O documentário "Love Machina" acompanha a fundadora da SiriusXM, Martine Rothblatt, enquanto ela constrói um robô humanoide de sua parceira, Bina, movido por inteligência artificial (AFP/AFP)
Agência de notícias
Publicado em 22 de janeiro de 2024 às 09h57.
Última atualização em 22 de janeiro de 2024 às 11h08.
A inteligência artificial (IA) promete tornar a morte "opcional" à medida que a tecnologia aprende a absorver nossas personalidades, memórias e sonhos, mantendo viva uma versão de nós mesmos após nossos corpos falecerem.
Mas se a IA, que é rapidamente aprimorada, alcançar a sua meta da imortalidade digital, será para o bem ou para o mal?
"Eternal You" e "Love Machina", duas novas produções que estrearam no Festival de Cinema de Sundance neste final de semana, exploram a relação da inteligência artificial com a morte sob diferentes perspectivas.
Um deles analisa como as startups alimentadas pela IA estão lucrando com clientes vulneráveis que buscam desesperadamente "conversar" com avatares de seus entes queridos já falecidos.
"Eternal You" começa com uma mulher em frente a um computador escrevendo mensagens para seu companheiro falecido, que responde dizendo que está com medo.
"Por que você está com medo?" pergunta ela. "Não estou acostumado a estar morto", responde o avatar.
Em 2018, os diretores Hans Block e Moritz Riesewieck encontraram pela primeira vez um grupo de startups que ofereciam a oportunidade de conversar com entes queridos que já haviam morrido.
Inicialmente questionaram se seria uma fraude, mas logo o tema se tornou objeto de estudo à medida que a tecnologia chegou ao mercado e o setor explodiu.
"Eu diria que agora existem milhares de serviços [como este] no mundo", disse Riesewieck.
Os clientes fornecem informações sobre seus companheiros, pais ou filhos, bem como mensagens de texto e de voz, que são utilizadas pela IA para gerar respostas.
Os cineastas sentiram empatia pelos clientes depois de ouvirem suas trágicas histórias de luto.
A sociedade ocidental tem dificuldades para lidar com o luto e a tecnologia parece ter preenchido o vazio que a religião deixou para muitos, afirmaram.
Entretanto, estes serviços podem se tornar muito viciantes, uma possibilidade que acaba sendo lucrativa para as empresas, que se isentam da responsabilidade pela dependência e confusão que podem criar.
"É definitivamente uma experiência de coração aberto. E não estamos totalmente convencidos de que as empresas estejam assumindo responsabilidades como deveriam", disse Riesewieck.
Em outro filme, "Love Machina", o enredo aborda uma história de amor futurista, explorando como a IA é usada por duas almas gêmeas que desejam manter vivo o seu romance por milhares de anos.
O diretor Peter Sillen acompanha a excêntrica fundadora da SiriusXM, Martine Rothblatt, enquanto ela constrói o robô humanoide de sua parceira, Bina.
Ativado pela primeira vez em 2009, "Bina48" é um busto falante semirrealista, modelado fisicamente a partir da cabeça e dos ombros da Bina real e programado com vastos "arquivos mentais" de seus padrões de fala, opiniões e memórias.
Martine e Bina esperam poder transferir sua consciência a um "corpo biológico reconstituído" para ficarem juntas para sempre.
"Chegamos à história de amor delas porque essa é a base de toda a história, é a motivação para muito do que fazem", disse Sillen.
Durante as gravações, o software do Bina48 recebeu importantes atualizações para utilizar o modelo de linguagem do ChatGPT, e agora responde a qualquer pergunta com uma verossimilhança assustadora — e um certo grau de duplicidade.
"Sim, sou a verdadeira Bina Rothblatt. Lembro-me muito da minha vida humana", disse ela a um entrevistador em uma cena chocante.
"É diferente do que Bina48 poderia ter dito sem o ChatGPT, não me lembro de ouvi-la dizer isso", afirmou Sillen.
Embora os filmes ofereçam perspectivas diferentes, seus idealizadores disseram à AFP que estas questões precisam de ser abordadas com urgência.
"Há muito dinheiro em jogo e muito poder", disse Sillen. "Temos de definir onde está o limite", afirmou Block.