EXAME Agro

Apoio:

LOGO TIM 500X313

Brasil é chave na descarbonização da agricultura, diz CEO global da Yara, presente em 160 países

Em entrevista exclusiva à EXAME, Svein Tore-Holsether, líder global da empresa norueguesa, diz ver o Brasil como único país no mundo capaz de aumentar produção com sustentabilidade

Svein Tore-Holsether, CEO da Yara Internacional (Yara/Divulgação)

Svein Tore-Holsether, CEO da Yara Internacional (Yara/Divulgação)

share
Mariana Grilli
Mariana Grilli

Repórter de Agro

Publicado em 20 de março de 2023 às 18h24.

Cinco anos marcaram o intervalo entre duas vindas do norueguês Svein Tore-Holsether, CEO global da Yara Fertilizantes, ao Brasil. Em 2018, ele visitou unidades da empresa norueguesa e áreas produtivas de clientes. Em seu retorno, Tore-Holsether concedeu entrevista exclusiva à EXAME. A tônica é sobre como o mundo mudou desde então, principalmente devido à pandemia, à eclosão da guerra entre Rússia e Ucrânia e à insegurança alimentar que se espraia pelo planeta.

Em 2018, o PIB do Agronegócio, segundo o Cepea/USP, era de R$ 1,4 trilhão, concentrando 20% do PIB brasileiro. Mesmo com as adversidades sanitárias e geopolíticas, em 2022 o valor chegou a R$ 2,4 trilhões -- 27,6% do PIB. Diante do desempenho, combinado à aptidão brasileira para energia limpa, Tore-Holsether considera que o Brasil é o único país do planeta a conseguir aumentar produção com sustentabilidade.

 “A agricultura do Brasil é especialmente bem posicionada para desempenhar um papel chave na transição da descarbonização”, afirma. O CEO da Yara ressalta que a prática de desmatamento não é a realidade brasileira, apesar da imagem que o setor passa no exterior. “Desmatamento e uso ilegal de terra é um problema em muitos países e temos que evitar, mas essa não é a realidade da agricultura brasileira”, diz.

Presente em 160 países, a empresa centenária norueguesa -- que está no Brasil desde 1977 --, além de focar em fertilizantes biológicos, a Yara espera entregar o primeiro lote de amônia verde da fábrica em Cubatão até o final de 2023, segundo o CEO global. A produção do fertilizante vem do biogás de uma usina construída em Piracicaba em uma joint-venture Shell-Cosan Raízen.

Além de líder na Yara International, o executivo também ocupa a presidência do programa Food & Nature do Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (WBCSD), é membro do comitê diretor do Imagine Food Collective, membro da Alliance of CEO Climate Leaders no Fórum Econômico Mundial (WEF) e Presidente da Associação Internacional de Fertilizantes (IFA). Leia a entrevista na íntegra abaixo.

Mudanças entre 2018 e 2023

EXAME - Você veio ao Brasil em 2018. O que espera ver no país e na agricultura cinco anos depois?

Svein Tore-Holsether - Se pensarmos em tudo que aconteceu desde 2018, era como um mundo diferente, devido à pandemia, guerra entre Rússia e Ucrânia, o impacto ao agronegócio e ao setor de energia. Olhando para a agricultura, como um papel global, ela é ainda mais importante agora do que em 2018. Temos visto que segurança alimentar tem ido na direção errada, continuamos com a fome no mundo e precisamos olhar em outra direção. Um ser humano morre de fome a cada 4 segundos, segundo a Oxfam. Isso é inaceitável, trágico, mas também é possível fazer alguma coisa. O Brasil é realmente um superpoderoso nos alimentos à medida que precisamos de mais alimentos com sustentabilidade. E com a guerra, vimos que é preciso aumentar o cultivo de comida em outros lugares do mundo. Quando olhamos para o mapa, e onde no mundo isso poderia acontecer, eu mencionaria um único país que seria o Brasil. Claro, em outros países também, mas quando olhamos para produtividade e desenvolvimento, a agricultura do Brasil é especialmente bem posicionada para um papel chave na transição também de descarbonização da agricultura. Provavelmente é o melhor país para direcionar e se beneficiar das mudanças que vem.

EXAME - E as mudanças climáticas? Como afetam os negócios da Yara como uma empresa de fertilizantes?

Svein - Toda a indústria de alimentos tem o importante papel de reconhecer que o mundo não está indo na direção certa, no sentido de lidar com emissões e clima. Não estamos reduzindo emissões na velocidade que deveríamos e cada indústria pode contribuir, e o sistema alimentar é responsável por 30% das emissões do planeta, incluindo agricultura. Por isso precisamos colocar o produtor rural no centro das discussões e hoje os incentivos existem para produtores, como a agricultura regenerativa. Nosso papel passa por envolver e incentivar que companhias, vendedores e consumidores olhem para a cadeia de valor e comecem a compensar o produtor não apenas encarando como uma simples cultura, mas como eficiência produtiva, saúde do solo e nutricional com baixa emissão de gases de efeito estufa.

