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A casa do porco vivo: cellva capta R$ 6,5 mi para vender gordura suína que evita o abate do animal

Fundada em 2022 com investimentos de R$ 1 milhão, a startup trabalha com a técnica de gordura cultivada, a partir da extração e alimentação de células de porco

Sérgio Pinto e Bibiana Matte, da cellva: "nós conseguimos fazer uma gordura mais saudável e menos saturada" (Juan Gasparin /Divulgação)

Sérgio Pinto e Bibiana Matte, da cellva: "nós conseguimos fazer uma gordura mais saudável e menos saturada" (Juan Gasparin /Divulgação)

Marcos Bonfim
Marcos Bonfim

Repórter de Negócios

Publicado em 27 de janeiro de 2024 às 09h01.

Última atualização em 31 de janeiro de 2024 às 16h12.

Proteínas e carboidratos são duas palavras que estão no dia a dia da nossa alimentação, assim como a gordura. As três expressam conceitos que são essenciais para a dieta do ser humano. Mas, na indústria de alimentos, a gordura ficou para trás no processo de inovação. 

“Invariavelmente, o mercado está inundado de proteína e, invariavelmente, o mercado tem falta de gordura de qualidade”, afirma Sérgio Pinto, co-fundador da cellva, startup criada em meados de 2022 para desenvolver tecnologias de cultivo de gordura e óleos. As gorduras são importantes canais de transporte para carregar o sabor, a suculência e a energia dos alimentos. 

O profissional estava na gigante de alimentos BRF como diretor global de inovação e novos negócios quando decidiu criar o próprio negócio. Para desenvolver o cellva, ele convidou a pesquisadora Bibiana Matte para entrar como sócia. Especialista em cultura celular e engenharia de tecidos, Matte tinha criado um laboratório para desenvolver proteínas cultivadas em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.

Como funciona o modelo de negócio da cellva

A startup extrai células do porco e faz o cultivo do material, usando biorreatores em laboratório para a produção de gordura. Com o processo, não há necessidade do abate do animal e, uma vez estabelecido, cria-se uma espécie de banco de dados, o que não demanda novas extrações nos animais.

“Nós conseguimos modular o que a gordura será quando crescer. Por isso, nós podemos fazer uma gordura mais saudável e menos saturada”, afirma Pinto. “Além disso, conseguimos oferecer melhor performance, com ação antiinflamatória, antioxidativa e melhor digestibilidade”. De acordo ele, tudo isso é possível apenas com a alimentação das células, sem alterações genéticas.  

Criada com investimento de pouco mais de 1 milhão de reais, a startup está fazendo a sua primeira rodada. O objetivo é captar R$ 10 milhões, valor do qual a cellva já recebeu R$ 6,5 milhões. 

Os investimentos foram liderados pela Seed4SCience, da Fundepar (Fundo de Participações), e contaram com a participação da incubadora alemã Proveg, do fundo espanhol Rumbo Ventures e da rede de investidores-anjo do Rio Grande do Sul EA Angels. Os 35% restantes são promessas “avançadas com diligências” e a expectativa é de fechar a rodada até março.

A chegada do dinheiro vem após o cofundador gastar muita sola de sapato - ou de vários sapatos. No ano passado, ele acumulou 128 viagens e mais de 300 reuniões. Os desafios, segundo o executivo, apareceram de diversas formas.  

“Tem caso em que o fundo de venture capital gringo tem no website a frase ‘let's save the Amazon’ e fala que não vai investir em nenhuma empresa brasileira porque nós estamos destruindo a Amazônia. E episódios de preconceito, com investidores falando que o Brasil não tem essa tecnologia”, afirma.

Quais são os próximos passos

Em meados de 2023, os sócios anunciaram o primeiro protótipo da gordura e a capacidade de produzir 20 gramas de gordura a cada 21 dias. Em geral, a produção de gordura em carne suína leva em torno de 24 meses.

“Agora, eu consigo fazer 1 quilo por mês, o que me permite fazer todos os testes para modular o tamanho da operação”, diz. O aumento da produção também é importante para validar a qualidade do produto, checar a necessidade de adaptações regulatórias e o envio para testes de eventuais compradores. 

A nova capacidade será reforçada a partir de um novo laboratório, previsto para ser inaugurado no próximo mês. A startup sairá de um espaço de 40 para 125 metros quadrados, que terá biorreatores de última geração e dobrará o time para 13 pessoas. 

A expectativa é de que os produtos estejam no mercado entre o final de 2024 e início de 2025, a depender da aprovação da Anvisa, órgão regulatório do país. Os principais usos estão pensados para a indústria de alimentos, tanto a vegana quanto a tradicional.

Além da gordura, a cellva tem investido no desenvolvimento de óleos e azeites, como estratégia de diversificação de produtos. O princípio é aprender cada vez mais como tipos variados de alimentação das células podem conduzir a resultados diferentes e para a geração de novos produtos. 

“Eu não posso creditar tudo na biotecnologia da gordura proveniente da síntese de células. Eu também faço a síntese de azeitonas. O norte é nutrição e sabor, a partir de óleos, gorduras e azeites“, afirma o empreendedor. 

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