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A transparência que ainda não temos nas prefeituras brasileiras

Uma rápida pesquisa pelos portais das prefeituras brasileiras nos mostram uma pobreza de informações

Prefeitura de SP (Guilherme Cunha / SMTUR/Divulgação)
Prefeitura de SP (Guilherme Cunha / SMTUR/Divulgação)
Claudio D. Shikida
Claudio D. Shikida

Publicado em 3 de outubro de 2024 às, 13h29.

Recentemente, o Instituto Millenium publicou sua Agenda Cidades, com 50 ideias para o que chamam de uma gestão municipal de impacto. O lançamento é oportuno, pois já passou da hora de se renovar os debates sobre o problema da gestão pública brasileira. E o início de tudo está ao lado do eleitor, ou seja, nas políticas públicas praticadas nas cidades.  

O documento é rico em sugestões sobre vários eixos da gestão municipal e, talvez, o que eu vá dizer a seguir esteja implícito em todo o documento. Refiro-me à transparência dos portais (também chamados de ‘sítios eletrônicos’) das prefeituras. E, não, não estou preocupado com os salários dos servidores, vereadores ou prefeitos. Este tipo de informação é fácil de se obter, mas não dizem muito sobre a transparência nos critérios adotados para se fazer políticas públicas.  

Uma rápida pesquisa pelos portais das prefeituras brasileiras nos mostram uma pobreza de informações. A grande maioria parece ter sido construída de modo que nada seja encontrado, exceto uma ou outra informação sobre vacinas, horários de ônibus ou datas de pagamentos de impostos. O leitor mais interessado na eficiência da gestão não quer um dashboard do número de vacinas da dengue aplicadas (se bem que se tivéssemos isto, já seria um avanço…). Ele quer saber sobre a qualidade dos estudos técnicos que embasaram uma decisão da gestão municipal. 

Eis aí um ponto importante para uma gestão municipal de impacto. A prefeitura resolveu, por exemplo, criar ciclofaixas em sua cidade? Neste caso, é natural que se pergunte sobre os estudos técnicos que embasam a decisão. Por exemplo, neste estudo eu gostaria de ver respostas objetivas para perguntas como: qual é o custo e qual é o benefício das ciclofaixas? Não há mesmo perda de eficiência no trânsito com a diminuição de uma faixa para veículos? Se há, como a prefeitura minimizou o problema? Que medidas foram tomadas? Quais os custos de oportunidade de se implantar uma ciclofaixa? Do que, exatamente, a prefeitura abriu mão para investir nisto? Qual o valor do tempo dos servidores gasto neste processo? E os benefícios sociais? Qual seu valor? A diferença entre o benefício social e o custo social compensa para os eleitores?  

Quem já passou por algum curso de Estatística, ou mesmo de Econometria, sabe que a moderna Avaliação Social de Projetos passa, inevitavelmente, por este tipo de mensuração, e as cidades podem até não ter uma universidade perto, com pesquisadores que saibam fazer estas estimativas e que possam treinar alunos- potenciais futuros gestores públicos- no tema, mas, atualmente, existem opções de cursos online muito boas (quem já visitou a EVG, a plataforma de cursos virtuais da Escola Nacional de Administração Pública (Enap) sabe do que falo…). Outro avanço que poderia ser incorporado pelas gestões municipais é o da Análise de Impacto Regulatório (AIR). Seria muito melhor que regulações criadas pelos governos municipais passassem previamente por uma AIR e, no espírito deste texto, seria maravilhoso, para o eleitor, que estes estudos também fossem publicados nos portais com fácil acesso.  

No fim das contas, o cidadão paga impostos e nem todos querem apenas ver a publicação de cifras de gastos públicos em pontes, ambulâncias ou escolas. O cidadão quer saber o custo das políticas implementadas. Quer saber se a gestão municipal gastou com qualidade. Um milhão de reais mal gastos não valem um real bem gasto pra mim. Talvez o amigo leitor pense que um milhão de reais mal gastos não valem cem reais bem gastos. De todo modo, eu e o leitor estaríamos melhor servidos se os prefeitos e seus gestores municipais realmente se preocupassem em nos informar sobre como avaliam a qualidade dos seus gastos. Faz todo sentido, aliás, se nos lembrarmos que, em discussões sobre o papel dos governos, são os gestores públicos os primeiros a defenderem que a intervenção estatal se justifica para que se diminua assimetria de informações. Pois bem, que tal implementar esta maior transparência?