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O uso da Inteligência Artificial na medicina: transformação e desafios

Após a chegada de ferramentas como o ChatGPT, estamos vendo a IA ocupar uma posição de destaque na sociedade

Após a chegada de ferramentas como o ChatGPT, estamos vendo a IA ocupar uma posição de destaque na sociedade (Reprodução/Thinkstock)
Após a chegada de ferramentas como o ChatGPT, estamos vendo a IA ocupar uma posição de destaque na sociedade (Reprodução/Thinkstock)
Colunistas EXAME
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Publicado em 12 de outubro de 2024 às, 08h00.

Última atualização em 14 de outubro de 2024 às, 10h16.

*Por Eduardo Lapa

Após a chegada de ferramentas como o ChatGPT, estamos vendo a Inteligência Artificial (IA) ocupar uma posição de destaque na sociedade, despertando o interesse da população em suas mais diversas aplicações. Essa tecnologia, que vem evoluindo rapidamente, está impactando não apenas a vida cotidiana, mas também a prática da Medicina de maneira significativa - sobretudo após a pandemia. Um estudo da IDC encomendado pela Microsoft, mostrou que 79% das organizações de saúde reportam usar IA - ou seja, saímos de uma tendência para consolidar a prática. Com isso, a integração da IA na área médica está transformando todas as etapas da assistência à saúde, da triagem inicial até o acompanhamento pós-consulta, e, claro, levantando debates sobre sua implementação.

De início, pode-se pensar que o uso da IA só se dá por meio de aplicações muito complexas no ambiente da saúde. Mas, é possível já criar novas práticas a partir de movimentos simples. A IA pode intervir no estágio da pré-consulta, ajudando a identificar pacientes com maior risco de desenvolver determinadas condições de saúde, por exemplo. Essa tecnologia é capaz de analisar dados médicos, históricos e fatores de risco para prever possíveis diagnósticos, permitindo que pacientes em situação de risco recebam tratamento de forma mais precoce. Isso é particularmente relevante em condições crônicas.

Ao lado do médico, durante a consulta, a IA se apresenta como uma ferramenta valiosa para melhorar a tomada de decisões clínicas. Existem soluções de inteligência artificial que, ao analisarem sintomas e exames, oferecem sugestões de hipóteses diagnósticas e opções de tratamento. Essas ferramentas reduzem os “pontos cegos” do raciocínio clínico, oferecendo suporte adicional para que o médico explore todas as possibilidades com mais segurança. O uso de prontuários eletrônicos inteligentes também otimiza essa etapa, permitindo que os profissionais revisem prescrições médicas com mais precisão, reduzindo a margem de erro em dosagens e interações medicamentosas.

Mas por onde começar? Como toda nova tecnologia, a IA causa estranheza, é preciso desmistificar, torná-la prática e simples para o médico. Guias como este, criado por médicos para médicos, dão um passo a passo valioso para quem tem pouco ou nenhum contato com a tecnologia. Ensinam desde como baixar os chatbots até como redigir os melhores comandos para obter as informações mais precisas.

E a IA aplicada à saúde não se restringe somente aos médicos. Após a consulta, no dia a dia prático dos pacientes, a IA pode atuar como um assistente virtual, oferecendo suporte contínuo. Ela pode responder a dúvidas frequentes sobre medicação, esclarecer cuidados pós-tratamento e monitorar a recuperação, garantindo que o paciente receba orientações precisas sem a necessidade de visitas adicionais ao consultório. Além disso, sistemas de IA estão sendo desenvolvidos para fazer o acompanhamento automatizado de pacientes com doenças crônicas, oferecendo lembretes sobre horários de medicação e consultas.

Quando olhamos para a gestão na saúde, a IA também desempenha um papel fundamental, especialmente em tarefas administrativas que consomem grande parte do tempo dos médicos. Estima-se que, nos Estados Unidos, cerca de metade do tempo dos médicos é gasto com tarefas burocráticas, como preenchimento de prontuários e formulários. Com a IA, temos um salto de produtividade. Ferramentas que transcrevem automaticamente conversas entre médico e paciente, inserindo os dados diretamente no prontuário eletrônico, estão ganhando espaço, permitindo que o médico revisite o documento apenas para validação, otimizando o tempo de consulta.

Além disso, a IA pode ajudar a gerar laudos e relatórios médicos mais rapidamente, resumir exames complexos e fornecer explicações em termos acessíveis para o paciente entender melhor sua condição. Ao aliviar a carga de trabalho, essas inovações permitem que os profissionais de saúde dediquem mais tempo à interação com o paciente e menos tempo a atividades burocráticas.

Porém, não estamos livres de desafios. Olhando para a ordem prática, é possível que você esteja se perguntando como tudo isso se orquestra na vida real - inclusive sob o ponto de vista ético. Em alguns casos, a IA pode fornecer informações incorretas, chamadas de "alucinações", que podem levar a erros de diagnóstico ou tratamento. Por isso, defendo que os profissionais de saúde estejam capacitados para interpretar corretamente os dados fornecidos pela IA e saber quando confiar na tecnologia e quando confiar em sua experiência clínica.

Outro aspecto é que o uso de algoritmos em decisões clínicas levanta questões sobre transparência e responsabilidade. Como garantir que esses sistemas sejam livres de vieses que possam prejudicar determinados grupos de pacientes? É importante formar médicos aptos a ter a solução como parceira na jornada, auxiliando, mas não pilotando o dia a dia.

A IA, quando bem utilizada, tem o potencial de transformar radicalmente a medicina, tornando-a mais eficiente e precisa. No entanto, o caminho para sua incorporação total é longo e exige uma combinação de avanços tecnológicos, treinamento contínuo dos profissionais e regulamentações claras que protejam tanto os pacientes quanto os médicos. O futuro da medicina é, sem dúvida, repleto de oportunidades, mas também de desafios, e o papel da IA nesse cenário está apenas começando a se revelar.

*Eduardo Lapa - Cofundador e editor-chefe do site Afya CardioPapers, uma das principais referências em Cardiologia no Brasil. Formado em Medicina pela UFPE. Residência em Clínica Médica pela UNIFESP e Cardiologia pelo InCor. Possui título de especialista em Clínica Médica, Cardiologia e Ecocardiografia. Doutor e mestre pelo departamento de Cirurgia da UFPE.