Em setembro, professores, estudantes e administradores da Universidade de Buenos Aires (UBA) protestaram em frente ao Hospital de Clínicas José de San Martín contra cortes orçamentários (AFP)
Repórter
Publicado em 30 de outubro de 2024 às 07h43.
Uma nova greve está prevista para começar nesta quarta-feira, 30, na Argentina. Desta vez, diversas categorias do setor de transporte e logística devem parar as atividades em sinal de descontentamento com iniciativas econômicas do governo de Javier Milei.
Os protestos começaram na terça, com uma greve de 36 horas dos integrantes da Associação dos Trabalhadores do Estado (ATE). O movimento deve ganhar ainda mais força com a adesão do transporte ferroviário, do metrô, caminhões, transporte aéreo e marítimo.
O ajuste promovido pelo governo, o aumento das passagens após a retirada dos subsídios, a tentativa de privatizar a Aerolíneas Argentinas, o ataque aos aposentados e a rejeição ao aumento da pobreza são os motivos da convocação da greve, de acordo com comunicado da ATE.
“Não é apresentando um bilhete na recepção que vamos reintegrar os despedidos, vamos reintegrá-los se conseguirmos estar na rua. Repudiamos o miserável 1% do mês de outubro e exigimos um aumento salarial que permita recuperar os salários prejudicados do Setor Público”, disse Rodolfo Aguiar, secretário-geral da ATE Nacional, durante as manifestações de ontem. Ele fazia referência ao último salário conjunto estadual.
O protesto em Buenos Aires começou no Obelisco, com uma marcha que seguiu até o Ministério de Desregulamentação e Transformação do Estado, comandado desde julho desde ano por Federico Sturzenegger, ex-presidente do Banco Central argentino durante o governo de Mauricio Macri.
"Compete ao Ministério de Desregulamentação e Transformação do Estado auxiliar o presidente e o chefe de Gabinete de Ministros em tudo o que se refere aos cursos de ação para a implementação da desregulamentação, reforma e modernização do Estado com vistas a redimensionar e reduzir o gasto público e aumentar a eficiência e eficácia dos órgãos que compõem a Administração Pública Nacional, a transformação de gestão, a simplificação do Estado, o desenho e a execução de políticas relacionadas ao emprego público", dizia trecho do documento divulgado na época da nomeação de Sturzenegger.
Desde que tomou posse em dezembro do ano passado, o governo de Javier Milei aplicou um forte ajuste fiscal, apelidado como política da “motosserra”. Em relatório entregue ao Congresso pelo chefe da Casa Civil, Guillermo Francos, o governo afirmou que até junho demitiu 26,6 mil funcionários da administração federal e contratou 2,7 mil.
No início de outubro, o governo argentino anunciou que vai submeter cerca de 40 mil funcionários que trabalham no Estado a um “exame de aptidão” e demitirá aqueles que não forem aprovados. Segundo o porta-voz Manuel Adorni, o exame será obrigatório para todos os funcionários cujos contratos expirem em 31 de dezembro.
A assinatura de contratos é uma prática comum no Estado argentino. Os chamados funcionários do “quadro permanente” trabalham com outros cujos contratos são renovados a cada final de ano, situação na qual podem passar décadas.
À EXAME, Laurato Tomas Perez, cientista político especializado em assuntos públicos da EPyCA, consultoria econômica de Buenos Aires, faz uma avaliação da situação. "O exame de aptidão é mais uma coisa que faz parte da luta ou conflito aberto que o governo tem com os diversos sindicatos. Mesmo assim, porém, o governo controla bastante a situação, porque hoje os sindicatos não têm uma boa imagem", opina.
O índice de confiança governamental medido pela Universidade Torcuato Di Tella mostrou uma recuperação de 12 pontos percentuais na imagem positiva do governo Milei. A taxa de aprovação de Milei foi de 2,43 pontos em outubro, alta de 12,2% ante a setembro, segundo o levantamento realizado com mil pessoas em 41 localidades em todo o país entre os dias 2 e 15 de outubro, com margem de erro de +-0,062."É um governo que, em geral, tem níveis de aprovação razoáveis apesar do tremendo ajuste que fez nestes 10 meses de governo, e continua a ter uma base de apoio forte. Por outro lado, o peronismo está cada vez mais dividido, entrando em um partidarismo interno muito forte", afirma Perez. Afinal, o governo de Milei consegue manter um número importante de pessoas vendo com bons olhos a sua gestão – apesar da recessão e do aumento da pobreza que afeta 52,9% dos argentinos.
Ao Clarín, Juan Pablo Brey, secretário-geral dos Aeronavegantes, expressou total apoio à paralisação e confirmou a participação do setor aéreo. Além dos voos, a greve deve afetar também os serviços de trens, metrôs, caminhões e barcos.
As linhas de ônibus, no entanto, vão operar normalmente, já que a UTA (União Tranviários Automotor) decidiu não aderir ao movimento. Apesar disso, o órgão anunciou uma paralisação para quinta-feira, 31, buscando por reajustes salariais que compensem os efeitos da inflação nos salários dos trabalhadores do setor.