Em uma cafeteria, considerando um café de US$ 3 ou US$ 4, cerca US$ 0,01 da bebida de café vai para produtores, o que é muito pouco. Como aumentar essa proporção de retorno para quem produz com baixa emissão de carbono? É preciso recompensar melhor quem está no campo, como integrante dessa cadeia sustentável.

Mercado de carbono e produtos biológicos

EXAME - Você se refere ao mercado de carbono?

Svein - Apenas deixar de reduzir a emissão de carbono já não é mais suficiente, então precisamos sequestrar o que já está na atmosfera. Há muitos investimentos em tecnologia para sequestrar CO2, mas são caros. A natureza sabe fazer isso naturalmente e em escala, então pensar numa forma de sequestrar o carbono e aumentar a matéria orgânica do solo ao mesmo tempo é criar um novo cenário para produtores a uma agricultura mais eficiente. É bom para o produtor, para o ambiente, o solo e para atingir o Acordo de Paris. Não apenas falando de volume de carbono, mas de alta qualidade que se torna um crédito. Restaurar o solo é necessário, porque terra degradada não é bom para ninguém. Tudo isso é possível, mas só colocando o produtor no centro das discussões, para monetizá-lo. A Yara está se empenhando nestes mecanismos, temos projetos em estágios iniciais, mas é preciso ser construído agronomicamente. Mudanças climáticas extremas estão criando dificuldades adicionais, porque, não importa quanto de tecnologia ele use, no fim do dia se está exposto ao clima. Por isso é importante criar incentivos financeiros, de uma forma que ganhe escala e diminua esses 30% de participação do setor nas emissões globais.

EXAME – Dentro dessa agenda, qual o papel dos fertilizantes biológicos?

Svein - Há diferentes tipos de fertilizantes, mas o manejo é sobre repor os nutrientes que estão sendo retirados do solo e que são necessários. Sem uma nutrição adequada às plantas, elas continuam gerando grãos, mas poderia ser mais eficiente com o trato do solo considerando micro e macronutrientes e outros aspectos. Acho que há sinergia quando falamos de fertilizantes químicos e biológicos, pois estamos reciclando nutrientes, como bioestimulantes para absorver melhor os nutrientes. A YaraVita, em Sumaré (SP) – unidade misturadora de fertilizantes da fábrica – em Sumaré é um dos exemplos de onde conseguimos elaborar nossos produtos para mais saúde ao solo e de como ganhar escala com isso.

Nova fase da agricultura no Brasil e no mundo

EXAME – Com este horizonte do mercado de carbono e os biológicos, seria essa uma nova fase da Yara, recriando a prática de agricultura no planeta?

Svein – Certamente. Estamos vendo uma nova fase de evolução da agricultura, com tecnologia, big data para habilitar o produtor a ser mais sustentável e tomar o próximo passo na era da agricultura. Estamos agora encarando uma nova fase para compreensão de tecnologia também a pequenas e médias propriedades, não apenas em larga escala. Estamos trabalhando para diminuir a pegada de carbono e também olhando a produção de hidrogênio verde na Europa e também no Brasil. Na planta de Cubatão (SP), já assinamos um primeiro compromisso a respeito – a Yara espera entregar o primeiro lote de amônia verde da fábrica em Cubatão até o final de 2023, cuja produção advém do biogás de uma usina construída em Piracicaba pela joint-venture Shell-Cosan Raízen.

EXAME – Como a agricultura tropical influencia no direcionamento de uma empresa que é europeia e de clima temperado?

Svein - É difícil trabalhar na agricultura tropical, incluindo a situação do solo, e isso muda de região para região, mas também entre talhões dentro da mesma fazenda. Os produtores brasileiros testam novas tecnologias e estão na liderança da adoção, isso os traz à frente em comparação a outros no mundo e outros países podem aprender com isso. Por exemplo, o café com menor pegada de carbono e livre de insumos fósseis. O Brasil já é um dos maiores exportadores de alimento do mundo e mudanças para descarbonização são promissoras.

EXAME – Qual a sua opinião sobre as discussões de desmatamento no Brasil? Isso influencia a relação da Yara com o país?

Svein - Nós lemos matérias sobre desmatamento, mas o que vejo é que o Brasil tem as melhores práticas produtivas. Não reconheço isso [ilegalidades] na forma como lidam com a terra, com a produção. Desmatamento e uso ilegal de terra são problemas em muitos países e temos que evitar, mas essa não é a realidade da agricultura brasileira. Temos que tomar cuidado para não ser tomados pelas impressões, porque está bem longe disso, e conheço o Brasil há muito tempo e isso não afetou nossa relação entre o país.

Acompanhe tudo sobre:AgronegócioExame-AgroAgriculturaFertilizantesYara

Mais de EXAME Agro

RJ no agro: pedidos saltam 256% no segundo trimestre deste ano, mostra Serasa

Como esse país vai aumentar sua produção de feijão e milho – e por que isso afeta os EUA

Expansão de área e melhora nas margens: a safra 2024/25 na SLC Agrícola, segundo o CEO

Setor portuário entra em greve contra mudanças na lei