa, está diretamente relacionada às mudanças climáticas. Há um acompanhamento constante de indicadores por meio de uma matriz de risco, que é complementada por estudos geofísicos para detectar novos pontos para a captação de água subterrânea, consultorias meteorológicas e investimentos em infraestrutura de resiliência hídrica. Essa constatação também motiva a companhia a buscar a redução das emissões em suas operações. No ano passado, 97% da energia elétrica consumida veio de fontes renováveis. Com tudo isso, e somado aos 527 bilhões de litros de esgoto tratados pela companhia em 2022, o resultado que se tem é impacto positivo.

Sustentabilidade financeira

A Aegea é, hoje, líder em sanea­mento no Brasil. Com as recentes adições de concessões no Crato e na região metropolitana de Fortaleza, no Ceará, e a aquisição da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), a empresa alcançará mais de 480 cidades, atendendo uma população de 30 milhões de pessoas. A receita líquida alcançou 3,7 bilhões de reais (sem considerar a operação da coligada Águas do Rio, que não entra nas demonstrações financeiras — com ela, a receita sobe para 8,3 bilhões de reais). O Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) foi a 2,5 bilhões de reais, um aumento de 35,6% em relação ao ano anterior. 

Diversidade e inclusão: a empresa tem a meta de ter 45% de mulheres e 27% de pessoas negras em cargos de liderança até o fim da década (Divulgação/Divulgação)

O setor de saneamento tem recebido, nos últimos anos, investimentos importantes. Até abril deste ano, os projetos em curso no país, tanto de concessões quanto de parcerias público-privadas (PPPs), previam injetar 116 bilhões na área, de acordo com a consultoria ­Radar PPP. São valores importantes, porém apenas o início de uma subida íngreme para universalizar o sanea­mento. A projeção é que, para isso, serão necessários 893 bilhões de reais em investimentos até 2033, segundo estudo realizado pela Associação e Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon Sindcon). 

Para Casseb, é inviável imaginar esse nível de investimento apenas com o setor público. Ao mesmo tempo, é imprescindível que o setor privado tenha um olhar além do lucro para a questão e coloque as pessoas no centro. O objetivo comum, no fim do dia, é gerar transformações sociais. “E não existe transformação sem colocar pessoas e recursos no lugar certo”, diz o CEO. 

Um dos riscos enfrentados pelas empresas nessa busca pela universalização ainda é o regulatório. No final de maio, o setor ficou aliviado com a retirada de uma proposta de criação de um departamento, sob controle do Ministério das Cidades, com poder regulatório sobre o saneamento, incluída na Medida Provisória 1154, conhecida como a MP da Reestruturação dos Ministérios. A medida, na visão das empresas, criaria uma estrutura regulatória complexa, com departamentos sobrepostos em diferentes ministérios. O risco foi evitado, mas o espectro do risco regulatório ainda paira sobre o mercado. 

Diversidade e inclusão

“Fui contratada aos 58 anos”, afirma Márcia Costa, vice-presidente de gestão de pessoas da Aegea, que recentemente assumiu o comando da área de sustentabilidade. “Quando o Radamés me ligou, eu disse: ‘Você tem certeza’? E ele repetiu o convite. Não imaginava que isso pudesse acontecer.” A valorização do humano, presente na estratégia de negócios, também se mostra real na relação da companhia com os funcionários. Recentemente, a empresa definiu as diretrizes de gestão de pessoas, cujo foco está em comportamentos como “mestre em brasicidades”, sobre o conhecimento local; embaixadores da saúde, sobre bem-estar; e agentes da dignidade, sobre impacto positivo. 

Água tratada: no ano passado, a Aegea tratou mais de 527 bilhões de litros de esgoto, e os investimentos em eficiência pouparam 20 bilhões de litros de água (Divulgação/Divulgação)

Os números de diversidade ainda não são os melhores, mas as metas estão traçadas. Em sete anos, a Aegea espera chegar a 45% de mulheres e 27% de pessoas negras em cargos de liderança — atualmente, os números estão em 35% e 25%, respectivamente. “Não nos pautamos pela eficiência meramente financeira. O que nos move são os resultados para a comunidade. Trabalhamos com a natureza e a prosperidade, o que exige talentos que sejam capazes de levar em conta o amanhã”, diz Costa. ­Falando em eficiência, em 2022 a Aegea poupou 20 bilhões de litros de água com investimentos na operação e em inovação. Resultado obtido por pessoas, que beneficia pessoas.   

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