Ciência

Hospital das Clínicas e startup testam remédio digital para dor de artrose

Tratamento com luz promete amenizar 90% dos tipos de dores, inclusive crônicas

Remédio digital à base de luz promete amenizar dores (Bright Photomedicine/Divulgação)

Remédio digital à base de luz promete amenizar dores (Bright Photomedicine/Divulgação)

LN

Letícia Naísa

Publicado em 2 de outubro de 2018 às 18h16.

São Paulo — Ao invés de tomar um comprimido para a dor, o físico Marcelo Sousa, fundador da Bright Photomedicine, criou um remédio digital e quer que as pessoas se curem com luz.

Para fazer o projeto acontecer, Sousa fundou uma startup com um capital inicial de 200 mil reais. O pesquisador também recebeu 600 mil reais de investidores interessados no produto, além de 1 milhão de reais da Fapesp para desenvolver sua pesquisa. Para ir ainda mais longe, a empresa está com um financiamento coletivo aberto a quem quiser colaborar com os estudos do remédio digital.

Doutor em fotoneuromodulação (área que estuda os efeitos da luz nos neurônios), Marcelo afirma que tem uma relação próxima com a academia . A decisão de abrir uma empresa para desenvolver o remédio digital aconteceu para que os testes acontecessem mais rápido e pudessem abranger um público maior. O pesquisador também espera que o dispositivo possa ser comercializado em farmácias um dia.

Assim como o organismo reage para combater a dor quando recebe uma substância química, o corpo deve reagir ao receber luz do aparelho desenvolvido pela empresa de Sousa.

Quando a região afetada pela dor recebe a luz, as células reagem à dor e passam a produzir remédios para combatê-la.

“Já se sabe que a luz tem um efeito anti inflamatório e antioxidante, ela age no sistema nervoso central aumentando a produção de substâncias analgésicas”, afirma Hazem Ashmawi, médico especialista em dor do Hospital das Clínicas (HC) de São Paulo.

Segundo Sousa, seu produto é capaz de tratar 90% dos tipos de dores, inclusive dores crônicas, um problema que atinge 37% dos brasileiros, segundo pesquisa da Sociedade Brasileira para Estudo da Dor (SBED). No mundo, de acordo com Hazem, estima-se que 25% a 30% da população mundial sofra com dor crônica.

Visando amenizar o problema da dor, um ensaio clínico será feito com pacientes que sofrem com artrose no HC no início de 2019.

Os pacientes serão divididos em três grupos de 30 indivíduos: um de pessoas saudáveis, outro de pessoas com a doença que receberão o tratamento com o dispositivo e o último receberá um placebo.

“A artrose causa dor e inflamação e um desgaste na cartilagem. A gente envia um remédio digital de luz que é capaz de tratar esses três problemas”, explica Sousa.

Os pacientes receberão dez aplicações do remédio digital durante o tratamento. “Queremos ver se o remédio diminui a dor e a funcionalidade do paciente”, diz Ashmawi.

São dois fatores que determinam a dose de remédio digital para cada paciente: as características da doença que está sendo tratada e as características do paciente, como cor de pele, peso, idade e gênero.

A artrose é uma doença que atinge principalmente a população idosa e causa limitação de movimento, dor e inflamação. Preocupados com o avanço da doença causado pelo envelhecimento da população, a equipe de Sousa e do HC espera poder oferecer uma solução.

“É uma doença que não tem soluções de tratamento pela medicina”, afirma Ashmawi. O remédio digital, no entanto, não promete uma cura. “É um tratamento para dor e perda de função”, explica.

“É um tratamento complementar ao analgésico”, afirma Sousa.

Os especialistas, no entanto, estão otimistas. Estudos iniciais da Bright Photomedicine apresentaram resposta positiva com 80% dos pacientes que sofriam com diversos tipos de dores crônicas.

Sem efeitos colaterais

O aposentado Marcos Salles, 82 anos, foi um dos pacientes que participou dos testes em abril. “Tenho um problema no joelho e ando de muletas, já fiz todo tipo de tratamento e até cirurgia”, conta.

Há mais de 20 anos, Salles sentia dor a todo momento. “Tudo o que existe de remédio eu já tomei, até aquele que matou o Michael Jackson”, diz.

Desde que passou pelo tratamento com a fototerapia, no entanto, Salles não toma mais nenhum analgésico para a dor no joelho. “Não sentir dor é uma maravilha”, afirma.

Por conta da quantidade de remédios, Salles acredita que seu organismo sofreu além da dor. “Meu rim já deve ter ido embora.”

Evitar efeitos colaterais provocados pelo consumo excessivo de medicamentos a quem sente dor é um dos objetivos do remédio digital.

Existe uma tendência na medicina a propor tratamentos menos medicamentosos para a população idosa, explica Ashmawi. “O melhor remédio para inflamação da artrose é o anti inflamatório. só que no idoso tem seus riscos, pode ter lesão de rim, lesão intestinal, aumenta a chance de ter infarto”, diz. “É uma população mais complicada do ponto de vista de uso de medicamentos. Por isso, propor tratamentos que poupam o organismo é melhor.”

Na contramão de quem consome remédio demais, Sousa espera ajudar também aqueles que não têm acesso a medicamentos. “O Brasil tem esses dois problemas e a fotomedicina entra com esse duplo papel”, afirma.

O físico espera que quem gasta demais com remédios possa economizar. O tratamento de dez doses do remédio digital, que dura em média dois meses, custará de 300 a 600 reais.

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